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INICIAL DO NOME:

ANTÔNIO SÉRGIO DE MATTOS

OCORRÊNCIA

Morto em 23/09/71, São Paulo (SP)

DADOS PESSOAIS
Filiação: Armando Mattos/Maria de Lourdes Pereira Mattos
Data e local de nascimento: 18/02/48, Rio de Janeiro (RJ)
Profissão: Estudante
Atuação política: Ação Libertadora Nacional (ALN)
Data e local da morte/desaparecimento: Morto em 23/09/71, São Paulo (SP)
Organização política: Ação Libertadora Nacional (ALN).

BIOGRAFIA

Antônio Sérgio de Mattos era estudante de direito na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) quando iniciou sua militância política no agrupamento chamado Movimento de Ação Revolucionária (MAR). Fazia parte da Associação de Auxílio aos Reclusos, que prestava assistência aos presos políticos. Em maio de 1969, colaborou com a fuga de presos políticos da Penitenciária Lemos de Brito, o que o forçou a viver na clandestinidade.

No fim de 1970 Antônio Sérgio de Mattos, foi morar em São Paulo (SP), tornando-se dirigente regional da ALN.

Era acusado de ter participado da execução, em 15 de abril de 1971, do então presidente da Ultragás e diretor da FIESP, Albert Henning Boilesen, financiador da Operação Bandeirante, reorganizada como DOI-CODI/SP.

Em 1971 Antônio teria sido metralhado durante assalto a um jipe do Exército, junto com mais três militantes da ALN, em emboscada montada pelos órgãos de segurança na rua João Moura, na altura do nº 2.358, no bairro do Sumarezinho, em São Paulo (SP). Os outros militantes envolvidos com o caso eram Manuel José Nunes Mendes de Abreu, Eduardo Antônio da Fonseca e Ana Maria Nacinovic Corrêa, que fugiu e foi assassinada posteriormente, no dia 14 de junho de 1972, junto com outros militantes e dirigentes da ALN, em São Paulo, na Mooca.

Os relatórios oficiais dos ministérios da Marinha e da Aeronáutica, encaminhados ao ministro da Justiça Maurício Corrêa em 1993, mantêm a versão policial dada.

Foi enterrado como indigente no Cemitério D. Bosco, em Perus, na capital paulista. Em 1975, sua família conseguiu retirar seus restos mortais e trasladá-los para o Rio de Janeiro, onde foi sepultado no sítio de seus pais em Macaé.

O primeiro pedido encaminhado à CEMDP (233/96) foi apresentado por sua mãe, que faleceu em 2004, aos 82 anos, antes da família obter o reconhecimento da responsabilidade do Estado pela morte de seu filho.

(Fontes: Dossiê Ditadura: Mortos e Desaparecidos no Brasil (1964-1985), 2009, p. 281-284).

EXAME DA MORTE OU DO DESAPARECIMENTO FORÇADO ANTERIORMENTE À INSTITUIÇÃO DA CNV

Na CEMDP, os três casos dos militantes envolvidos no caso da rua João Moura foram analisados em conjunto, havendo intensos debates, com voto inicial de indeferimento dos três casos seguido de mais de um pedido de vistas. O relator Nilmário Miranda e a conselheira Suzana Keniger Lisbôa examinaram exaustivamente os documentos localizados.

Ao voto do relator Nilmário Miranda dos três casos na CEMDP, houve dois pedidos de vistas, e os dois relatórios apresentados pelo conselheiro Luís Francisco Carvalho Filho apontavam o deferimento dos pedidos dos familiares de Antônio Sérgio e Eduardo Antônio, e destacavam:

A natureza dos ferimentos, a inexplicável demora da chegada dos corpos ao IML, a característica da ocorrência imputada às vítimas – tentativa de assalto a um jeep do Exército –, aliada à certeza de que, em diversos outros casos, militantes feridos foram conduzidos a estabelecimentos militares e não a hospital para o devido atendimento médico, evidenciam que pode, de fato, ter ocorrido um tiroteio entre os agentes e os militantes, contudo, há fortes indícios de que eles ou um ou dois deles permaneceram vivos em poder dos agentes públicos até a morte por um lapso de tempo razoável até que se verificasse o óbito.

Na primeira fase da CEMDP, apenas o caso de Eduardo (307/96) foi deferido por 6 votos a 1, vencido o voto do general Oswaldo Pereira Gomes, em 9 de fevereiro de 1998.O requerimento da família de Antônio Sérgio de Mattos (233/96) foi indeferido por 4votos a 3, vencidos o relator e os conselheiros Suzana Keniger Lisbôa e Luís Francisco Carvalho Filho, em 9 de fevereiro de 1998. Após a edição da lei 10.875/04, com a apresentação deum novo requerimento (083/02), tendo como relatora Suzana Keniger Lisbôa, o pedido foi deferido por unanimidade em 26 de agosto de 2004.

O requerimento da família de Manuel José (363/96) foi indeferido por ter sido protocolado fora do prazo. Após a edição da lei 10.875/04, que reabriu o prazo para apresentação de requerimentos, o segundo pedido (032/02) foi deferido por unanimidade em 7 de outubro de2004, tendo como relatora Suzana Keniger Lisbôa.

O nome de Antônio Sérgio de Mattos consta no Dossiê ditadura: Mortos e Desaparecidos no Brasil (1964-1985) organizado pela Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos.

CIRCUNSTÂNCIAS DA MORTE OU DO DESAPARECIMENTO FORÇADO

Em 23 de setembro de 1971, quatro militantes da ALN caíram em emboscada montada pelos órgãos de segurança na rua João Moura, na altura do nº 2.358, no bairro do Sumarezinho, em São Paulo (SP).Ana Maria Nacinovic Corrêa era a única mulher do grupo e conseguiu escapar sem ser presa, sendo executada posteriormente, em 14 de junho de 1972.

Os órgãos da repressão montaram a emboscada colocando na rua um jipe do Exército, aparentemente com problemas, e soldados parados à volta portando metralhadoras.

Em um caminhão baú da Folha de São Paulo ficaram escondidos os agentes do DOI-CODI/SP. A versão oficial registrou que os três militantes morreram no local, ao tentar assaltar o jipe.De acordo com Suzana K. Lisboa (na 117ª audiência da Comissão da Verdade do Estado de São Paulo Rubens Paiva, no dia 19 de março de 2014), é de Ana Maria a informação sobre a utilização do caminhão baú da “Folha de São Paulo” na ação.

Apesar de terem ocorrido três mortes violentas, estranhamente, não houve perícia de local. De acordo com Suzana K. Lisboa (op. cit.): 

[...] houve [...] uma emboscada em que os órgãos de segurança se prepararam para matar, eles se organizaram para matar. E fica mais estranho ainda saber que eles não tenham feito isso de forma contínua, realizando, por exemplo, a perícia de local, mostrando as armas nas mãos de cada um dos militantes [...].

As requisições de exame necroscópico ao IML foram assinadas pelo delegado do DOPS/SP, Alcides Cintra Bueno Filho, e os laudos necroscópicos pelos legistas Isaac Abramovitc e Antônio Valentini.

As primeiras contradições surgiram nos próprios documentos oficiais. Antônio Sérgio e Manuel teriam sido encontrados mortos às 16 horas, enquanto Eduardo teria sido encontrado às 15 horas. Os corpos dos três deram entrada no IML às 18h40min, apesar do local dos fatos ser muito próximo à sede do IML.

No laudo de Antônio Sérgio, os legistas relataram dois ferimentos à bala no pescoço e na traqueia e ferimentos não causados por arma de fogo, feitos por instrumento não descrito, mas que levam a supor que tenham sido feitos com proximidade física do agressor .O laudo de Eduardo apresentava dois tiros na região glútea e dois nas pernas capazes de imobilizá-lo, mas não de provocar a morte imediata.

Manuel apresentava orifício de entrada de projétil de arma de fogo na face dorsal da mão direita, característico de reação instintiva de defesa para disparos à queima-roupa. E, ainda, um orifício de entrada de projétil na altura da omoplata esquerda e saída na face anterior do hemitórax esquerdo, após fraturar a clavícula e os segundo e terceiro arcos anteriores esquerdos– tiro dado de cima para baixo e, pela descrição da trajetória, poder-se-ia deduzir que fora dado quando estava dominado e de joelhos. Escoriações nos dois joelhos e no nariz foram anotadas pelos legistas.

As fotos de seus corpos mostram equimoses e edemas não descritos. A de Antônio Sérgio mostra apenas o rosto, com o tórax encoberto, e um objeto junto ao pescoço, que se assemelha a um gancho. A de Manuel José mostra evidentes sinais de tortura, e nenhum dos tiros que recebeu seria fatal.

Suzana k. Lisboa, na 117ª audiência da Comissão da Verdade do Estado de São Paulo Rubens Paiva, no dia 19 de março de 2014 depõe sobre o caso:

No caso do Antônio Sérgio Matos, ele tem ferimentos lácero-contusos. Ele tem uma coisa que parece um gancho, eu não sei o que é aquilo. Ele tem uma coisa aqui, que vem do cabelo aqui, e que eu não sei o que significa aquilo. E ferimentos lácero-contusos não são ferimentos feitos por arma de fogo, né? E eles, necessariamente, para serem produzidos, eles têm que ter a proximidade do agressor com a vítima. Também não sei de que forma eles podem ter sido feitos. Eles são descritos no laudo como dois ferimentos lácero-contusos na face anterior e lateral direita do pescoço, interessando até a traqueia. Não sei se ele chegou a ser socorrido, porque aquilo que tem aqui no pescoço e aquele negócio que bota na [...] traqueia. Eu não sei o que é aquilo. A sensação é que é um gancho, entendeu? Eu muitas vezes olhei aquilo e me apavorei, e me assustei, porque parecia um gancho, que tenham pendurado ele naquele gancho... eu não sei. Eu acho horrível aquele gancho ali. Ele tem outro tiro na perna direita e aí, esse sim, parece ser um tiro que poderia ter causado a morte. Um ferimento de entrada na face lateral direita do tórax, na altura do quinto espaço intercostal, que fraturou o sexto arco e provocou o ferimento lacerante no fígado e teve saída na região lombar direita. E tem outro ferimento também na panturrilha esquerda. Quer dizer, ele levou um tiro na perna para poder imobilizá-lo. Mas, não tem informações para poder imaginar como tenha sido, porque não tem a trajetória dos tiros, não tem a reconstituição interior, né? Não dá pra saber se ele foi executado, se ele foi morto no tiroteio, até porque, não mostra também se os tiros foram disparados à queima-roupa ou não. A foto mostra apenas o rosto e chama a atenção esses ferimentos lácero-contusos que não foram produzidos por arma de fogo. E tem também equimoses, né? Que são identificáveis como sinais de tortura. Tem no pescoço, na região mentoniana, na face interna do lábio, que foram provocados quando ele ainda estava vivo.

Não foi possível determinar com precisão, baseando-se nos dados extraídos dos documentos

encontrados, como e onde morreram.

Antônio foi enterrado como indigente no Cemitério D. Bosco, em Perus, na capital paulista. Em 1975, sua família conseguiu retirar seus restos mortais e trasladá-los para o Rio de Janeiro, onde foi sepultado no sítio de seus pais em Macaé.

IDENTIFICAÇÃO DO LOCAL DA MORTE OU DO DESAPARECIMENTO FORÇADO

Rua João Moura, na altura do nº 2.358, no bairro do Sumarezinho, em São Paulo (SP).

IDENTIFICAÇÃO DA AUTORIA

1. Cadeia de Comando do(s) órgão(s) envolvido(s) na morte ou desaparecimento forçado

 

As requisições dos exames necroscópicos foram assinadas pelo delegado do DOPS, Alcides Cintra Bueno Filho, e os laudos necroscópicos foram feitos pelos Médicos Legistas do IML Isaac Abramovitc e do Antônio Valentini.

 

 

2. Autorias de graves violações de direitos humanos

 

Nome

Órgão

Função

Violação de direitos humanos

Conduta praticada pelo agente (descrita pela fonte)

Local da grave violação

Fonte documental/testemunhal sobre a autoria

Alcides Cintra Bueno Filho

DOPS-SP

Delegado

Tortura e Execução

 

 

1. Dossiê Ditadura: Mortos e Desaparecidos no Brasil (1964-1985), 2009, p. 281-284.

 

Comando da II Região Militar do Exército Brasileiro

 

 

Forneceu suporte para a emboscada, com o jipe e o soldado.

Rua João Moura, na altura do nº 2.358, no bairro do Sumarezinho, em São Paulo (SP).

1. Dossiê Ditadura: Mortos e Desaparecidos no Brasil (1964-1985), 2009, p. 281-284.

Carlos Alberto Brilhante Ustra

DOI-Codi-SP

Comandante

 

 

 

 

 

Folha de São Paulo

 

 

Forneceu suporte para a emboscada, com um de seus caminhões baú.

Rua João Moura, na altura do nº 2.358, no bairro do Sumarezinho, em São Paulo (SP).

1. Dossiê Ditadura: Mortos e Desaparecidos no Brasil (1964-1985), 2009, p. 281-284.

2. Ana Maria Nacinovic

Isaac Abramovitc

IML-SP

Médico Legista

Falsificação de laudo necroscópico

Falsificação de laudo necroscópico

IML-SP

1. Dossiê Ditadura: Mortos e Desaparecidos no Brasil (1964-1985), 2009, p. 281-284.

Antônio Valentini

IML-SP

Médico Legista

Falsificação de laudo necroscópico

Falsificação de laudo necroscópico

IML-SP

1. Dossiê Ditadura: Mortos e Desaparecidos no Brasil (1964-1985), 2009, p. 281-284.

 

FONTES PRINCIPAIS DA INVESTIGAÇÃO

1. Documentos que elucidam as circunstâncias da morte ou desaparecimento forçado

Identificação da fonte documental (fundo e referência)

Título e data do documento

Órgão produtor do documento

Informações relevantes para o caso

Arquivo do Instituto de Estudo da Violência do Estado:001-Antonio-Sergio-de-Mattos.pdf (Fundo: CEMDP)

Dossiê sobre o caso de Antônio Sérgio de Mattos

Comissão especial de mortos e desaparecidos políticos (CEMDP)

Registra informações sobre o caso; nas folhas 09 e 10 documentos pessoais de Antônio Sérgio de Mattos; das folhas 18 à 28 requisição de exame necroscópico e laudo necroscópico, com fichas dactiloscópicas e reprodução fotográfica do cadáver. Nas folhas 29 e 30 certidão de óbito.

Arquivo do Instituto de Estudo da Violência do Estado:002-IML-reproducao-fotografica.pdf(Fundo: IML)

Reprodução fotográfica

Instituto Médico Legal (IML)

Reprodução fotográfica dos três militantes mortos no caso da rua João Moura: Antônio Sérgio de Mattos, Eduardo Antônio da Fonseca e Manuel José Nunes Mendes de Abreu.

Comissão da Verdade do Estado de São Paulo Rubens Paiva: 003-Transcricao-audiencia-comissao-da-verdade-19.3.14.docx (Fundo: CV-Rubens Paiva)

Transcrição da audiência da 117ª audiência pública da Comissão da Verdade do Estado de São Paulo Rubens Paiva

(19/03/14)

Comissão da Verdade do Estado de São Paulo Rubens Paiva

Registra informações e depoimentos sobre o caso da Rua João Moura e os militantes mortos na ocasião.

 

2. Testemunhos sobre o caso prestados à CNV ou às comissões parceiras

Identificação da testemunha

Fonte

Informações relevantes para o caso

Ana Maria Nacinovic (envolvida com o caso)

Dossiê Ditadura: Mortos e Desaparecidos no Brasil (1964-1985), 2009, p. 281-284.

Antes de ser morta em outro caso, relata as circunstâncias da emboscada.

Suzana Keniger Lisboa (conselheira e relatora do caso na CEMDP)

BRASIL. CNV, COMISSÃO DA VERDADE DO ESTADO DE SÃO PAULO RUBENS PAIVA. Testemunho prestado perante a Comissão da Verdade do Estado de São Paulo Rubens Paiva na 117ª audiência pública. São Paulo,19 de março de 2014.Transcrição disponível em anexo.

Relata as torturas sofridas pela vítima e sua morte.

 

3. Depoimentos de agentes do Estado sobre o caso, prestados à CNV ou às comissões parceiras

Identificação do Depoente

Fonte

Informações relevantes para o caso

 

 

 

CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES PARA O CASO

Diante das circunstâncias do caso e das investigações realizadas, pôde-se concluir que a vítima foi executada por agentes do Estado brasileiro, restando uma forjada versão oficial de tiroteio, divulgada à época dos fatos.

Recomendações:

  • Cabe ao estado brasileiro esclarecer em que circunstâncias se deram a morte de Antônio Sérgio de Mattos e responsabilizar os agentes públicos  que  cometeram tais crimes. Recomenda-se também a retificação de seu atestado de óbito. Que o Estado brasileiro reconheça e declare a condição de anistiado político de Antônio Sérgio de Mattos, pedindo oficialmente perdão pelos atos de exceção e violações de direitos humanos que foram praticados contra ele.
  • Recomenda-se cobrar explicações da “Folha de São Paulo” e do Comando da II Região Militar do Exército Brasileiro, sobre o fornecimento de suporte para a emboscada. O incidente deveria ter provocado um inquérito.

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