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INICIAL DO NOME:

JOSÉ LAVECCHIA

OCORRÊNCIA

13/07/1974, em Medianeira, Paraná

DADOS PESSOAIS
Filiação: Leo Lavecchia e Felícia Matheu
Data e local de nascimento: 25 de maio de 1919, São Paulo (SP)
Profissão: Sapateiro
Atuação política: PCB e VPR
Data e local da morte/desaparecimento: 13/07/1974, em Medianeira, Paraná
Organização política: Vanguarda Popular Revolucionária (VPR).

Arquivos

RELATO DO CASO

Nasceu em 25 de maio de 1919, em São Paulo, filho de Leo Lavecchia e Felícia Matheu. Desaparecido em 13 de julho de 1974. Militante da Vanguarda Popular Revolucionária (VPR). Exerceu a profissão de sapateiro, era militante do PCB. Em função de divergências sobre a orientação do partido em relação à luta armada, ingressou na VPR. Morava no sítio comprado pela VPR no Vale do Ribeira (região Sul do estado de São Paulo), onde cumpria o papel de manter uma fachada para esconder a área de treinamento do agrupamento. Após a descoberta da área pelos órgãos de segurança, deslocou-se pela mata com outros guerrilheiros, até ser preso, dias depois.

 

Foi preso em 7 de maio de 1970, durante o cerco militar à área de treinamento de guerrilha da VPR e a seu líder, Carlos Lamarca, no Vale da Ribeira. Banido do território nacional em 15 de junho do mesmo ano, por ocasião do seqüestro do embaixador da Alemanha no Brasil, Ludwig Von Holleben, viajou para a Argélia com outros 39 presos políticos. Dirigiu-se depois para Cuba, onde realizou treinamento de guerrilha. Mais tarde, mudou-se para o Chile, mas teve de se refugiar na Argentina após o golpe de Estado que depôs Salvador Allende.

 

Ao tentar retornar ao Brasil clandestinamente, Lavecchia desapareceu, em julho de 1974, na fronteira da Argentina com o Brasil, com outros banidos. O relatório do Ministério do Exército encaminhado ao ministro da Justiça, em 1993, diz que “[…] em 12 de outubro de 1973, constou de uma relação de brasileiros que se encontravam no Chile e solicitaram asilo na Embaixada da Argentina, viajando para aquele país onde passaram a residir.

 

Em 11 de julho de 1974, entraram clandestinamente no Brasil um grupo de cinco brasileiros: os irmãos Joel e Daniel José de Carvalho, Onofre Pinto, José Lavecchia, e Vitor Carlos Ramos, todos militantes da VPR, além do argentino Enrique Ernesto Ruggia. Desde então, estão desaparecidos.

Esses militantes entraram clandestinamente no território nacional, pela região de Foz do Iguaçu, em julho de 1974. Quatro deles tinham sido banidos entre 1969 e 1971: Onofre, Lavecchia, Daniel e Joel. Foram atraídos para uma cilada e executados em local próximo ao município de Medianeira (PR), no interior do Parque Nacional do Iguaçu. A data da viagem só seria esclarecida após declarações de Idalina Pinto, viúva de Onofre.

Militantes que conviveram com Onofre Pinto após o Massacre da Chácara São Bento, em janeiro de 1973, quando foram mortos seis militantes da VPR em Pernambuco, relataram que esse exilado expressava desespero e inconformismo pela confiança que tinha depositado no agente infiltrado cabo Anselmo. Onofre era o dirigente principal da VPR, fora alertado sobre a infiltração de Anselmo, mas não aceitara as evidências. 

A partir daquele episódio, passou a viver obcecado pela idéia de retornar à luta clandestina no Brasil. No entanto, é provável que tenha incorrido uma segunda vez no mesmo erro fatal, confiando em um ex-sargento da Brigada Militar gaúcha, ligado a Leonel Brizola, Alberi Vieira dos Santos, que parece ter sido um outro agente infiltrado, que atraiu esse grupo para a morte, conforme informações divulgadas quase 20 anos depois.

 

A data da viagem para o Brasil somente foi estabelecida através de informação fornecida por Idalina, mulher de Onofre. As informações acerca do ocorrido com o grupo tiveram novos elementos a partir de 1992, quando foi revelada a atuação do casal Maria Madalena Lacerda de Azevedo e Gilberto Giovanetti, que confessaram terem sido cooptados pelos órgãos de repressão, passando a realizar missões policiais, inclusive no exterior. Giovanetti tinha sido companheiro de Daniel e Joel na Ala Vermelha de São Paulo, tendo participado, segundo documentos dos órgãos de segurança, de assalto a um carro forte, em 14/04/1969, em que dois guardas foram mortos.

 

Madalena e Gilberto afirmam que foram presos num encontro que teriam com Alberi, no dia 13/07/1974, em Curitiba. Já desempenhando a nova posição de agente infiltrado, Madalena viajou para Buenos Aires e avisou a Idalina que o marido estava morto.. A esposa de Onofre tornou públicas suas suspeitas de que Maria Madalena teria sido o último contato de Onofre e a delatora da missão que fariam.

Em 1985, a irmã de Enrique, Lilian, obteve informações sobre a viagem de seu irmão ao Brasil de Flávio R. de Souza, brasileiro exilado na Suécia, que, em 1974, esteve no Hotel Cecil, na Argentina, onde se encontravam outros brasileiros exilados. De acordo com Flávio, a viagem e a ação foram idealizadas por Onofre Pinto. Ele relatou também sua suspeita de que o grupo tivesse sido preso no Rio Grande do Sul.

O ex-sargento e ex-agente do DOI-CODI/SP e do CIE Marival Dias do Canto Chaves confirmou, em depoimento realizado na Câmara Federal em 1993, que a operação foi uma cilada armada por Alberi Vieira dos Santos[1], um ex-sargento infiltrado entre os ativistas da VPR. Alberi mobilizara refugiados políticos no Chile e na Argentina para montarem uma fictícia área de treinamento de guerrilha no Brasil. Alberi fez contato com Onofre Pinto, que liderou o grupo. Marival conta que, ao chegar ao país, o grupo foi levado à suposta área de treinamento. Ali seis pessoas foram assassinadas sumariamente.[2]

Registros dos órgãos de segurança comprovam que, pouco antes da realização da operação responsável pelo desaparecimento desses militantes, eles estavam sendo monitorados pela repressão política dos países do Cone Sul, conforme documento encontrado no arquivo do DOPS/SP sobre Onofre Pinto, onde se lê: “Relatório de Plantão DOPS datado de 29/30 de junho de 1974 informa: Rádio 3749 DPF solicita observações sobre os indivíduos Onofre Pinto e Daniel José de Carvalho, que se dirigem para São Paulo procedentes do Uruguai”.

O relatório do Ministério do Exército, de 1993, ao apresentar os dados referentes a Daniel, comprova que realmente existia uma ligação direta entre os órgãos de repressão dos diversos países do Cone Sul, ainda antes de iniciada a chamada Operação Condor: “O Ministério das Relações Exteriores retransmitiu informações enviadas pelo governo argentino, confirmando o seu ingresso naquele país em 03/10/1973, procedente do Chile, e radicando-se em 31/10/1973 na Província de Corrientes”. A respeito de Joel, o relatório do Ministério do Exército, de 1993, afirma que “em 1974, fez parte de um grupo de refugiados brasileiros que entraram clandestinamente no país, determinados a desenvolver atividades de guerrilha rural”.

Documentos do DOPS/RS confirmam que, em 21 de junho de 1974 (um mês antes de sua partida de Buenos Aires), Onofre Pinto e Daniel José de Carvalho eram esperados na fronteira Brasil–Argentina. O ex-sargento Marival Chaves declarou ao semanário Nosso Tempo que por meio de conversas informais com membros do CIE, ele teria tomado conhecimento de que estava sendo desenvolvida uma operação para matar Onofre Pinto, desde 1973.

Em 24 de março de 2004, em matéria publicada na revista IstoÉ, intitulada “Os Matadores”, Marival Chaves declarou que os coronéis José Brant Teixeira e Paulo Malhães “[…] ganharam fama dentro dos órgãos de repressão ao montar uma emboscada em Medianeira, cidade a sudoeste do Paraná, para atrair, no dia 11 de julho de 1974, um grupo argentino de militantes de esquerda e guerrilheiros. […] Malhães era ligado à DINA [Direção de Inteligência Nacional], o serviço de inteligência chileno, e ganhou o codinome de “Pablo” ao participar do gigantesco interrogatório seguido de torturas no Estádio Nacional de Santiago, logo após o golpe militar […]. Segundo Marival, Malhães montou a emboscada no Paraná com a ajuda da DINA e do ex-sargento Alberi Vieira dos Santos, da Brigada Militar do Rio Grande do Sul, o responsável por atrair os militantes para uma área de guerrilha fictícia na zona rural de Medianeira. De acordo com Marival, Alberi havia sido preso em 1965, ao comandar [sic] uma tentativa de rebelião contra o regime em Três Passos (RS), e acabou se tornando informante do CIE infiltrado na VPR. A chácara […] foi arranjada pelo então capitão Areski de Assis Pinto Abarca, chefe do serviço de inteligência do Quartel do Exército de Foz de Iguaçu, que, após a operação, passou a integrar os quadros do CIE”.[3]

 Aluízio Palmar, jornalista e ex-militante do MR-8 e da VPR, preso no Paraná e banido do país após o seqüestro do embaixador suíço, em 1971, após exaustivo trabalho de investigação conseguiu esclarecer alguns fatos. No seu livro intitulado Onde Vocês Enterram Nossos Mortos?, relatou que descobriu o agente policial que trabalhou com Alberi nessa operação. Utilizando o nome falso de Otávio Camargo, Otávio Ranolfo desempenhou o papel de motorista encarregado de buscar o grupo que saíra de Buenos Aires em 11 de julho. O grupo chegou no dia seguinte e foi levado para o sítio de Niquinho Leite, parente de Alberi, localizado em Boa Vista do Capanema (PR), que, segundo Palmar, desconhecia sua atuação como infiltrado. De acordo com o livro:

“A Operação Juriti estava em marcha, comandada pelo “doutor César” (coronel José Brandt Teixeira) e pelo “doutor Pablo” (coronel Paulo Malhães). Ela havia começado no Chile, teve sua continuidade na Argentina e agora chegava à sua fase final. Durante a viagem pela Argentina, desde que saíram de Buenos Aires, os exilados foram monitorados por agentes do CIE. Marival Chaves foi um deles. Toda a operação foi controlada a distância pelos coronéis Brandt e Malhães. Os agentes fizeram rodízio e acompanharam o retorno dos revolucionários até chegarem ao sítio de Niquinho. Para cumprir a ordem de extermínio, um grupo comandado pelo cão de guerra major Sebastião Rodrigues Curió, que usava o pseudônimo de doutor Marco Antônio Luchini, iria esperar no Caminho do Colono, seis quilômetros mato a dentro do Parque Nacional do Iguaçu. Aquela noite e o dia seguinte eles passaram no sítio. Enquanto uns descansavam, outros foram andar pelo mato ou pescar no Rio Capanema. Ao anoitecer do dia 13, Alberi e Otávio saíram com Joel, Daniel, Victor, Lavecchia e Enrique para executar a primeira ação revolucionária, uma expropriação na agência do Banco do Estado do Paraná, em Medianeira. […] Otávio deu a partida no motor e o carro subiu a lomba, para em seguida seguir pela estreita e sinuosa Estrada do Colono. Com exceção de alguns raios de luz que, de vez em quando cruzavam a mata fechada, a escuridão era total. Depois de rodar quase seis quilômetros, a rural fez uma curva fechada e entrou num picadão à direita, que dava acesso a uma clareira. “Chegamos companheiros”, disse Alberi enquanto descia do veículo. O grupo caminhou um pouco e, de repente, antes de chegar à clareira, fez-se no meio do mato um clarão e fuzilaria abundante. Otávio ficou junto ao carro, Alberi correu e se jogou no solo, Lavecchia deu um tiro a esmo antes de cair. Após o tiroteio, a floresta foi tomada pelo silêncio, apenas interrompido pelo barulho dos coturnos dos militares do grupo de extermínio que saíam de seus esconderijos para fazer um balanço da chacina […] No chão, entre folhas e entrelaçado por cipós, o jovem Enrique Ernesto Ruggia ainda estava vivo […]. A ordem era matar e uma descarga final de pistola tirou o último sopro de vida de Enrique Ruggia.”

Ainda de acordo com Palmar, os corpos foram enterrados ali mesmo e Onofre foi executado logo depois; seu corpo teria sido jogado em um rio.

Em depoimento na Câmara dos Deputados em 21 de maio de 2014, a jornalista Juliana dal Piva, que entrevistou o coronel Paulo Malhães um mês antes de sua morte, na casa em que foi assassinado em Nova Iguaçu (RJ), disse que militar confirmou a participação no episódio, liderando a operação. Segundo dal Piva, no entanto, Malhães afirmou que os corpos dos militantes foram jogados no rio e não enterrados no parque e, portanto, não poderiam ser localizados.

Rosa Cardoso, membro da Comissão Nacional da Verdade, contestou essa informação. Ela afirmou que suas revelações são importantes, mas não são totalmente confiáveis: “O coronel queria causar confusão, dificultar o processo e criar uma cortina de fumaça nas investigações”. Em audiência pública dedicada ao tema, Rosa Cardoso explicita que, apesar da dificuldade em encontrar os corpos, o caso da chacina do Parque Iguaçu tem recebido grandes esforços por parte da CNV e que muitos dos envolvidos com o assassinato desses militantes já foram identificados e as circunstâncias da morte esclarecidas.

Em 1974, chegou ao apogeu a política de extermínio de presos políticos. As versões oficiais já não produziram mortos em tiroteios, fugas ou suicídios farsescos nas cidades. Geisel sabia dessa política. Em janeiro tivera duas conversas com veteranos da luta contra o terrorismo. Uma, com o general Dale Coutinho, quando o convidou para o Ministério do Exército. Dias depois, numa prosa fiada com o chefe de sua segurança, tenente-coronel Germano Arnoldi Pedrozo, Geisel soube que um grupo de pessoas que viera do Chile e passara pela Argentina, havia sido capturado no Paraná. Pedrozo fora ajudante-de-ordens do marechal Castello Branco, passara pelo CIE e merecia do general não só a confiança, mas também estima. 

Em 22 de julho de 2014, foi publicado o documento elaborado pela Comision Provincial por La Memoria (CPM-Argentina) intitulado “Victimas del terrorismo de Estado” encomendado a pedido da Comissão Nacional da Verdade brasileira. A nova documentação traz informações sobre as circunstâncias da prisão e desaparecimento de onze cidadãos brasileiros na Argentina.

O conjunto de documentos inclui também informações do Estado Argentino sobre seis argentinos presos e desaparecidos no Brasil e sobre mais outros cinco casos de graves violações de direitos humanos envolvendo a colaboração de organismos da repressão de ambos os países. A documentação inclui ainda acervo sobre o monitoramento sofrido pelo ex-presidente João Goulart em solo argentino.

Os cinco casos de graves violações de direitos humanos listados são os desaparecimentos de Ary Cabrera Prates e Marcos Arocena, cidadãos uruguaios filhos de pais brasileiros, assim como os casos dos brasileiros Daniel José de Carvalho, Joel José de Carvalho e José Lavecchia.

Em relação à José Lavecchia, foi encontrada uma ficha pessoal de 8 de novembro de 1974. Neste documento, (Mesa Referencia, N° 169989 Tomo I), se faz referência aos residentes chilenos e adeptos estrangeiros ao COMACHI e outras organizações de ajuda ao Chile que, depois do golpe ao presidente Salvador Allende, solicitaram asilo político na Embaixada argentina e residiram naquele país..

No arquivo há uma lista de pessoas de diversos países como Ururguai, Brasil, Chile e Argentina nas primeiras 80 páginas deste tomo. Neste documento, na folha 68 se nomeia Lavecchia como um dos cidadãos que residia no Chile e que pediu asilo na Argentina. Diz textualmente: “Se refugió em La Embajada Argentina em Chile, ingresso al país El 1-11-73 siendo alojado em La Pcia. De Corrientes”.

 

Em outro documento (Mesa “Referencia” Legajo 16998/tomo III. Caratulado Fotografía), anexo no relatório da CPM/Argentina, aparece mais uma vez o nome de José Lavecchia. O nome aparece em conexão com outra longa lista de pessoas, que acrescenta mais informações e fotografia pessoal. Aqui, novamente, sua nacionalidade, data de nascimento, último endereço (o Santiago exibida na guia) e relata que "em setembro 1973, a ser realizado a derrubada do Dr. Allende, buscou refúgio na embaixada da Argentina, no Chile, como resultado das medidas tomadas pelas autoridades militares em relação aos estrangeiros. Introduzido nosso país, 11/01/73, sendo hospedado na província de Corrientes". Ele especifica ainda que "nenhum registro de antecedentes criminais." E adicione no item chamado fundo ideológico que "em sua declaração disse que ele chegou ao Chile em 08.01.73 deixando o Brasil, por motivos de perseguição política. Em seu país, ele foi preso por fazer manifestações políticas contra o governo".

A CEMDP tentou resgatar os restos mortais desses seis militantes com base nas pesquisas realizadas por Aluízio Palmar. A Equipe Argentina de Antropologia Forense (EAAF) chegou a ir ao local em 2001 e 2005 sem conseguir localizar as covas clandestinas.

 Em depoimento à Câmara dos Deputados em 21 de maio de 2014, Ivan Seixas, membro da Comissão Estadual da Verdade de São Paulo, assessor contratado pela CEMDP em 2010, informa que, depois da guerrilha do Araguaia, a chacina do Parque do Iguaçu talvez seja um dos casos em que houve o maior quantidade de investimentos pela CEMDP. Na última tentativa de encontrar os corpos, foram três incursões, com duração de cerca duas semanas cada, com a presença de peritos, da polícia civil, da polícia federal e do ministério público no mapeamento e nas escavações, contando, inclusive, com a presença de uma testemunha no local. Apesar dos esforços coordenados e da logística apropriada, os corpos não foram encontrados.

Ainda de acordo com Ivan Seixas, em 2013, membros da Comissão Nacional da Verdade, em parceria com a CEMDP, a Comissão da Verdade do Paraná e a Comissão da Verdade do Estado de São Paulo, estiveram mais uma vez presentes no local da chacina com a testemunha. Na ocasião, com ajuda de peritos policais, é realizada e devidamente documentada a reconstituição do massacre. Com o cruzamento de informações e novas oitivas, a CNV busca identificar, a partir de novos elementos, todos os envolvidos na chacina e o local exato da inumação. É trabalho também da CNV impedir ações que possam desfigurar o local onde, ainda hoje, ocorrem as buscas pelos corpos. Rafael Schincariol, presidente da CEMDP, afirma, na mesma ocasião, que as buscas continuarão no segundo semestre de 2014. Assim, CNV e CEMDP continuam comprometidos com a busca e localização dos corpos de todos os militantes desaparecidos em julho de 1974 na região do sul do país.

Todos os nomes da chacina do Parque Iguaçu constam da lista de desaparecidos políticos do anexo I da lei 9.140/95, menos o de Vitor Carlos Ramos. Na CEMDP, os casos foram protocolados com os números 282/96, de Daniel José de Carvalho; 276/96, de Enrique Ernesto Ruggia; 140/96, de Joel José de Carvalho; 156/96, de José Lavecchia; e 139/96, de Onofre Pinto. Em homenagem aos militantes desaparecidos – os irmãos Daniel José e Joel José de Carvalho –, as cidades de São Paulo (SP) e Belo Horizonte (MG) deram seus nomes a ruas situadas nos bairros Cidade Dutra e das Indústrias, respectivamente.

 

 

 

 

Fontes investigadas:

 

Conclusões da CEMDP; Dossiê Ditadura – Mortos e Desaparecidos Políticos no Brasil – 1964-1985, IEVE. Contribuição da Comissão da Verdade do Estado de São Paulo: Audiência pública em Foz do Iguaçu sobre os assassinatos na tríplice fronteira realizada pela Comissão Nacional da Verdade em parceria com a Comissão da Verdade do Estado de São Paulo e Comissão da Verdade do Paraná entre os dias 27 e 28/03/2014; Arquivo Público do Estado de São Paulo; Projeto Brasil Nunca Mais Digital; Onde foi que vocês enterraram nossos mortos? PALMAR, Aluizio. Travessa dos Editores, Curitiba, 2012 4 ed.; Lavecchia: um sapateiro contra a ditadura. Barros, Célia. Editora Multifoco, Rio de Janeiro, 2010; Arquivo do Instituto de estudos sobre a violência do Estado – IEVE; Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados - Audiência Pública: Debate a respeito da Chacina do Parque do Iguaçu/PR, durante a ditadura militar, em especial quanto à busca dos corpos das vítimas realizado em 21/05/2014

 

 


[1] O nome de Alberi, até então considerado um herói pelos seus companheiros sobreviventes, constava do Dossiê dos Mortos e Desaparecidos. Ele tinha sido o braço direito do coronel Jefferson Cardin de Alencar Osório na chamada Guerrilha de Três Passos, em março de 1965. Teria sido condenado pela Justiça Militar e cumprira pena de 8 anos. Cinco anos depois, ele próprio seria encontrado morto, em 10/01/1979, na região de Foz do Iguaçu, quando investigava a morte de seu irmão, José Soares dos Santos, ocorrida em janeiro de 1977. Outro dos irmãos de Alberi, Silvano, morreu em 1970, após ter cumprido pena pela participação no movimento de Jefferson Cardin. As condições de sua morte ainda não foram esclarecidas e o pedido de seus familiares à CEMDP terminou sendo indeferido.

 

[2] Marival Chaves acrescenta entre os mortos o nome de Gilberto Faria Lima, conhecido como Zorro, militante da REDE que esteve na área de treinamento da VPR no Vale do Ribeira, em 1970. Seu nome nunca constou da lista de mortos e desaparecidos e não há certeza de que tenha efetivamente integrado o grupo, sendo que seus familiares não apresentaram requerimento à CEMDP.

 

[3] (cont.) “Presos, os irmãos Carvalho, Lavéchia [sic], Vitor, Ruggia e Zorro foram torturados e executados imediatamente”, conta Marival. […] Alberi também teria sido assassinado, como queima de arquivo, em 1977, no Paraná.

 

IDENTIFICAÇÃO DOS AUTORES DA MORTE\DESAPARECIMENTO

Órgão / Período

Nome

Função

conduta

Vivo/data do óbito

Observações

Exército/CIE

José Brant Teixeira

Coronel

Coordena a Operação Juriti desde o Chile até a execução em Medianeiras/PR

 

 

Exército/CIE

Paulo Malhães

Coronel

Coordena a Operação Juriti desde o Chile até a execução em Medianeiras/PR

Assassinado em      25/04/14

 

 

Alberi Vieira dos Santos

Agente infiltrado

Delação e participação na emboscada que culmina no assassinato dos membros da VPR.

Morto em 1979

 

Exército/CIE

Otávio Rainolfo da Silva

Soldado do exército à época dos fatos.

Conduziu o veículo que levou os cinco militantes para o local do assassinato no Parque do Iguaçu.

Hoje é policial civil no estado do Paraná.

A testemunha Otávio Rainolfo da Silva, é atualmente agente da Polícia Civil do Paraná. Na época

servia no Batalhão de Fronteiras e estava lotado na Segunda Seção. Ele declara que juntamente com

Alberi conduziu as vítimas da fronteira até um sítio na localidade de Santo Antonio e dali até o local da

Emboscada.

Exército/CIE

Quartel do Exército de Foz de Iguaçu

Areski de Assis Pinto Abarca

Chefe do serviço de inteligência do Quartel do Exército de Foz do Iguaçu

Responsável por fornecer o local da emboscada aos militantes em Medianeira/PR.

 

 

Exército/CIE

Batalhão de Fronteiras de Foz do Iguaçu

Aramis Ramos Pedroso

Tentente à época dos fatos.

Comandante da operação de vigilância na travessia dos militantes na fronteira.

 

 

II Exército-SP

 

Francisco Aniceto Antonio Carvalho

(“Laicato”)

 

 

 

Participação no sequestro e assassinato dos membros da VPR na tríplice fronteira.

 

 

Exército/CIE

Marival Chaves Dias do Canto

 

Participa do monitoramento da viagem dos militantes de Buenos Aires ao Brasil.

Vivo

 

 Forças Armadas

Marinha/Exército/Aeronáutica

Ernesto Geisel

Presidente do Brasil

Chefe da cadeia de comando que autoriza e coordena as operações de assassinato e ocultamento de cadáver de militantes políticos

Morto em 1996

 

 

Maria Madalena de Azevedo

Ex-militante da VPR e agente infiltrada

Em depoimentos prestados  à Comissão de Representação Externa sobre os Desaparecidos Políticos da Câmara dos Deputados, em 1992, Maria Helena afirma ter sido aliciada por militares para monitorar e delatar atividades de membros da VPR no exterior.

Viva

Dossiê Ditadura p. 505

 

Gilberto Giovaneti

Ex-militante da VPR e agente infiltrado

Em depoimento prestado à CNV, Gilberto relata as circunstâncias em que foi forçado a cooperar com os organismos de repressão.

Vivo

Comissão Nacional da Verdade. Audiência pública em Foz do Iguaçu em 27/03/2013. D

Comissão Nacional da Verdade. Audiência pública em Foz do Iguaçu em 27/03/2013

 

 

 

 

DOCUMENTOS CONSULTADOS

  1. Documentação principal

 

 

Identificação do documento

Órgão da repressão

Observações

Anexo

Jornal do Brasil, 10/04/1993

 

Sobre a morte de Onofre Pinto, Vitor Carlos Ramos e companheiros na região sul do país.

VCR_CE9140001.pdf

Página 7

Revista Nosso Tempo, 05/02/1993

 

 

VCR_CE9140001.pdf

Páginas 4 e 5

Jornal do Brasil, 03/11/1992

 

Sobre a atuação de agentes infiltrados no exterior.

VCR_CE9140001.pdf

Página 8

Folha da Tarde, 20/11/1992

 

Entrevista de Marival Chaves sobre os desaparecimentos

VCR_CE9140001.pdf

Página 10

Decisão Comissão de Anistia

 

Emitida em 17/06/1996

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Carta da Enteada, Célia Barros, à Comissão Nacional da Verdade

 

Autora do livro “Lavecchia: um sapateiro contra a ditadura.”

CartaCeliaBarros.jpeg

Carta da sobrinha, Daniela Christine Aparecida da Silva, à Comissão Nacional da Verdade

 

Datada em 01/06/2012

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Cartasobrinhadaniela2.jpeg

Cartasobrinhadaniela3.jpeg

Relatório “Victimas Del Terrorismo de Estado” da Comissão pela Memória da Província de Buenos Aires

 

O conjunto de documentos inclui informações do Estado Argentino sobre seis argentinos presos e desaparecidos no Brasil e sobre mais outros cinco casos de graves violações de direitos humanos envolvendo a colaboração de organismos da repressão de ambos os países.

Em anexo:

Victimasdelterrorismodeestado.pdf

 

 

 

2. Prova pericial e documental (inclusive fotos e vídeos) sobre a morte/desaparecimento

 

Documento

Fonte

Observação

Anexo

Relatório sobre as expedições da Secretaria Especial de Direitos Humanos (SEDH) e busca dos desaparecidos políticos na estrada do Colono no Parque do Iguaçu/PR.

Secretaria Especial de Direitos Humanos

Relato dos trabalhos em busca dos corpos na região de Foz de Iguaçu em 2010. Escrito por Aluizio Palmar em 29/11/2010.

Em anexo:

Relatorio-para-SEDH- AluizioPalmar2010.pdf

Esclarecimentos sobre as circunstâncias da morte prestados por Otavio Rainolfe a funcionários da SEDH, na ocasião da busca pelos corpos em 2010.

Secretaria Especial de Direitos Humanos

Conversa mantida entre Otávio Rainolfo Camargo e funcionários da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, em novembro de 2010, durante a última expedição no Parque Nacional do Iguaçu.

 

Em anexo:

OtavioRainolfo.pdf

 

 

 

 

3. Testemunhos sobre a prisão, morte/desaparecimento

 

 

Nome

Relação com o morto / desaparecido

Informação

Fonte

 

 

 

 

Lilian Ruggia

Irmã do argentino Enrique Ruggia, assassinado na mesma ocasião.

 

Dossiê Ditadura p. 505

Adão Almeida

Foi o primeiro a ouvir as informações do ex-soldado do exército Otávio Rainolfo da Silva sobre as execuções dos militantes da VPR na região da tríplice fronteira.

O policial federal Adão Almeida foi o primeiro a ouvir o agente da repressão Otávio Rainolfo da Silva, que revelou como os seis militantes da VPR foram atraídos para uma emboscada no Parque Nacional de Foz do Iguaçu. Segundo Almeida, Rainolfo disse que a operação contou com a participação de Sebastião Curió e veículos descaracterizados teriam sido usados. Grupo foi atraído por Alberi Vieira dos Santos, sargento que colaborava com a repressão.

Comissão Nacional da Verdade. Audiência pública em Foz do Iguaçu em 27/03/2013. D

Comissão Nacional da Verdade. Audiência pública em Foz do Iguaçu em 27/03/2013

 

https://www.youtube.com/watch?v=2F8suvBAWcs&list=PL9n0M0Ixl2jdGwkvXyyWnzab_4jpfg2kE&index=2

Aluizio Palmar

Autor do livro "Onde foi que vocês enterraram nossos mortos?", pesquisa o caso há 30 anos. Ele foi o primeiro a depor na audiência e contou detalhes de como pesquisou a chacina de Foz do Iguaçu, em 1974.

Conta detalhes sobre a investigação do caso na CEMDP. Relata como refez os passos dos militantes da Argentina ao Brasil e o descobrimento dos agentes envolvidos no assassinato e desaparecimento dos militantes.

Informa que a morte de Daniel não foi em Medianeira/PR, mas no km 6 do Parque Nacional do Iguaçu.

Comissão Nacional da Verdade. Audiência pública em Foz do Iguaçu em 27/03/2013. D

Comissão Nacional da Verdade. Audiência pública em Foz do Iguaçu em 27/03/2013

 

https://www.youtube.com/watch?v=2F8suvBAWcs&list=PL9n0M0Ixl2jdGwkvXyyWnzab_4jpfg2kE&index=2

Rosa Cardoso

Representante da Comissão Nacional da Verdade

Em depoimento prestado ante a Camara dos Deputados, Rosa esclarece os rumos e os estágios das investigações sobre os responsáveis e as circunstâncias da morte de Daniel José de Carvalho e outras vítimas da “chacina do Parque Iguaçu”.

Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados - Audiência Pública: Debate a respeito da Chacina do Parque do Iguaçu/PR, durante a ditadura militar, em especial quanto à busca dos corpos das vítimas realizado em 21/05/2014

Em anexo:

RosaCardoso21052014.mp3

Ivan Seixas

Representante da Comissão Estadual da Verdade Rubens Paiva.

Depoimento sobre o andamento da investigação sobre a chacina e a busca pelos corpos no âmbito da SEDH e da CNV.

Audiência Pública: Debate a respeito da Chacina do Parque do Iguaçu/PR, durante a ditadura militar, em especial quanto à busca dos corpos das vítimas realizado em 21/05/2014

Em anexo:

IvanSeixas21052014.mp3

Rafael Luiz Feliciano da Costa Schincariol

Coordenador da Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos

Depoimento sobre os próximos passos da parceria CEMDP e CNV na busca pelos corpos da chacina do Parque do Iguaçu.

Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados Audiência Pública: Debate a respeito da Chacina do Parque do Iguaçu/PR, durante a ditadura militar, em especial quanto à busca dos corpos das vítimas realizado em 21/05/2014

 

Em anexo:

RafaelSchincariol21052014.mp3

Juliana Schwartz Dal Piva

Jornalista

Responsável pela condução de diversas entrevistas com ex-tenente-coronel Paulo Malhães e, na audiência pública na Câmara dos Deputados, cita a versão de Malhães sobre os ocorridos na região do Parque Iguaçu.

Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados Audiência Pública: Debate a respeito da Chacina do Parque do Iguaçu/PR, durante a ditadura militar, em especial quanto à busca dos corpos das vítimas realizado em 21/05/2014

 

 

4. Depoimento de agentes da repressão sobre a morte/desaparecimento

 

Nome

Órgão / Função

Informação

Fonte com referências

 

Marival Chaves Dias do Canto

 

À época sargento do DOI-Codi do II Exército de SP

Em entrevista à revista ISTOÉ em 2004, Marival Chaves revela nomes envolvidos com a organização e execução da chacina.

Dossiê Ditadura p.588

Em anexo:

RevistaIstoÉ24032004.pdf

Paulo Malhães

Exército/ CIE. Coronel

Em entrevistas concedidas à jornalista Juliana Dal Piva e em depoimento prestado à Comissão Nacional da Verdade, o ex-tentente-coronel Paulo Malhães relata a participação no caso da chacina do Parque Iguaçu. Teria sido o responsável pela organização logística da operação e a execução de Onofre Pinto.

Agência Câmara e Assessoria de Imprensa da

Comissão Nacional da Verdade

 

 

OBS: Em anexo cópias de todos os documentos reunidos pela Comissão de Familiares dos Mortos e Desaparecidos Políticos e Comissão da Verdade do Estado de São Paulo “Rubens Paiva”

 

 

CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES PARA O CASO

Conclusão: José Lavecchia é considerado desaparecido político, por não ter sido entregue os restos mortais aos seus familiares, não permitindo o seu sepultamento até os dias de hoje. Conforme o exposto no parágrafo 103 da Sentença da Corte Interamericana no Caso Gomes Lund e outros: “adicionalmente, no Direito Internacional, a jurisprudência deste Tribunal foi precursora da consolidação de uma perspectiva abrangente da gravidade e do caráter continuado ou permanente da figura do desaparecimento forçado de pessoas, na qual o ato de desaparecimento e sua execução se iniciam com a privação da liberdade da pessoa e a subseqüente falta de informação sobre seu destino, e permanece enquanto não se conheça o paradeiro da pessoa desaparecida e se determine com certeza sua identidade (...)”.

No parágrafo 110 do mesmo documento é mencionado que: “(...) pode-se concluir que os atos que constituem o desaparecimento forçado têm caráter permanente e que suas conseqüências acarretam uma pluriofensividade aos direitos das pessoas reconhecidos na Convenção Americana, enquanto não se conheça o paradeiro da vítima ou se encontrem seus restos, motivo pelo qual os Estados têm o dever correlato de investigar e, eventualmente, punir os responsáveis, conforme as obrigações decorrentes da Convenção Americana”.  (Sentença da Corte Interamericana, p. 38 e 41, publicação da Comissão Estadual da Verdade de São Paulo).

 

Recomendações: Investigação das circunstâncias da prisão, morte e desaparecimento de José Lavecchia; localização dos restos mortais, responsabilização dos agentes da repressão envolvidos no caso, retificação do atestado de óbito; que o Estado brasileiro reconheça e declare a condição de anistiado político de José Lavecchia, pedindo oficialmente perdão pelos atos de exceção e violações de direitos humanos que foram praticados contra esse desaparecido político.

 

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