FILTRAR POR
INICIAL DO NOME:

HAMILTON FERNANDO DA CUNHA

OCORRÊNCIA

morto em São Paulo no dia 11 de fevereiro de 1969

DADOS PESSOAIS
Filiação: Fernando Manoel Cunha e Filomena Maria Rosa
Data e local de nascimento: Florianópolis (SC), em 1941
Profissão: Gráfico
Atuação política: Militante da VPR (Vanguarda Popular Revolucionária)
Data e local da morte/desaparecimento: morto em São Paulo no dia 11 de fevereiro de 1969
Organização política: Vanguarda Popular Revolucionária (VPR).

RELATO DO CASO

Hamilton Fernando da Cunha nasceu em Florianópolis (SC), em 1941. Filho de Fernando Manoel Cunha e Filomena Maria Rosa, foi morto em 11 de fevereiro de 1969.

Era militante da Vanguarda Popular Revolucionária (VPR) e ligado a atividades artísticas. Atuava em grupos de teatro em São Paulo e gostava de cantar, participando, inclusive, de um coral.

No início de 1969, Hamilton morava no mesmo aparelho onde estava escondido o ex-capitão Carlos Lamarca, que havia abandonado o quartel do Exército de Quitaúna (SP), em 24 de janeiro de 1969.

Foi morto por policiais do DOPS/SP (Departamento de Ordem Política e Social), que tentavam prendê-lo em seu local de trabalho, a Gráfica Urupês.

Preocupado com a possibilidade de ser identificado, em razão das diversas prisões de militantes e simpatizantes da VPR ocorridas no período da fuga de Lamarca, Hamilton, chamado de Escoteiro entre os companheiros, resolveu demitir-se da gráfica. No dia do acerto trabalhista, foi acompanhado de seu colega Roberto Gordo, cujo nome era José Ronaldo Tavares de Lira e Silva, que ficou na sala de espera. Quando ouviu os gritos de Hamilton ao ser preso, Gordo, que estava armado, reagiu. Acabou ferindo um policial e fugiu.

Em documento localizado no DOPS/SP, datado de 11 de fevereiro de 1969, assinado pelo delegado Alcides Cintra Bueno Filho, consta que: “Os investigadores Caetano e Teles, deste DOPS, dirigiram-se à Gráfica Urupês (...) a fim de efetuarem a detenção de Hamilton Fernando Cunha, vulgo “Escoteiro”, que ali fora para receber seus dias de trabalho, pois pedira demissão da firma (...) Quando de sua detenção, ‘Escoteiro’ começou a se debater e a gritar por socorro. Um elemento desconhecido e que acompanhara Hamilton até a porta da firma, adentrou já de arma em punho, disparando-a contra Caetano. Benedito Caetano conseguiu fazer com que o corpo de ‘Escoteiro’ lhe servisse de escudo e este, atingido, veio a falecer no local (...) Hamilton ao entrar na firma deixou sobre o banco, no saguão de entrada, um revólver marca Rossi (...) e 5 balas intactas, que estavam no referido banco embrulhados, os quais foram apreendidos.”

A versão oficial dizia que Hamilton morreu na hora de “hemorragia interna traumática”, segundo atestaram os legistas Pérsio José Carneiro e Paulo Augusto Queiroz Rocha.

Pedro Lobo de Oliveira, sargento da PM/SP (Polícia Militar), expulso da corporação em 1964 e preso no início de 1969, afirmou, em depoimento colhido pela Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos, que ele acompanhou a correria desenfreada nos corredores do DOPS/SP, em 11 de fevereiro, quando testemunhou o investigador Caetano com um tiro debaixo do braço após a operação em que foram prender “terroristas” na Gráfica Urupês. Neste momento, ouviu do investigador: “Foi o Roberto Gordo que me acertou, mas ainda bem que eu apaguei o Escoteiro”.

Hamilton foi enterrado no Cemitério de Vila Formosa, em São Paulo.

Na CEMDP (Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos), depois do requerimento de indenização 160/96 não ter sido acolhido por 4 votos contra e 3 a favor, os da relatora Suzana Keniger Lisbôa, de Nilmário Miranda e João Grandino Rodas, a família entrou com um pedido de reconsideração do caso em 25 de setembro de 1997, também negado. Novas provas foram anexadas e o requerimento da família foi deferido em 1998. A relatora Suzana Lisbôa elaborou um “Relatório de Recurso” para recolocar o caso em discussão, que incluiu a versão apresentada, a análise do laudo necroscópico e a divulgação da notícia. Acrescentou declarações prestadas por funcionários da gráfica e testemunhas do ocorrido. No material, ficou claro que Hamilton não estava armado ao ser preso e não participou do tiroteio.

Também foi decisivo para o deferimento do caso o depoimento do militar reformado José Ronaldo Tavares de Lira e Silva, o Roberto Gordo, ouvido por Nilmário Miranda em 3 de fevereiro de 1998, em Curitiba (PR), conforme informou em seu relatório anexado ao processo: “Em 1968 e início de 1969 houve prisões de militantes e simpatizantes da VPR. Inseguro quanto à possibilidade de algum dos presos tê-lo identificado, ‘Escoteiro’ resolveu demitir-se da gráfica onde trabalhava, e a base em que militava decidiu que Roberto Gordo o acompanhasse para lhe dar cobertura em caso de necessidade no dia do acerto trabalhista. ‘Escoteiro’ lhe informou que já tinha combinado previamente com a direção

da Gráfica o referido acerto. Gordo [José Ronaldo Tavares de Lira e Silva] ficou aguardando na sala de espera e quando ouviu gritos de socorro e reconheceu a voz de ‘Escoteiro’ dizendo que não era bandido (...), atirou contra os policiais ferindo um deles; bateu em retirada, buscando a rua e a fuga”.

A relatora concluiu que a prisão de Hamilton foi arquitetada pelo DOPS. Ele foi detido desarmado em seu local de trabalho e executado após estar sob a guarda do Estado. Apesar de ferido às 16 horas, seu corpo somente foi levado ao IML (Instituto Médico Legal) às 23 horas, trajando apenas camisa, meias e sapatos. Ademais, O laudo necroscópico, assinado por Pérsio José Ribeiro Carneiro, descreve um único tiro e registra que o fato teria ocorrido às 16 horas, no Alto da Moóca, em São Paulo. Não descreve os grandes edemas na face e na fronte, as equimoses e ferimentos corto-contusos visíveis na foto do cadáver.

Finalmente, em 25 de março de 1998, o caso de Hamilton foi deferido por 6 votos a favor e 1 contra, o do general Oswaldo Pereira Gomes.

 

Fontes investigadas:

Conclusões da CEMDP; Dossiê Ditadura – Mortos e Desaparecidos Políticos no Brasil – 1964-1985, IEVE.

 

IDENTIFICAÇÃO DOS AUTORES DA MORTE\DESAPARECIMENTO

Órgão / Período

Nome

Função

conduta

Vivo/data do óbito

Observações

DOPS/SP

Alcides Cintra Bueno

Delegado

falsificação na descrição das circunstâncias da morte, na requisição de exame necroscópico

Morto

(anexo 002-bo-requisicao-e-laudo-necroscopico-hamilton-fernando-cunha.pdf)

DOPS/SP

Caetano

Investigador

Homicídio

???

Conforme depoimento de Pedro Lobo de Oliveira, Sargento da PM expulso da corporação em 1964, o investigador Caetano afirmou que foi o responsável pela morte de Hamilton (dossiê p. 131)

DOPS/SP

Teles

Investigador

Homicídio

???

Participou da ação que culminou com a morte de Hamilton.

IML/SP

Pérsio José Ribeiro Carneiro

Médico Legista

Falsificação de laudo necroscópico

???

Elaboração de laudo com diversas imprecisões e omissões (anexo 002-bo-requisicao-e-laudo-necroscopico-hamilton-fernando-cunha.pdf)

IML/SP

Paulo Augusto Queiroz Rocha.

 

Médico Legista

Falsificação de laudo necroscópico

???

Elaboração de laudo com diversas imprecisões e omissões (anexo 002-bo-requisicao-e-laudo-necroscopico-hamilton-fernando-cunha.pdf)

 

FONTES DA INVESTIGAÇÃO

1. Documentação principal

 

 

Identificação do documento

Órgão da repressão

Observações

Anexo

Dossiê da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos

 

Documento encaminhado à Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos

001-dossie-CEMDP-hamilton-fernando-cunha.pdf

Documentos de perseguição política

DOPS/SP

Informações constantes no DOPS/SP

003-documentos-perseguicao-hamilton-fernando-cunha.pdf

 

 

2. Prova pericial e documental (inclusive fotos e vídeos) sobre a morte/desaparecimento

 

Documento

 

fonte

Observação

Anexo

Requisição e exame necroscópico

Arquivo IEVE

 

002-bo-requisicao-e-laudo-necroscopico-hamilton-fernando-cunha

Fotos de Hamilton morto

Arquivo IEVE

 

005-foto-hamilton-fernando-cunha-morto.pdf

 

 

3. Testemunhos sobre a morte/desaparecimento

 

Nome

relação com o morto / desaparecido

Informação

fonte com referências

Pedro Lobo de Oliveira

Sargento da PM expulso em 1964 e preso no DOPS em 1969

Testemunhou nos corredores do DOPS o investigador Caetano dizendo que tinha matado Hamilton

Dossiê Ditadura p. 131

José Ronaldo Tavares de Lira e Silva (Roberto Gordo)

Companheiro de organização política

Testemunhou que foi à gráfica Urupês dar cobertura à Hamilton, que lá iria para receber os dias trabalhados. Afirmou que ficou na sala de espera quando ouviu os gritos de Hamilton e por isso atirou contra um dos policiais. Assim restou comprovado que Hamilton não estava armado e não participou de tiroteio.

Dossiê Ditadura p. 132

 

 

4. Depoimento de agentes da repressão sobre a morte/desaparecimento

 

Nome

Órgão / Função

Informação

fonte com referências

 

 

 

 

CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES PARA O CASO

Conclusão: Hamilton Fernando da Cunha foi morto sob tortura por agentes do Estado, conforme restou comprovado pela análise das informações contraditórias entre o laudo do exame necroscópico e a foto do cadáver, bem como pelos testemunhos que comprovaram que Hamilton estava desarmado quando foi preso, não participou de tiroteio, bem como faleceu quando estava sob a guarda do Estado.

Recomendações: Apuração das circunstancias da prisão, torturas e assassinato de Hamilton Fernando da Cunha e responsabilização dos agentes públicos envolvidos. Retificação do Atestado de Óbito, a fim de que conste o real motivo da sua morte; que o Estado brasileiro reconheça e declare a condição de anistiado político, pedindo oficialmente perdão pelos atos de exceção e violações de direitos humanos que foram praticados contra ele.

Veja Também:

EXPEDIENTE