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INICIAL DO NOME:

JOSÉ FERREIRA DE ALMEIDA

OCORRÊNCIA

Morto em 08 de Agosto de 1975, no DOI-CODI/SP

DADOS PESSOAIS
Filiação: Olympia Ferreira de Almeida e Joaquim Josimo Ferreira
Data e local de nascimento: 16/12/1911, Piracaia (SP)
Profissão: Tenente da reserva da polícia militar do Estado de São Paulo
Data e local da morte/desaparecimento: Morto em 08 de Agosto de 1975, no DOI-CODI/SP
Organização política: Partido Comunista Brasileiro (PCB).

BIOGRAFIA

José Ferreira de Almeida era tenente da reserva da Polícia Militar do Estado de São Paulo. Era casado e não tinha filhos. Aos 64 anos de idade, foi preso em 7 de julho de 1975, com outros militantes e vários policiais da PM, acusados de serem membros do PCB. Sua prisão e morte são consequência da “Operação Radar”, uma grande ofensiva do Exército, iniciada em 1973, para dizimar a direção do PCB.

 

José Ferreira de Almeida é o primeiro morto oficial assassinado no período da “distensão política”. Sua morte foi divulgada em julho de 1975 como “suicídio”. A opinião pública, entretanto, somente se mobilizou com o caso de Vladimir Herzog, jornalista assassinado sob tortura em 25 de outubro daquele ano, cuja morte também foi divulgada como “suicídio”. Sua família e o Sindicato dos Jornalistas de São Paulo contestaram a versão oficial de que Herzog teria se suicidado, o que desencadeou um movimento de protesto com repercussão internacional. Nessa ocasião, iniciaram-se articulações para constituir um movimento em favor da anistia para os presos políticos. O assassinato do tenente José Ferreira de Almeida, ainda que menos conhecido e divulgado que outros, é parte das atrocidades praticadas pela ditadura durante o governo de Ernesto Geisel.

 

EXAME DA MORTE ANTERIORMENTE À INSTITUIÇÃO DA CNV

 

José Ferreira de Almeida e a (hoje já falecida) esposa, Maria Sierra, não tiveram filhos e seus ascendentes também já morreram. Pela lei, não havia mais ninguém que pudesse receber a indenização, sendo por essa razão indeferido o caso (269/96) na CEMDP, cujo relator foi o general Oswaldo Pereira Gomes, em 17 de outubro de 1996. No entanto, a CEMDP reconheceu a responsabilidade do Estado pela sua morte e indeferiu apenas o pagamento da indenização O nome de José Ferreira de Almeida consta no Dossiê ditadura: Mortos e Desaparecidos no Brasil (1964-1985) organizado pela Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos nas páginas 616 à 618.

 

CIRCUNSTÂNCIAS DA MORTE

  • CIRCUNSTÂNCIAS DA MORTE

 

José Ferreira de Almeida foi preso em 07/07/1975, com 63 anos de idade, acusado de ser militante do PCB, juntamente com outros opositores políticos do regime, em boa parte integrantes da mesma corporação militar. Passou um mês incomunicável, sofreu torturas físicas e psicológicas. Depois de várias tentativas, seu advogado conseguiu visitá-lo, em 7 de agosto, no DEOPS/SP. Na visita, o advogado pôde observar o quanto se encontrava abatido, tenso, com sinais bem visíveis de tortura, escoriações, marcas de choques. Ele teria dito ao advogado que temia ser morto. Mal acabou a visita, os policiais o levaram de volta para o DOI-CODI/SP. No dia seguinte, segundo nota do Exército, apareceu morto, enforcado, “[…] ao amarrar o cinto do macacão que os presos utilizavam a uma das grades da cela”.[1]

 

Seu corpo foi velado no Hospital Cruz Azul da Polícia Militar, com a presença de agentes de segurança do II Exército. O caixão foi aberto pelo advogado e familiares, que puderam constatar as torturas sofridas. No atestado de óbito consta a data da morte, em hora ignorada, na sede do DOI-CODI, na rua Thómas Carvalhal, 1030, Vila Mariana, São Paulo, o qual foi assinado pelos legistas Harry Shibata e Marcos de Almeida.

 

Depoimentos em auditorias militares dos presos políticos major Carlos Gomes Machado, capitão Manoel Lopes e tenente Atílio Geromin denunciaram as torturas sofridas por José Ferreira.

Carlos Gomes Machado, à época com 62 anos, fez uma denúncia por escrito sobre o caso:

 

Além disso, embora sabendo ser eu cardíaco, não podendo sofrer emoções, levaram-me para ver outros colegas meus serem torturados, como foram os casos do tenente Atílio Geromin, que ficou com marcas indeléveis nas duas pernas, visto que fora amarrado em uma cadeira de braços chamada, pelos interrogadores, de “cadeira do dragão”; tenente José Ferreira de Almeida que, apesar de seus 63 anos de idade, foi levado à morte em virtude das torturas que lhe foram aplicadas, tais como “pau-de-arara”, choques elétricos, palmatória, etc., que se repetiam diariamente.

 

Nos arquivos do DOPS/SP foi encontrada uma única folha, com o carimbo do DOPS e datada de 4 de novembro de 1975, de um relatório sucinto de enfermaria com datas, prescrições e horários, que se iniciam em 8 de julho de 1975, nome e idade do paciente sem referências a clínica, quarto ou leito. Acrescido ao impresso: “II Exército”.

 

Nessa ficha, em 6 de agosto de 1975, na coluna medicamento lê-se: “entorse no tornozelo

direito” e na coluna tratamento: “enfaixamento” e em 8 de agosto de 1975, na coluna medicamento, lê-se “suicidou-se”.

 

No relatório do Ministério da Marinha encaminhado ao ministro da Justiça, Maurício Corrêa, em 1993, pode-se ler: “[…] foi morto em ação de segurança no dia 7 de agosto de 1975. Era 2° T (RRn - PMSP), pertencia ao PCB”.

 

Em A Ditadura Encurralada, o jornalista Elio Gaspari tratou do caso:

 

Descobrira-se uma base do Partidão dentro da Polícia Militar paulista. Ela estivera invicta desde sua montagem, em 1946. Funcionava sob as rígidas normas de segurança do Setor Militar, ligando-se diretamente a um representante pessoal do secretário-geral do PC. Segundo o CIE, conseguira infiltrar um sargento no DOI por dois anos. Na sua liquidação, prenderam-se 63 policiais. Entre eles, nove oficiais da ativa, inclusive um tenente-coronel, e doze da reserva. O tenente reformado José Ferreira de Almeida, o Piracaia, tinha 64 anos e mais de vinte anos de militância. […] No princípio de agosto, deitado num colchão da carceragem do DOI, despediu-se de um capitão: “Eu não agüento mais… Vou morrer.” […] O II Exército informou que no dia 8 de agosto Piracaia se enforcara. Teria amarrado o cinto do macacão à grade da cela, de forma que seu corpo pendeu com as pernas dobradas e os pés no chão. Segundo o SNI, Piracaia se matara “quando havia indícios de que iria nomear os prováveis contatos em outras áreas militares”. Oficialmente era o 36º preso a se suicidar dentro de uma prisão da ditadura, o 16º enforcado, o sétimo a fazê-lo sem vão livre.

 


[1] Pouco mais de dois meses depois, na mesma cela, ocorreria a farsa que simulou o suicídio por enforcamento do jornalista Vladimir Herzog, em 25 de outubro de 1975. Esta farsa ainda se repetiria quando houve o assassinato de outro preso político, ocorrido no mesmo DOI-CODI, o do operário Manoel Fiel Filho, em 16 de janeiro de 1976.

 

IDENTIFICAÇÃO DO LOCAL DA MORTE

DOI/CODI/SP – Rua Thomás Carvalhal, 1030, Paraíso, São Paulo/SP

IDENTIFICAÇÃO DA AUTORIA

1. Cadeia de Comando do(s) órgão(s) envolvido(s) na morte

 

DOI/CODI/SP: Coronel Ednardo D´Avila Mello, comandante do II Exército; Pedro Nunes de Oliveira, funcionário.

IML/SP: Harry Shibata (legista); Marcos de Almeida (legista)

 

2. Autorias de graves violações de direitos humanos

 

 

Nome

Órgão

Função

Violação de direitos humanos

Conduta praticada pelo agente (descrita pela fonte)

Local da grave violação

Fonte documental/testemunhal sobre a autoria (CAMPO OBRIGATÓRIO)

Harry Shibata

IML

Legista

 

Falsificação do atestado de óbito

DOI/IML

Dossiê Ditadura p.617

Marcos de Almeida

IML

Legista

 

Falsificação do atestado de óbito

DOI/IML

Dossiê Ditadura p.617

Ednardo D´Ávila Mello

II Exercito/ DOI-CODI/SP

Comandante do II Exército

 

 

DOI/CODI/SP

 

 

 

FONTES PRINCIPAIS DA INVESTIGAÇÃO

Dossiê Ditadura; Direito à Memória e Verdade (CEMDP); 96º Audiência Pública da Comissão da Verdade do Estado de São Paulo “Rubens Paiva”, realizada em 22/11/2013.

 

1. Documentos que elucidam as circunstâncias da morte ou desaparecimento forçado

 

Identificação da fonte documental (fundo e referência)

Título e data do documento

Órgão produtor do documento

Informações relevantes para o caso

001-CEMDP-Jose-Ferreira-Almeida.pdf (página 1)

Anexo ao processo de José Ferreira de Almeida na CEMDP.

29/07/1996

Comissão dos Familiares dos Mortos e Desaparecidos Políticos

Informe da reportagem de jornal enviada á CEMDP pela Comissão de Familiares no caso de José Ferreira de Almeida

001-CEMDP-Jose-Ferreira-Almeida.pdf (página 2)

Anexo ao processo de José Ferreira de Almeida na CEMDP.

19/04/1996

Comissão dos Familiares dos Mortos e Desaparecidos Políticos

Documentos encontrados pela Comissão de Familiares nos arquivos do antigo DOPS/SP que demonstram a versão oficial de suicídio de José Ferreira de Almeida nas dependências do DOI/CODI/SP.

001-CEMDP-Jose-Ferreira-Almeida.pdf (página 3)

Relatório da Enfermaria/II Exército.

 

DOPS/SP

Carimbo de 04/11/1975

Demonstra a versão oficial de suicídio de José Ferreira de Almeida. Documento de uma única folha, com o carimbo do DOPS e datada de 4 de novembro de 1975. É o relatório sucinto da enfermaria com datas, prescrições e horários, que se iniciam em 8 de julho de 1975, nome e idade do paciente sem referências a clínica, quarto ou leito. Acrescido ao impresso: “II Exército”. Nessa ficha, em 6 de agosto de 1975, na coluna medicamento lê-se: “entorse no tornozelo direito” e na coluna tratamento: “enfaixamento” e em 8 de agosto de 1975, na coluna medicamento, lê-se “suicidou-se”.

 

001-CEMDP-Jose-Ferreira-Almeida.pdf (página 4)

Vão a Julgamento 23 do PCdoB.

28/08/1977

Jornal O “Estado de São Paulo”

Notícia sobre o julgamento de 23 integrantes do PCdoB indiciados no inquérito, cujas ações resultaram na morte de José Ferreira de Almeida

001-CEMDP-Jose-Ferreira-Almeida.pdf (páginas 5-9)

Requerimento enviado à CEMDP.

31/03/1996

Escritório de Advocacia de Luiz Eduardo Greenhalg.

Resumo do requerimento dos sobrinhos Nazareth Aparecida Folli, Noemia Sierra Filho e Neide Sierra Yoshikawa à CEMDP, com a sua versão sobre os fatos e documentos comprobatórios.

001-CEMDP-Jose-Ferreira-Almeida.pdf (página 17)

Certidão de Casamento. 

05/08/1946

Registro Civil do 21º Subdistrito.

Emitido em 19/04/1976

 

001-CEMDP-Jose-Ferreira-Almeida.pdf (página 19)

Certidão de Óbito.

08/08/1975

Registro Civil do Jardim América.

Emitido em 09/11/1995

No atestado de óbito consta como local da morte Rua Thomás Carvalhal, 1030 e a causa da morte é apontada como “asfixia por constrição do pescoço – enforcamento”. O declarante é Pedro Nunes de Oliveira, sabidamente funcionário do DOI/CODI à época dos fatos. Consta como legista responsável Harry Shibata.

002-CEMDP-Jose-Ferreira-Almeida.pdf

(páginas 1 e 2)

Parecer do relator Oswaldo Pereira Gomes. Processo 296/96.

17/10/1996

Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos

O parecer desfavorável ao deferimento do pedido dos familiares de José Ferreira de Almeida baseia-se no fato do pleito por indenização ter sido realizado por parentes indiretos. A despeito disso, as circunstâncias da morte preenchiam todos os requerimentos para o reconhecimento da responsabilidade do estado na morte de José Ferreira de Almeida.

002-CEMDP-Jose-Ferreira-Almeida.pdf

(página 3)

Publicação do Indeferimento no Diário Oficial da União (DOU).

22/10/1996

CEMDP/ Diário Oficial da União.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

2. Testemunhos sobre o caso prestados à CNV ou às comissões parceiras

 

 

Identificação da testemunha [nome e qualificação]

Fonte

Informações relevantes para o caso

Carlos Gomes Machado (major detido com José Ferreira de Almeida)

Depoimento prestado em auditoria militar. Dossiê Ditadura (página 617)

 

Relata as torturas sofridas pela vítima e sua morte.

“Além disso, embora sabendo ser eu cardíaco, não podendo sofrer emoções, levaram-me para ver outros colegas meus serem torturados, como foram os casos do tenente Atílio Geromin, que ficou com marcas indeléveis nas duas pernas, visto que fora amarrado em uma cadeira de braços chamada, pelos interrogadores, de “cadeira do dragão”; tenente José Ferreira de Almeida que, apesar de seus 63 anos de idade, foi levado à morte em virtude das torturas que lhe foram aplicadas, tais como “pau-de-arara”, choques elétricos, palmatória, etc., que se repetiam diariamente.”

 

Manoel Lopes (capitão do Exército, preso com José Ferreira de Almeida)

Depoimento prestado à Auditoria Militar. Dossiê Ditadura (página 617)

 

Atílio Geromin (Tenente, detido com José Ferreira de Almeida)

Depoimento prestado à Auditoria Militar. Dossiê Ditadura (página 617)

 

Osni Geraldo Santa Rosa (membro da antiga Guarda Civil)

Depoimento prestado na XX Audiência Pública da Comissão da Verdade do Estado de São Paulo “Rubens Paiva”, no dia 22 de novembro de 2013.

Relata ter tomado conhecimento, no período em que esteve detido no DOI/CODI em 1975, que José Ferreira de Almeida teria sido “trucidado, arrebentado” por agentes da repressão no local.

 

 

3. Depoimentos de agentes do Estado sobre o caso, prestados à CNV ou às comissões parceiras

 

 

Identificação do Depoente

[nome e qualificação]

Fonte

Informações relevantes para o caso

 

CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES PARA O CASO

Diante das circunstâncias do caso e das investigações realizadas, pôde-se concluir que a vítima foi executada por agentes do Estado brasileiro, restando desconstruída a versão oficial de suicídio divulgada à época dos fatos.

Recomendações:

Retificação do atestado de óbito, identificação e responsabilização dos agentes envolvidos na prisão, tortura e morte de José Ferreira de Almeida nas dependências do DOI-CODI/SP.

 

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