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INICIAL DO NOME:

JOÃO BATISTA FRANCO DRUMOND

OCORRÊNCIA

Morto em São Paulo em 16 de dezembro de 1976

DADOS PESSOAIS
Filiação: João Batista Drumond e Zilah de Carvalho Drumond
Data e local de nascimento: 28 de maio de 1942, na fazenda das Posses, em Varginha (MG)
Profissão: Economista
Atuação política: Dirigente do Partido Comunista do Brasil (PCdoB)
Data e local da morte/desaparecimento: Morto em São Paulo em 16 de dezembro de 1976
Organização política: Partido Comunista do Brasil (PCdoB).

Arquivos

RELATO DO CASO

Nasceu em 28 de maio de 1942, na fazenda das Posses, em Varginha (MG), filho de João Batista Drumond e Zilah de Carvalho Drumond. Morto em 16 de dezembro de 1976. Dirigente do Partido Comunista do Brasil (PCdoB). Era casado com Maria Esther Cristelli Drumond e tiveram duas filhas, Rosamaria e Sílvia. Cursou o 1° grau (atual ensino fundamental) no Ginásio Salesiano Dom Bosco, de Cachoeira do Campo (MG), e o 2° grau (atual ensino médio) no Colégio Loyola, em Belo Horizonte (MG). Em 1961, ingressou no curso de Economia da FACE/UFMG, concluído em 1966. Exerceu a presidência do diretório acadêmico daquela faculdade no período de 1964-1965 e foi um dos principais organizadores dos 27° e 28° congressos da UNE. Além de sua militância na política estudantil, participou, desde 1963, do movimento camponês no Sul de Minas e das campanhas eleitorais, com o líder operário Dazinho. Foi membro da organização Ação Popular (AP) e, posteriormente, da Ação Popular Marxista- Leninista (APML) – em que exerceu diversas funções, como responsável pela Secretaria de Organização, em 1969, e membro do Comitê Político, em 1971. Entre 1969 e 1970, foi julgado pela Justiça Militar e teve seus direitos políticos cassados por dez anos, além de ter sido condenado, à revelia, a 14 anos de prisão. Em 1972, vivendo na clandestinidade, passou a militar no PCdoB, cujo Comitê Central passou a integrar em 1974. (Dossiê Ditadura, p. 670)

 

João Batista Franco Drumond frequentava uma casa localizada na Lapa, bairro paulistano. Na noite do dia 15 de dezembro de 1976, véspera do ataque a casa, ao encerrarem a reunião, os dirigentes começaram a se retirarem em duplas. “A casa está sob vigilância há dias. O Corcel é seguido, com cuidado, por vários carros empregados no esquema montado pelo DOI. E o que sucede depois com Wladimir [Pomar], após serem deixados na Avenida Nove de Julho; as equipes do II Exército passam a seguir os dois, separadamente – enquanto Elza e Joaquim retornam sem incidentes ao aparelho, para buscar a dupla seguinte. Drumond, que iria para Goiás, é preso antes de iniciar a viagem. Wladimir chega a notar que estão no seu encalço e tenta despistar os perseguidores. Arranja tempo para livrar-se de documentos. É capturado na Avenida Santo Amaro, acusado de ser puxador de carro, e aí mesmo começa a ser espancado. Já no DOI, apanhando ‘de soco, pau e botinada’, percebe, antes da meia noite, a presença do companheiro, revelada pelo comentário de um agente. O pacote de biscoitos ‘recheado’ com o jornal do partido ‘A Classe Operária’, mencionado por alguém em tom de galhofa, ele o vira nas mãos de Drumond antes de se retirarem da casa da Lapa. Depois escutará os gritos de dor [de Drumond]. Cerca de quatro horas do dia 16, Wladimir ouve uma correria, gente descendo as escadas, uma voz que pede um médico com urgência. É possível que Drumond tenha tentado fugir em meio às sessões de tortura, saltando de uma janela. O certo, ainda assim, é que ele morre sob tortura nas dependências do DOI” (pp. 19-20 . Livro Massacre na Lapa)

 

Ronco de motores em alta velocidade, rangido de pneus e estampidos de tiros assustaram os moradores da rua Pio XI, bairro da Lapa, em São Paulo, na manhã de 16 de dezembro de 1976. Quem espiou pela janela viu pelo menos 10 viaturas do Exército e 40 agentes policiais e militares armados com revólveres, carabinas e metralhadoras, apontando para a casa de número 767, onde se realizava uma reunião da alta direção do PCdoB. Sem nenhum agente do Estado ferido, o casal de moradores foi preso no local e restaram mortos, no interior da residência, dois dos mais importantes dirigentes daquele partido: Pedro Pomar e Ângelo Arroyo. Outro dirigente do PCdoB que também participava da reunião, João Batista Franco Drumond, já tinha sido preso durante a noite e morreu sob torturas no DOI. Embora o II Exército já estivesse sob o comando do general Dilermando Gomes Monteiro, defensor da distensão política proposta por Ernesto Geisel, o comunicado oficial enviado à imprensa se manteve exatamente no mesmo padrão farsante dos anos anteriores. A versão do Comando do II Exército informava que “os ocupantes da casa ofereceram resistência armada, e por isso foram mortos em tiroteio”. O jornal Diário Popular de 17/12/1976 publicou que, “os subversivos Pedro de Araújo Pomar, Ângelo Arroyo e João Batista Franco Drumond morreram após violento tiroteio com agentes do DOI do II Exército”. Segundo a nota oficial divulgada, uma “operação montada e executada pelo II Exército com a colaboração de outros órgãos de segurança” desmontou, na manhã do dia 16 de dezembro, um aparelho no Bairro da Lapa. A nota dizia que durante a operação uma área do bairro foi interditada, enquanto era travado um tiroteio na Rua Pio XI em decorrência da “reação dos sitiados”, o que resultou em dois mortos e um terceiro atropelado em fuga. (Direito à Memória e à Verdade, p. 423)

 

O relatório do Ministério da Aeronáutica entregue ao ministro da Justiça, Maurício Corrêa, em 1993, diz que João Batista “foi morto em confronto com agentes dos órgãos de segurança”. Segundo o relatório do Ministério da Marinha, “foi morto num tiroteio em 16 de dezembro de 1976 no bairro da Lapa quando a casa em que se encontrava com outros companheiros foi invadida pelos agentes de segurança”.

No entanto, em documento encontrado no IML/SP, a causa da morte é dada como atropelamento na avenida Nove de Julho esquina com a rua Paim, bairro da Bela Vista, local distante da Lapa. Foi enterrado pela família no Cemitério do Parque da Colina, em Belo Horizonte. No fim de 1993, a Justiça Federal deu ganho de causa à família de Drumond na ação movida contra a União, quando reconheceu que ele morreu no DOI-CODI/SP na madrugada de 16 de dezembro de 1976. Foi a primeira manifestação da Justiça civil sobre a “Chacina da Lapa”, decisão que não deixou dúvidas sobre a responsabilidade dos agentes públicos daquele órgão de segurança. Em sua homenagem, a cidade de Belo Horizonte deu o seu nome a uma rua no bairro Braúnas. (Dossiê Ditadura, p. 671)

 

O episódio ficou conhecido como “Chacina da Lapa”, quando os agentes do DOI-CODI/SP cercaram a casa na rua Pio XI (bairro da Lapa, São Paulo), em 16 de dezembro de 1976. Segundo os vizinhos, em nenhum momento houve troca de tiros, mas sim uma fuzilaria que partia apenas do lado de fora, onde estavam os agentes da repressão política. Pedro Pomar, Ângelo Arroyo e outros dirigentes do PCdoB reuniram-se durante dois dias (14 e 15 de dezembro de 1976) na casa. O Exército obteve informações sobre a reunião com o militante Manoel Jover Teles (posteriormente considerado pelo PCdoB o delator da reunião), e montou a operação com o objetivo de desmantelar o partido. (Dossiê Ditadura, p. 673)

 

Ofícios do comando do II Exército às forças militares citam o nome de Pedro Pomar, Ângelo Arroyo e Aldo Arantes como participantes da reunião e comunicam que a casa estava sob vigilância de agentes do DOI-CODI/II Exército. De acordo com o jornalista Pedro Estevam da Rocha Pomar, no livro Massacre na Lapa: “[Era] meio-dia [de 16 de dezembro] quando Frederic Chapin, cônsul-geral dos Estados Unidos em São Paulo, chega ao prédio da Cúria Metropolitana. Nervoso, quase invade a sala de D. Paulo Evaristo Arns. Fala da chacina, pede ao Cardeal que inicie gestões para evitar a morte dos que estão presos. “Sabíamos da reunião há dias, mas não esperávamos que sob o Dilermando [Monteiro, comandante do II Exército] acontecesse o que aconteceu”, diz o diplomata. E avisa a D. Paulo que tem os nomes dos militantes presos”

 

Há uma contradição entre o laudo pericial dos prédios e o laudo de exame pericial das armas. O primeiro laudo só reconhece o uso de um revólver Taurus; o segundo afirma que teria sido disparado também um revólver OH. As armas constantes da segunda perícia foram arroladas no dia 16. O DOPS, no entanto, só requereu exame das peças em 21 de dezembro, quase uma semana depois da chacina. Não foi realizado laudo pericial que apontasse sinais de pólvora nos dedos das mãos de Ângelo Arroyo e Pedro Pomar. Os corpos foram retirados da posição em que caíram durante o ataque e arrumados de forma a que se demonstrasse que estavam portando armas. Na montagem da foto dos corpos, Pomar aparece com óculos no rosto, mas o depoimento de seu filho Wladimir esclarece que ele enxergava muito bem e usava óculos exclusivamente para leitura.

 

O economista João Batista Franco Drumond foi preso em 15 de dezembro de 1976 quando saía da casa da Lapa, onde participou de reunião do PCdoB. Foi morto nas dependências do DOI na madrugada do dia 16. Elio Gaspari, no livro A Ditadura Encurralada, transcreve e comenta a informação que o general Figueiredo, então chefe do SNI, enviou ao presidente Ernesto Geisel, relatando o “Massacre da Lapa”:

 

“1. O DOI do II Ex. acompanhava há três meses atividades do Comitê Nacional do PCdoB desenvolvidas em ligação com a USP. [Falso. A operação fora montada pelo CIE de Brasília, vieram o chefe de sua seção de operações, coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, e algo como quatro homens. Outra equipe viera do Rio e se aquartelara no II Exército]. […] 6. O terceiro elemento tentou fugir pela caixa-d’água, tendo entretanto caído à rua, fraturado o crânio e sido atropelado por um automóvel, falecendo em conseqüência. [Falso. O terceiro morto, o economista João Batista Franco Drumond, fora preso à noite, depois de ter sido deixado perto da avenida Nove de Julho, e morrera horas antes do ataque, no DOI. A simulação pretendia fabricar um suicida fora do DOI. Ela livrou o general Dilermando Gomes Monteiro do estigma que acompanhou o general Ednardo D’Avila Mello até sua morte, em 1984.]”.

 

Conforme versão dos órgãos de repressão encontrada no arquivo do extinto DOPS/SP, Drumond morreu após ser atropelado por um veículo não identificado na rua Paim, na Bela Vista. O laudo necroscópico aponta como horário da sua morte 4 horas da manhã de 16 de dezembro. A casa onde os integrantes do partido se reuniam estava sendo vigiada pelas forças de segurança havia quatro dias. Foram presos Maria Trindade, que ainda estava na casa, Haroldo Borges Rodrigues Lima, Aldo Arantes e Wladimir Pomar, que já haviam saído da reunião. Elza de Lima Monnerat e Joaquim Celso de Lima foram presos quando estavam em um carro em frente à casa. (Dossiê Ditadura, p. 674)

 

As notícias veiculadas pela imprensa confirmam a informação: Segundo informou o II Exército, ontem era a terceira vez que agentes vigiavam a casa com os subversivos reunidos em seu interior […] (Diário Popular – 17 de dezembro de 1976).

 

Sobreviventes do ataque desmentem a versão oficial da morte de Drumond. O jornal Diário Popular, de 17 de dezembro de 1976, publicou que “[…] os subversivos Pedro de Araújo Pomar, Ângelo Arroyo e João Batista Franco Drumond morreram após violento tiroteio com agentes do DOI do II Exército”. Os legistas que assinaram os laudos necroscópicos dos três foram José Gomes Dias e Abeylard Q. Orsini. O laudo necroscópico de Drumond, porém, homologa a versão de atropelamento, também divulgada pela imprensa.

 

Sobre o suposto atropelamento, Pedro Estevam da Rocha Pomar, no livro citado, traz documentos oficiais do Exército em que fica provado que militares e policiais mantinham sob estrita vigilância os membros reunidos na casa da Lapa. Ele questiona como esses mesmos agentes não identificaram o automóvel e seu condutor, responsável pelo atropelamento. O inquérito policial militar do II Exército concluiu que a morte foi causada por atropelamento, mesmo sem laudo de perícia ou fotos do ocorrido. Pedro Estevam da Rocha Pomar questiona, ainda, que Wladimir Pomar e Drummond foram deixados por Joaquim em um local distante de onde teria ocorrido o suposto “atropelamento”. Ainda segundo relato do jornalista Pedro Estevam da Rocha Pomar, o repórter Nelson Veiga, da TV Bandeirantes, que conseguiu furar o sistema de segurança policial e entrar na casa logo após o fuzilamento, negou a presença de armas de fogo ao lado dos corpos antes da chegada dos peritos.

 

De acordo com a nota oficial, uma “[…] operação montada e executada pelo II Exército com a colaboração de outros órgãos de segurança” desmontou, na manhã de 16 de dezembro, um “aparelho” no bairro da Lapa. A nota dizia que, durante a operação, uma área do bairro fora interditada, enquanto era travado um tiroteio na rua Pio XI em decorrência da “reação dos sitiados”, o que resultou em dois mortos e um terceiro atropelado em fuga. Segundo depoimento de Maria Trindade, presa na casa, as pessoas que se encontravam no interior da residência não tiveram chance. Em uma entrevista ao jornal gaúcho Zero Hora, de 3 de novembro de 1995, ela relatou: “Na hora em que a casa foi invadida eu fazia o café. […] Eu ouvi aquele barulhinho, assim, como se estivessem atirando pedrinhas nos vidros […]. O Ângelo Arroyo estava saindo do banheiro e foi pego por uma bala […]. Ele caiu na minha frente. Na outra janela, no quarto, as balas corriam de um lado para o outro, de parede a parede. Lá eles mataram o Pomar”.

 

Com base nos documentos anexados ao caso, recolhidos pelo jornalista Pedro Estevam da Rocha Pomar, depoimentos de Wladimir Pomar, Aldo Arantes e do ex-sargento Marival Dias Chaves do Canto, o relator na CEMDP, Nilmário Miranda, conclui que é falsa a versão oficial de que João Batista Franco Drumond foi morto por atropelamento. Além disso, uma sentença judicial de 1993 responsabilizou a União pela morte desse militante no DOI-CODI de São Paulo. Miranda destacou que, no mesmo local (o DOI-CODI/SP) já haviam morrido Vladimir Herzog e Manoel Fiel Filho, fatos que causaram grande comoção e levaram ao afastamento do general Ednardo D’Ávila Mello, substituído pelo general Dilermando Monteiro. Uma nova morte dentro do DOI teria péssima repercussão, não sendo possível aceitar a versão de suicídio. Daí a versão forjada de atropelamento.

 

Nilmário Miranda afirmou que Drumond portava identidade falsa e, portanto, não seria possível saber de imediato quem era a vítima do suposto “atropelamento”. Observações do médico-legista Antenor Chicarino, feitas para instruir o processo disciplinar no Cremesp contra médicos-legistas que teriam assinado laudos falsos de presos políticos mortos sob tortura, sobre o laudo de necropsia de João Batista Franco Drumond, fazem referência à fratura de punho e a pequenas escoriações no tornozelo e nádegas. Ele descreve também uma mancha roxa na pálpebra esquerda e nenhuma outra lesão, inclusive hemorragia de ouvido e nariz, que seriam compatíveis com a fratura de crânio apontada. Não foram registrados no laudo, mas aparecem na fotografia: inchaço e mancha roxa na pálpebra direita, corte do canto da boca até próximo à orelha e desvio do nariz para a esquerda. Assim, o relator concluiu: “A ação dos órgãos de repressão não foi a simples invasão de uma casa. O objetivo não era capturá-los. […] Armas de grosso calibre, metralhadoras, cerco e obstrução da rua, atestam o estado sitiado de Ângelo Arroyo [e dos demais]. A única sobrevivente do massacre, a dona da casa, foi poupada. Saiu com vida do tiroteio, corroborando, pois, o fato para ratificar qual era o objetivo dos órgãos de repressão: o assassinato de Ângelo Arroyo [e Pedro Pomar]”.

 

Na Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos, o caso de Ângelo Arroyo foi aprovado em 29 de fevereiro de 1996 por 4 votos a favor e 3 contra, os de Miguel Reale Jr., Eunice Paiva e do general Oswaldo Pereira Gomes. Os casos de João Batista Drumond e Pedro Pomar foram aprovados em 23 de abril de 1996; o caso de Pedro Pomar por 5 votos a favor e 2 contra, os do general Oswaldo Pereira Gomes e Miguel Reale Jr.; o de João Baptista Franco Drumond foi aprovado por unanimidade. Em homenagem a Ângelo Arroyo, as cidades de São Paulo e Rio de Janeiro deram o seu nome a ruas na Vila Feliz e em Bangu, respectivamente; e em homenagem a Pedro Pomar, as mesmas cidades deram o seu nome a ruas no Jardim Elisa Maria e em Bangu, respectivamente.

 

A Comissão da Verdade do Estado de São Paulo realizou audiência pública no dia 13 de setembro de 2013 sobre a retificação do atestado de óbito de João Batista com o advogado Egmar de Oliveira. Egmar recebeu o pedido da viúva Maria Ester Cristelli Drumond. “Ela confessou para mim, que uma das coisas que ela mais queria, que as filhas mais queriam, era mudar o atestado de óbito, porque elas tinham certeza de que o João não morreu atropelado e que aquilo era muito difícil de explicar. E ela sentia uma necessidade de explicar isso basicamente lá na França [onde mora a viúva com as filhas de João Batista], porque eles diziam o seguinte ‘você fala que são perseguidos políticos e [a versão é que] ele morreu atropelado em um acidente na avenida Nove de Julho, esquina com a rua Paim, em São Paulo’. Então, isso para elas era uma questão que precisava ser resolvida. [...] No dia 14 de dezembro de 2011 foi protocolizado aqui no Fórum de São Paulo, na Praça João Mendes, uma ação de retificação do pedido de óbito”. (Anexo 001-transcricao-audiencia-publica.pdf)

 

O pedido deu origem ao Processo nº: 059583-24.201.8.26.010 e na decisão expedida pelo Tribunal de Justiça de 16 de abril de 2012, houve parecer favorável, na primeira instância, do juiz Dr. Guilherme Madeira Dezem. “Ante o exposto, julgo PROCEDENTE o pedido para determinar a retificação da certidão de óbito de fls. 21 para que onde se lê “falecido no dia 16 de dezembro de 1976 na Av. 9 de Julho c/R;Paim” conste “falecido no dia 16 de dezembro de 1976 nas dependências do DOI/CODI II Exército, em São Paulo” e onde se lê causa da morte “Traumatismo craniano encefálico” leia-se “decorrente de torturas físicas”. (Anexo 002-sentenca-primeira-instancia.pdf)

 

A partir daí, o Ministério Público do Estado de São Paulo colocou objeção quanto à palavra “tortura”, argumentando ter “ausência de prova” para o que foi denunciado e requerido no atestado. A Comissão da Verdade “Rubens Paiva” acompanhou a audiência decisiva realizada no dia 18 de fevereiro de 2014. Em uma decisão de dois votos contra um, o Tribunal de Justiça de São Paulo decidiu acatar o pedido de retificação do Atestado de Óbito de João Batista Franco Drumond. Ao votar contra, o juiz Luiz Beethoven Giffoni Ferreira disse: “A prova em que se baseou a R. decisão não detém validade jurídica, senão em função de ideologia e de “caça às bruxas” relativamente ao período em que o País esteve sob o regime de exceção. E é nessa linha que se insere o pleito; como bem revela o apelo, não há prova estreme de dúvidas acerca da “causa mortis” e ainda que a existira, não fôra caso de memória e verdade histórica, como revelado pelo eminente Relator. A questão é meramente legal [...] A Lei dos Registros Públicos não acolita a exegese pretendida pela R. decisão, secundada pelo H. Voto. Se assim não fôra, de ora em diante dever-se-á em casos de acidente de trânsito assentar que a defunção derase

por “acidente de ônibus”, “queda de escada”, “acidente de motocicleta” e quejandos. A pretensão, pois, assina cunho ideológico, e os tais casos envolvendo aspectos semelhantes e já profligados, reconhecidos excessos havidos, não detém repercussão na L.R.P. por mais que se queira dizer o contrário. Direito à integridade pessoal é hialino há que ser respeitado; mas Também merece respeito a letra da Lei, que não acolita pretensão que tal. Termos em que, por minha decisão, ficava deferido integral provimento ao apelo, retirada do Assento a expressão “morte decorrente de torturas físicas” para “traumatismo crânio-encefálico”. (Anexo 003-voto-vencido.pdf)

 

Como relator, o juiz, Dr. Álvaro Passos, negou provimento ao recurso do Ministério Público do Estado de São Paulo que questionou o uso da palavra “tortura”. Neste caso, ele utilizou em sua argumentação a retificação do atestado de óbito do jornalista Vladimir Herzog, cujo pedido foi feito depois do caso de João Batista Franco Drumond e teve parecer favorável. “Para conferir autenticidade e segurança, a Lei de Registros Públicos admite a retificação de assento, desde que o pedido se encontre fundamentado e instruído com documentos probatórios (Art. 109 da Lei nº 6.015, de 31 de Dezembro de 1973). Neste sentido, o juiz Márcio Martins Bonilha Filho, da 2ª Vara de Registros Públicos do Tribunal de Justiça de São Paulo, determinou a retificação no assento de óbito do jornalista Vladimir Herzog, assassinado durante o período da ditadura militar. Segundo a decisão, a CNV “conta com respaldo legal para exercer diversos poderes administrativos e praticar atos compatíveis com suas atribuições legais, dentre as quais recomendações de 'adoção de medidas destinadas à efetiva reconciliação nacional, promovendo a reconstrução da história', à luz do julgado na Ação Declaratória, que passou pelo crivo da Segunda Instância, com o reconhecimento da não comprovação do imputado suicídio, fato alegado com base em laudo pericial que se revelou incorreto, impõe-se a ordenação da retificação pretendida no assento de óbito de Vlademir Herzog (sic). Portanto, após a recomendação da Comissão Nacional da Verdade, a Justiça de São Paulo ordenou a alteração da “causa mortis” do jornalista, falecido em decorrência de lesões e maus tratos sofridos nas dependências do II Exército SP (DOI-CODI). Com efeito, a Comissão Nacional da Verdade, criada pela Lei nº 12.528, de 18 de novembro de 2011, tem por finalidade examinar e esclarecer as graves violações de direitos humanos, no período de 18 de setembro de 1946 até a data da promulgação da Constituição. Ademais, de acordo com a Corte Interamericana de Direitos Humanos, o órgão “tem feito referência em reiteradas ocasiões ao direito que cabe aos familiares das vítimas de conhecer o que ocorreu e de saber quem foram os agentes do Estado responsáveis pelos fatos, assim como o direito da sociedade de conhecer a verdade. Desse modo, a Comissão entende que o direito à verdade encontra-se fundamentado nos artigos 8 e 25 da Convenção, na medida em que ambos velam pelo acesso aos recursos judiciais, os quais são instrumentos para alcançar a verdade. Portanto, com o objetivo de efetivar o direito à memória e à verdade histórica, além de abrandar a dor experimentada pelos familiares do militante, a retificação no assento de óbito é devida [...] Afinal, além de inexistir obrigatoriedade de que a decisão se manifeste acerca de todos os argumentos das partes, bastando que questões relevantes e conclusivas sejam apreciadas, não houve ofensa a qualquer dispositivo legal ou constitucional a justificar o acolhimento de tal pretensão ...] Por todo o exposto, nego provimento ao recurso”. (Anexo 004-voto vencedor.pdf)

 

 

Fontes investigadas:

 

Conclusões da CEMDP; Dossiê Ditadura – Mortos e Desaparecidos Políticos no Brasil – 1964-1985, IEVE. Decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo. Livro Massacre na Lapa: como o exército liquidou o comitê central do PCdoB do jornalista Pedro Estevam da Rocha Pomar. Contribuição da Comissão da Verdade do Estado de São Paulo (73ª audiência pública sobre o caso da retificação do atestado de óbito de João Batista Franco Drumond e 60ª audiência pública sobre a Chacina da Lapa).

 

 

IDENTIFICAÇÃO DOS AUTORES DA MORTE\DESAPARECIMENTO

Órgão / Período

Nome

Função

conduta

Vivo/data do óbito

Observações

DOPS-SP

SÉRGIO PARANHOS FLEURY

Delegado

Prisão, tortura e morte

morto

 

II EXÉRCITO

DILERMANDO GOMES MONTEIRO

General e comandante do II Exército

Prisão

 

 

II EXÉRCITO

EDNARDO D’AVILA MELLO

General

Prisão

 

 

II EXÉRCITO

RUFINO FERREIRA NEVES

Tenente-coronel

Prisão

 

 

IML

HARRY SHIBATA

Médico-legista

Falsificação do laudo necroscópico

Vivo

 

IML

JOSÉ GONÇALVES DIAS

Médico-legista

Falsificação do laudo necroscópico

 

 

IML

ABEYLARD DE Q. ORSINI

Médico-legista

Falsificação do laudo necroscópico

 

 

 

 

DOCUMENTOS CONSULTADOS

  1. Documentação principal

 

 

Identificação do documento

Órgão da repressão

Observações

Anexo

Transcrição da audiência pública da Comissão “Rubens Paiva”

 

 

001-transcricao-audiencia-publica.pdf

Sentença do tribunal de Justiça de São Paulo na primeira instância sobre o pedido de retificação do atestado de óbito

 

Aprovação do Juiz Dr. Guilherme Madeira Dezem. “Ante o exposto, julgo PROCEDENTE o pedido para determinar a retificação da certidão de óbito de fls. 21 para que onde se lê “falecido no dia 16 de dezembro de 1976 na Av. 9 de Julho c/R;Paim” conste “falecido no dia 16 de dezembro de 1976 nas dependências do DOI/CODI II Exército, em São Paulo” e onde se lê causa da morte “Traumatismo craniano encefálico” leia-se “decorrente de torturas físicas”

002-sentenca-primeira-instancia.pdf

Voto não favorável, proferido no Tribunal de Justiça de São Paulo, na segunda instância, sobre a retificação do atestado de óbito

 

O juiz Luiz Beethoven Giffoni Ferreira disse fez a defesa da intervenção do Ministério Público do Estado de São Paulo que questionou o fato de inserir a palavra “tortura” na descrição da “causa mortis” de João Batista

003-voto-vencido.pdf

Voto favorável, proferido no Tribunal de Justiça de São Paulo, pela retificação do atestado de óbito

 

O relator Álvaro Passos negou provimento ao recurso do Ministério Público do Estado de São Paulo que questionou o uso da palavra “tortura”.

004-voto-vencedor.pdf

Auto de reconhecimento do corpo de João Batista Franco Drumond

 

Consta no documento que o corpo fora reconhecido por João Batista Moura Drumond

005-auto-reconhecimento.pdf

Cálculo de salário de economista

 

 

006-calculo-salario-economista.pdf

Certidão de casamento

 

 

007-certidao-casamento.pdf

Convite de formatura

 

 

008-convite-formatura.pdf

Diário Oficial

 

Publicação da Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos do reconhecimento do caso de João Batista Franco Drumond

009-diario-oficial.jpg

Fichas do Dops

 

Fichas datiloscópica com dados pessoais. Dentre as informações compiladas, consta como causa da morte “traumatismo crânio encefálico”. Médicos que atestaram: José Gonçalves Dias; Abeylard Orsini;

010-fichas-dops.pdf

Foto de João Batista vivo

 

 

012-foto-vivo.jpg

Histórico escolar de João Batista

 

 

013-historico-escolar.pdf

Registro do diploma em Ciências Econômicas

 

 

015-registro-diploma-economista.pdf

Registro de Nascimento de João Batista Franco Drumond e de suas filhas Rosa Maria e Silvia.

 

 

016-registros-nascimento.pdf

Ofício encaminhado à Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos

 

Foram encaminhadas cópias dos documentos para constar no processo de João Batista Franco Drumond

018-oficio-miguel-reale.pdf

Pedido de indenização pelos danos da ordem moral e imaterial – Justiça Federal de São Paulo

 

Primeiro processo aberto pela viúva que teve como alvo o pedido de indenização alegando danos morais. A viúva Maria Ester Cristelli Drumond e suas filhas alegaram no pedido a decorrência da prisão arbitrária e morte de seu marido João Batista. A juíza Marianina Galante julgou procedente o pedido no dia 16 de julho de 1993.

019-primeiro-processo-viuva-tribunal-justica.pdf

Reportagens sobre João Batista Franco Drumond

 

 

020-reportagens.pdf

 

 

 

2. Prova pericial e documental (inclusive fotos e vídeos) sobre a morte/desaparecimento

 

Documento

Fonte

Observação

Anexo

Laudo de Exame de Corpo de Delito

IML-SP /DOPS-SP

Documento assinado pelos médicos-legistas José Gonçalves Dias; e Abeylard Orsini, designados pelo legista Harry Shibata. “Consta que o examinado foi vítima de atropelamento [...] o evento letal é explicado por traumatismos crânio-encefálicos”

014-laudo-exame-corpo-delito.pdf

Requisição de Exame Necroscópico

IML-SP

 

017-requisicao-exame.pdf

Fotos de João Batista morto

 

 

011-fotos-morto.pdf

 

 

 

 

3. Testemunhos sobre a prisão, morte/desaparecimento

 

 

Nome

Relação com o morto / desaparecido

Informação

Fonte

Maria Trindade

Militante do PCdoB

Estava na casa da Lapa, era encarregada das tarefas domésticas. Escutou de Pedro Pomar “Que desgraça! Nos pegaram!”

(pp. 17-18) do livro Massacre na Lapa: como o exército liquidou o comitê central do PCdoB do jornalista Pedro Estevam da Rocha Pomar

Haroldo Borges Rodrigues Lima

Militante do PCdoB

Estava na casa da Lapa, foi seguido e preso no dia seguinte na casa que morava na Avenida Pompeia

(p. 20) do livro Massacre na Lapa: como o exército liquidou o comitê central do PCdoB do jornalista Pedro Estevam da Rocha Pomar

Aldo Arantes

Militante do PCdoB

Foi preso na noite do dia 15, quando estava próximo à Estação Paraíso do metrô.

(p. 20) do livro Massacre na Lapa: como o exército liquidou o comitê central do PCdoB do jornalista Pedro Estevam da Rocha Pomar

Wladimir Pomar

Militante do PCdoB

Foi preso na noite do dia 15 e levado para o DOI-Codi-SP

 

Elza de Lima Monnerat

Companheira de organização

Morava na casa da Lapa

 

Joaquim Celso de Lima

Companheiro de organização

Motorista do PCdoB, preso na manhã do dia 16 de dezembro, antes do massacre, escutou de um dos agentes do DOI “Tudo limpo. Pode tocar a operação”

(p. 17) do livro Massacre na Lapa: como o exército liquidou o comitê central do PCdoB do jornalista Pedro Estevam da Rocha Pomar

Nelson Veiga

 

Repórter da  Bandeirantes, primeiro a ver a casa depois do Massacre, ao saber da operação, conseguiu entrar na casa e viu os corpos de Angelo Arroyo e Pedro Pomar. “Negou a presença de armas de fogo ao lado dos corpos antes da chegada dos peritos”

(p. 18) do livro Massacre na Lapa: como o exército liquidou o comitê central do PCdoB do jornalista Pedro Estevam da Rocha Pomar

 

Dossiê Ditadura (p. 675)

 

 

4. Depoimento de agentes da repressão sobre a morte/desaparecimento

 

Nome

Órgão / Função

Informação

Fonte com referências

 

 

 

 

 

OBS: Em anexo cópias de todos os documentos reunidos pela Comissão de Familiares dos Mortos e Desaparecidos Políticos e Comissão da Verdade do Estado de São Paulo “Rubens Paiva”

 

CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES PARA O CASO

Conclusão: João Batista Franco Drumond foi preso e torturado até a morte por agentes do Estado em operação envolvendo dezenas de pessoas do DOI-Codi-SP/II Exército e do DOPS-SP

Recomendação: que o Estado brasileiro reconheça e declare a condição de anistiado político de João Batista Franco Drumond pedindo oficialmente perdão pelos atos de exceção e violação de direitos humanos que foram praticados contra esse morto.

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