/Mortos e Desaparecidos
ORGANIZAÇÃO:
INICIAL DO NOME:
- JAIME PETIT DA SILVA
- JEAN HENRI RAYA RIBARD
- JEOVÁ ASSIS GOMES
- JOÃO ANTÔNIO SANTOS ABI-EÇAB
- JOÃO BATISTA FRANCO DRUMOND
- JOÃO CARLOS CAVALCANTI REIS
- JOÃO DOMINGUES DA SILVA
- JOÃO LEONARDO DA SILVA ROCHA
- JOÃO MASSENA MELO
- JOAQUIM ALENCAR DE SEIXAS
- JOAQUIM CÂMARA FERREIRA
- JOEL JOSÉ DE CARVALHO
- JOELSON CRISPIM
- JOSÉ CAMPOS BARRETO (ZEQUINHA)
- JOSÉ FERREIRA DE ALMEIDA
- JOSÉ GUIMARÃES
- JOSÉ IDÉZIO BRIANEZI
- JOSÉ JULIO DE ARAÚJO
- JOSÉ LAVECCHIA
- JOSÉ MARIA FERREIRA DE ARAÚJO
- JOSÉ MAXIMINO DE ANDRADE NETTO
- JOSÉ MILTON BARBOSA
- JOSÉ MONTENEGRO DE LIMA
- JOSÉ ROBERTO ARANTES DE ALMEIDA
- JOSÉ ROMAN
- JOSÉ WILSON LESSA SABBAG
- JUAN ANTONIO CARRASCO FORRASTAL
JEOVÁ ASSIS GOMES
OCORRÊNCIAdesaparecido em Guaraí [Goiás], atual Estado do Tocantins, no dia 09 de janeiro de 1972
Arquivos
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003 - Documentos de Perseguição Jeová Assis Gomes 156
Informações: Domentos que comprovam perseguição plítica a Jeová Assis Gomes. Constam: reportagens jornalísticas, relatórios, históricos, dentre outros.
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002 - Dossiê CEMDP Jeová Assis Gomes
Informações: Dossiê encaminhado à CEMDP, por Maria Assis Gomes, mãe de Jeová Assis Gomes. Constam: Certidão de nascimento e óbito, reportagens jornalísticas, depoimentos, documentos, dentre outros.
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004 - Ação Civil Pública Jeová Assis Gomes
Informações: Ação civil pública. Ministério Público Federal.
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001 - Ficha CENIMAR Identificação Jeová Assis Gomes
Informações: Reconhecimento da identidade falsa utilizada por Jeová Assis Gomes. Marinha (Cenimar).
RELATO DO CASO
Jeová Assis Gomes nasceu em 24 de agosto de 1943, em Araxá (MG). Filho de Luiz Gomes Filho e Maria José de Assis Gomes, foi morto em 9 de janeiro de 1972. Era militante do Movimento de Libertação Nacional (Molipo).
Estudava Física na USP (Universidade de São Paulo), e militava no movimento estudantil. Em junho de 1965 participou da chamada “Greve do Fogão” contra o aumento de preço das refeições servidas aos estudantes no restaurante do CRUSP (Conjunto Residencial da Universidade de São Paulo) e a favor de melhorias na alimentação. Participou também da ocupação do Bloco F do CRUSP, em 1967, que tinha cerca de 1.200 universitários na época, e da invasão da Reitoria da universidade, em 1968.
Após a decretação do AI-5, o CRUSP foi ocupado pelo Exército, a Aeronáutica e a Força Pública com tanques blindados, em 17 de dezembro de 1968. Muitos estudantes foram presos e Jeová foi expulso da universidade.
Foi um dos articuladores e dirigentes da Dissidência Estudantil do PCB/SP (Partido Comunista Brasileiro) e em 1968, passou a militar na ALN (Ação Libertadora Nacional). Após a edição do AI-5, atuou de forma clandestina em Brasília (DF) e Goiás.
Foi preso em Goiás (atual estado de Tocantins), em 12 de novembro de 1969 e levado para a Oban – Operação Bandeirante (posteriormente reorganizada como DOI-CODI), em São Paulo. As torturas a que foi submetido lhe causaram fraturas nas duas pernas. Ficou preso até junho de 1970.
Jeová foi banido do país, com mais 39 presos políticos, em troca do embaixador alemão Von Holleben, seqüestrado em junho de 1970 pela ALN e pela VPR (Vanguarda Popular Revolucionária). Foi levado para a Argélia em 13 de junho do mesmo ano e, posteriormente, para Cuba, onde participou de treinamento de guerrilha.
Ao retornar clandestinamente ao Brasil, em 1971, já como militante da MOLIPO, radicou-se em Guaraí (TO, na época estado de Goiás). Em 9 de janeiro de 1972, Jeová foi localizado em um campo de futebol e morto.
No jornal “O Estado de S. Paulo”, de 13 de janeiro de 1972, foi publicada uma matéria com o título “Líder Terrorista Morto em Goiás”, que reproduziu o comunicado dos órgãos de segurança intitulado “Outro Terrorista Banido Morre Reagindo à Prisão no Interior Goiano”: “Algumas equipes de segurança deslocaram-se de Brasília para o interior de Goiás no encalço de um grupo terrorista empenhado na implantação da guerrilha rural, ao longo da Belém–Brasília. Pelos dados existentes, o referido bando era chefiado por um elemento de grande periculosidade, chegado de Cuba nos meados de 1971, onde fora preparado e incumbido de, no Brasil, ativar a guerrilha e coordenar sua implantação no interior de Goiás. A equipe de segurança abordou o referido elemento, convidando-o, discretamente, a acompanhá-la para fora do pequeno estádio. Aquiesceu, deslocando-se cerca de 15 metros, quando se jogou no chão, puxando do bolso uma granada, na tentativa de acioná-la, no que foi impedido a tiros pelos agentes, no interesse de evitar um morticínio de largas proporções, de populares inocentes.”
Diversos jornais, como “O Globo” e “Jornal do Brasil”, da mesma data, também reproduziram essas informações.
O relator do caso na CEMDP (Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos), Nilmário Miranda, apresentou o relatório do então delegado de Guaraí, 2º Sargento da PM, José do Bonfim Pinto: “Aos nove dias de janeiro de 1972, mais ou menos às 15:30 horas, desembarcou nesta cidade, procedente do sul, um indivíduo que, mais tarde foi identificado como Geová [sic] Assis Gomes, terrorista de destaque da ALN. Tomou quarto num hotel local, onde deixou uma pasta que trazia ao desembarcar. Mais ou menos às 16h, rumou para o acampamento da Redobrás, em cuja quadra de esportes era disputada uma partida de futebol, ali se misturou com o povo. Mais ou menos às 16:30 horas, foi abordado por uns senhores, que mais tarde se identificaram como agentes do DOI-CODI/11º RM, os quais, procurando afastá-lo do meio do povo, deram-lhe voz de prisão, chamando-o pelo seu nome. Vendo-se identificado, empurrou dois dos agentes e tentou empreender fuga, forçando um dos agentes a alvejá-lo. Dado a posição que recebeu o projétil (tórax), teve morte instantânea”.
Ao concluir o relatório, o delegado descreveu o que fora encontrado na pasta: mapas de Goiás, bússola, roupas, documentos, um revólver, munição e uma bomba de fabricação caseira. Posteriormente, em 15 de setembro de 1972, o delegado encaminhou correspondência ao secretário de Segurança de Goiás, dizendo que, estando impossibilitado de abrir inquérito para investigar a morte de Jeová, remetia todo o material existente na Delegacia de Polícia.
Em seu voto, o relator descreveu as tentativas feitas para obter os documentos relativos à morte de Jeová. O secretário executivo da CEMDP solicitou ao então secretário de Segurança de Goiás, Antônio Lorenzo Filho, o laudo de exame necroscópico, o relato da apreensão, foto do corpo e toda a documentação referente a Jeová Assis Gomes. Fez, ainda, solicitação de mesmo teor ao secretário de Justiça, Virmondes Borges Cruvinel.
Em 7 de junho de 1996, o superintendente da polícia técnico-científica de Goiás encaminhou ofício à CEMDP informando que “(...) após minuciosas buscas em nossos arquivos de identificação civil, criminal e médico-legal, não encontramos nenhum registro da pessoa de Jeová Assis Gomes”, confirmando ao que parece, que todo material referente a Jeová fora levado pelos agentes do DOI-CODI/11ª RM, como havia declarado o delegado da cidade, em 1972.
A família soube da morte de Jeová pela imprensa, na noite de 6 de janeiro de 1972. Seu irmão foi até Guaraí, onde obteve informações de que Jeová fora morto com um tiro pelas costas e estava enterrado em um cerrado, na periferia da cidade. Não conseguiu nem o laudo, nem a certidão de óbito, tampouco os restos mortais.
Na CEMDP, houve empate na votação do caso (171/96) de Jeová. Ao pedir a aprovação do requerimento, o relator contraditou com os fatos divulgados, evidenciando que os agentes vindos de Brasília (DF) para a pequena cidade sabiam que Jeová estaria no campo de futebol, e que a versão divulgada três dias depois fora preparada para justificar a execução. Considerando a política de extermínio dos banidos que voltaram ao país, adotada pelos órgãos de segurança, não é crível que fossem a Goiás para prender Jeová, militante que tinha treinamento militar e media quase dois metros de altura, “(...) sem revistá-lo, e algemá-lo. Que agissem ‘convidando-o discretamente para acompanhá-lo para fora do pequeno estádio’”.
O presidente da CEMDP, Miguel Reale Júnior, dando o seu voto de desempate favorável ao reconhecimento da responsabilidade do Estado pela morte de Jeová, ressaltou que ninguém iria levar uma granada a um campo de futebol e deixar a arma no hotel. Jeová estava desarmado e a possibilidade de domínio era grande.
O caso foi aprovado em 10 de dezembro de 1996 por 4 votos a 3, tendo votado pelo indeferimento o general Oswaldo Pereira Gomes, Paulo Gustavo Gonet Branco e João Grandino Rodas.
Em 2 de junho de 2005, integrantes da CEMDP foram à cidade de Guaraí buscar informações para localizar a sepultura de Jeová. Depoimento do soldado Sebastião de Abreu, que realizou o enterro de Jeová no cemitério da cidade, confirmou que ele foi fuzilado, apesar da possibilidade de prendê-lo. Em 12 de outubro, a polícia técnica de Brasília realizou escavações no cemitério, acompanhada de seu irmão Luís Antônio Assis Gomes, mas não conseguiu encontrar o local da sepultura.
O Ministério Público Federal de Tocantins ingressou com uma Ação Civil Pública em novembro de 2012, requerendo a responsabilização penal e civil de Lício Augusto Ribeiro Maciel como autor e partícipe da prisão ilegal e morte de Jeová, bem como responsabilização da União e que a mesma empreende medidas para localização do corpo do mesmo.
Na referida ação é citado o trecho do livro “O Coronel Rompe o Silêncio”, do jornalista Luiz Maklouf Carvalho, onde é transcrita parte das declarações do Coronel do Exército Lício Augusto Ribeiro Maciel, indicando que estava dentre os policiais que alvejaram o militante, indicando possível participação em sua morte: “A cena ainda está viva na memória dos locais, pois foi o maior acontecimento de todas as épocas, creio eu: um tiroteio num campo de futebol lotado, apenas dois atingidos, o Jeová e um militar (alguns só arranhados, de raspão e ricochete). Eu levei apenas um safanão dele, que tinha 1,90m e uns cem quilos de peso. Achei que podia imobilizá-lo”. (Anexo 004-acao-civil-publica-jeova-assis.pdf)
Em homenagem a Jeová, a cidade de Belo Horizonte deu o seu nome a uma rua no bairro da Lagoa, e São Paulo a outra rua, localizada no Conjunto Habitacional Jova Rural.
Fontes investigadas:
Conclusões da CEMDP; Dossiê Ditadura – Mortos e Desaparecidos Políticos no Brasil – 1964-1985, IEVE. Ação Civil Pública do Ministério Público Federal de Tocantins.
IDENTIFICAÇÃO DOS AUTORES DA MORTE\DESAPARECIMENTO
Órgão / Período |
Nome |
Função |
conduta |
Vivo/data do óbito |
Observações |
DOI-CODI11º RM |
Lício Augusto Ribeiro Maciel |
Coronel |
Prisão Ilegal e Assassinato |
Vivo |
Segundo relatos, inclusive relatório do delegado do DOPS/GO José Bonfim Pinto, foram agentes do DOI-CODI 11º RM que abordaram Jeová no estádio de futebol e efetuaram o disparo de arma de fogo que o teria matado (dossiê p. 306). Ademais, no livro “O Coronel Rompe o Silêncio”, do jornalista Luiz Maklouf Carvalho, é transcrita parte das declarações do Coronel do Exército Lício Augusto Ribeiro Maciel, indicando que estava dentre os policiais que alvejaram Jeová, indicando possível participação em sua morte (Anexo 004-acao-civil-publica-jeova-assis.pdf) |
DOPS/GO |
José Bonfim Pinto |
Delegado e 2º Sargento da PM (Polícia Militar) |
Fraude na descrição das circunstâncias da morte no relatório |
?? |
Produziu relatório (dossiê p. 206) no qual declarou que a morte de Jeová ocorreu por ele ter reagido à prisão, estando armado com uma granada no estádio de futebol. As provas produzidas, inclusive o parecer da CEMDP, demonstram que na verdade Jeová não estava armado, e que a ação visava realmente o assassinato do mesmo, pois havia uma política de extermínio dos banidos que retornaram ao Brasil. |
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José Lucena Noleto |
Fazendeiro |
Falso testemunho |
?? |
Alegou em depoimento na delegacia que Jeová teria sacado um revólver quando foi abordado pelos agentes que deram voz de prisão (anexo 003-documentos-de-perseguicao-jeova-assis-gomes156.pdf p. 7). As demais provas produzidas comprovaram que Jeová sequer portava um revólver quando foi abordado e assassinado no estádio de futebol. |
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Carlos Eduado Coelho Ferreira |
Estudante |
Falso testemunho |
?? |
Afirmou em depoimento na delegacia que Jeová teria sacado um revólver quando abordado pelos agentes de segurança (anexo 003-documentos-de-perseguicao-jeova-assis-gomes156.pdf p. 8). As demais provas produzidas comprovaram que Jeová sequer portava um revólver quando foi abordado e assassinado no estádio de futebol. |
FONTES DA INVESTIGAÇÃO
1. Documentação principal
Identificação do documento |
Órgão da repressão |
Observações |
Anexo |
Documentos de perseguição política (ficha de cadastro CENIMAR – Centro de Informações da Marinha) |
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001-ficha-cenimar-jeova-assis-gomes.pdf |
Dossiê da Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos |
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Documento encaminhado à Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos |
002-dossie-CEMDP-jeova-assis-gomes.pdf |
2. Prova pericial e documental (inclusive fotos e vídeos) sobre a morte/desaparecimento
Documento
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fonte |
Observação |
Anexo |
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3. Testemunhos sobre a morte/desaparecimento
Nome |
relação com o morto / desaparecido |
Informação |
fonte com referências |
Sebastião de Abreu |
Soldado que realizou o enterro de Jeová |
Confirmou que Jeová foi fuzilado, apesar da possibilidade de efetuar a prisão. |
Dossiê p. 307 |
4. Depoimento de agentes da repressão sobre a morte/desaparecimento
Nome |
Órgão / Função |
Informação |
fonte com referências |
Lício Augusto Ribeiro Maciel |
Coronel do Exército |
Informou que estava dentre os policiais que alvejaram Jeová |
livro “O Coronel Rompe o Silêncio”, do jornalista Luiz Maklouf, citado na Ação Civil Pública proposta pelo MPF/TO (anexo 004-acao-civil-publica-jeova-assis.pdf p. 19) |
CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES PARA O CASO
Conclusão: Jeová Assis Gomes é considerado desaparecido político, por não ter sido entregue os restos mortais aos seus familiares, não permitindo o seu digno sepultamento até os dias de hoje. Conforme o exposto no parágrafo 103 da Sentença da Corte Interamericana no Caso Gomes Lund e outros: “adicionalmente, no Direito Internacional, a jurisprudência deste Tribunal foi precursora da consolidação de uma perspectiva abrangente da gravidade e do caráter continuado ou permanente da figura do desaparecimento forçado de pessoas, na qual o ato de desaparecimento e sua execução se iniciam com a privação da liberdade da pessoa e a subseqüente falta de informação sobre seu destino, e permanece enquanto não se conheça o paradeiro da pessoa desaparecida e se determine com certeza sua identidade (...)”.
No parágrafo 110 do mesmo documento é mencionado que: “(...) pode-se concluir que os atos que constituem o desaparecimento forçado têm caráter permanente e que suas consequências acarretam uma pluriofensividade aos direitos das pessoas reconhecidos na Convenção Americana, enquanto não se conheça o paradeiro da vítima ou se encontrem seus restos, motivo pelo qual os Estados têm o dever correlato de investigar e, eventualmente, punir os responsáveis, conforme as obrigações decorrentes da Convenção Americana” (Sentença da Corte Interamericana, p. 38 e 41, publicação da Comissão Estadual da Verdade de São Paulo).
Recomendações: Investigação das circunstâncias da prisão, morte e desaparecimento de Jeová Assis Gomes, localização dos seus restos mortais e responsabilização dos agentes da repressão envolvidos no caso, conforme sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos que obriga o Estado Brasileiro “a investigar os fatos, julgar e, se for o caso, punir os responsáveis e de determinar o paradeiro das vítimas”; Retificação e indicação da causa mortis no atestado de óbito; Que o Estado brasileiro reconheça e declare a condição de anistiado político de Jeová Assis Gomes, pedindo oficialmente perdão pelos atos de exceção e violações de direitos humanos que foram praticados contra este.