A própria atividade dos advogados, na defesa de seus clientes que eram presos políticos, era considerada uma atividade subversiva, parte da chamada ‘guerra psicossocial’ contra o Regime Militar
Esta página é um resumo. faça o download do capítulo completoA proposta deste capítulo é relatar a participação de advogados que atuaram em defesa de presos e perseguidos políticos, principalmente em São Paulo, a partir das audiências realizadas na Comissão da Verdade do Estado de São Paulo “Rubens Paiva”, do artigo “Em defesa da liberdade e da justiça: os advogados de perseguidos políticos de São Paulo nos anos de 1970”, de autoria da historiadora Janaína de Almeida Teles, do Brasil Nunca Mais e o Perfil dos Atingidos. Foi utilizado também o documento escrito por 35 presos políticos de São Paulo, uma carta, que ficou conhecido como o “Bagulhão”, dirigida ao Presidente do Conselho Federal da OAB. A Comissão da Verdade do Estado de São Paulo “Rubens Paiva” editou a publicação deste documento sob o título: “Bagulhão: A voz dos presos políticos contra os torturadores”, lançado em audiência realizada no dia 16 de junho de 2014.
A Ditadura Militar perseguiu e reprimiu a população das mais diversas formas. Prevaleceu a violação de direitos. Criou-se um estado de exceção, autoritário. Implantou-se o terrorismo de estado. As pessoas que se opunham a este estado arbitrário ou eram suspeitas de se oporem tornavam-se o alvo principal da repressão política. Eram consideradas “inimigas do estado” e submetidas à truculência dos órgãos repressivos. Nem todas as pessoas que foram seqüestradas, submetidas a intensos interrogatórios, torturadas e mantidas na incomunicabilidade, chegaram a ser processadas pela Justiça Militar. Muitas passaram a ser reféns do aparato repressivo, mesmo quando colocadas em liberdade continuavam sendo vigiadas ou foram mantidas em cativeiro até serem assassinadas e “desaparecidas” em definitivo. Os processos judiciais não abrangeram o conjunto da população afetada pela truculência e violência do estado ditatorial. Houve um espaço obscuro e nebuloso durante a ditadura, ainda não dimensionado e que, por estes motivos, pouco lembrado, por não ter sido (quase) mencionado e nem sempre registrado, no qual se destacaram a solidariedade e a dedicação de advogados. Atenderam pessoas na clandestinidade colocando, algumas vezes em risco sua própria segurança.
Houve advogados que fizeram do exercício da profissão uma bandeira de luta e por isso sofreram também perseguições, prisões, torturas e assassinatos. Houve advogados que passaram a ter sua militância política na clandestinidade. Outros tiveram que ir para o exílio. Na lista de 436 mortos e desaparecidos do Dossiê feito pelos familiares, pelo menos 11 são advogados. São eles:
TABELA | ADVOGADOS MORTOS E DESAPARECIDOS
1. Antonio Joaquim de Souza Machado (nascido em 13/09/1939 e desaparecido no Rio de Janeiro, em 15/02/1971);
2. Arno Preis (nascido em 8/07/1934 e assassinado em 15/02/1972, em Paraíso do Norte, hoje Tocantins e à época Goiás.);
3. Demerval da Silva Pereira (nascido em 16/02/1945 e desaparecido, na região do Araguaia, em 28/03/1974);
4. Henrique Cintra Ferreira de Ornellas (nascido em Itapira (SP) e assassinado em Brasília, em 16/08/1973);
5. Rosalindo Souza (Mundico) (nascido em 02/01/1940 e desaparecido na região do Araguaia no dia 16/08/1973);
6. João Leonardo da Silva Rocha (nascido em 04/08/1939 e desaparecido em junho de 1975, em Palma do Monte Alto (BA);
7. James Alen Luz (nascido em, 21/12/1938 e morto em 24/03/1973, em Porto Alegre/RS);
8. Luiz Ignácio Maranhão Filho (nascido em 25/01/1921 e desaparecido em São Paulo, em 03/04/1974);
9. Orlando da Silva Rosa Bomfim Júnior (nascido em 14/01/1915 e desaparecido no Rio de Janeiro, em 08/10/1975);
10. Paulo de Tarso Celestino da Silva (nascido em 26/05/1944 e desaparecido em 12/07/1971, no Rio de Janeiro);
11. Jayme Amorim Miranda (nascido em 18/07/1926 e desaparecido em 04/02/1975, no rio de Janeiro (RJ).
Lançada em 2013, a versão digital do livro Brasil: Nunca Mais reúne um conjunto de processos e relatórios produzido na clandestinidade, e tiveram como principais fontes os presos políticos e os seus advogados ainda durante a ditadura
Não é possível chegar à verdade dos crimes praticados pelos órgãos repressivos brasileiros ocorridos durante a ditadura militar sem conhecer a participação dos advogados que atuaram na época. Torna-se necessário que a Comissão da Verdade realize audiências com todos os advogados que participaram daquele período ou dos seus seguidores que possuem seus processos e possam falar sobre a participação dos que já morreram. No caso de São Paulo, houve poucas audiências sobre o assunto, e por isso há necessidade de pelos menos nominar a todos que atuaram naquele período em defesa dos presos políticos, nas Auditorias Militares da região. Torna-se necessário, entretanto, o acesso aos documentos dos militares que se encontram em arquivos particulares (guardados com os próprios militares que executaram os crimes como ocorreu com o General Bandeira, o Coronel Molina, entre outros) e nos arquivos oficiais junto às Forças Armadas sob a coordenação do Ministério da Defesa.
Torna-se necessário também investigar documentos, ações e agentes que atuaram contra a oposição às ditaduras da região sob o comando da Operação Condor. Seriam os ex-presidentes da República, João Goulart e Juscelino Kubitscheck, vítimas da Operação Condor? Haveria outras vitímas?
Garantir o direito de ampla defesa de acordo com o previsto na atual Constituição e garantir que seja efetivo o devido processo legal
Criar os mecanismos de prevenção e erradicação da tortura e de imediato aprovar o projeto de lei que cria o Comitê de prevenção á Tortura
Garantir o livre exercício da profissão de advogado/a em todas as fases processuais, inclusive a do inquérito policial
Abrir e investigar os arquivos militares e os arquivos vinculados à Operação Condor para apurar os crimes de estado que se deram fora do aparato do judiciário
Pela revogação da Lei de Segurança Nacional
Criar e fortalecer mecanismos que façam com que o Poder Judiciário incorpore de fato os princípios de justiça, da autonomia, isonomia, transparência, dignidade, economia processual entre outros
Criar mecanismos que promovam e garantam a participação popular no Ministério Público, nas Defensorias Públicas e nas Procuradorias inclusive na AGU – Advocacia Geral da União
Inclusão da sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos e dos fundamentos do Direito Internacional dos Direitos Humanos em todos os níveis da formação militar
Rejeitar a autoanistia e apurar os crimes da ditadura, indiciar e julgar os agentes responsáveis por tais crimes conforme os tratados de direitos humanos ratificados pelo Estado brasileiro e segundo o direito internacional consuetudinário; Considerar os crimes da ditadura como crimes de lesa-humanidade que são considerados como de violação dos direitos humanos e são imprescritíveis
Fortalecer iniciativas como as do MPF (Ministério Público Federal) que estão aplicando a sentença da CIDH, tratando os crimes de lesa-humanidade como o sequestro, a tortura, a execução sumária, e o desaparecimento forçado
Que sejam cumpridas a sentença dada pela Justiça Federal, 1ª. Vara, e transitada em julgado, em 2007, que determina que o estado brasileiro esclareça os crimes cometidos contra os guerrilheiros do Araguaia e que seja cumprida a sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos, publicada em 14/12/2010 que determina também o esclarecimento sobre os desaparecidos políticos brasileiros e exige as punições aos agentes públicos responsáveis por tais crimes