O absurdo da ditadura produziu, ainda, o absurdo de prender e banir crianças, fichando-as como subversivas, considerado-as ‘perigosas à segurança nacional’
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A Comissão Estadual da Verdade “Rubens Paiva” da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo realizou uma série de audiências em que crianças, que sofreram nas mãos da repressão política da ditadura, direta ou indiretamente, puderam relatar suas experiências e como conseguiram enfrentar e superar tamanha truculência. Assim, o trabalho que ora apresentamos visa dar conta dos relatos dessas pessoas que eram crianças à época da ditadura e da importância desses depoimentos para a construção da verdade e da justiça.
No entanto, como falar das crianças sequestradas, abandonadas, torturadas ou nascidas nos centros clandestinos da repressão sem considerar a questão das mulheres, militantes mães e das mães não militantes, que por sua vez eram companheiras de militantes políticos. Isso porque não houve crianças atingidas pelo aparato repressivo que não estivessem vivendo com suas mães militantes e, via de regra, tinham um forte vínculo com as suas mães, sejam militantes ou não. Suas mães de alguma forma foram perseguidas, presas, sequestradas, assassinadas/desaparecidas pela ditadura e seus agentes.
Ora, as crianças dependem dos adultos para serem cuidadas, limpas, alimentadas e precisam de atenção, de amor e devem ser socialmente introduzidas junto a outras crianças e outros adultos para crescerem em afetividade, dignidade e cidadania. Essas atividades têm sido historicamente de responsabilidade das mulheres embora estas tenham convocado os homens para assumirem também essas tarefas, dividindo-as igualitariamente, tanto no âmbito doméstico como em relação aos cuidados. Tais fatos, ainda que falte muito da presença dos homens, vêm concorrendo para fortalecer e melhorar a vida em sociedade, seja para as mulheres, para os homens e, principalmente, para as crianças.
Quando as crianças foram abruptamente arrancadas de suas mães, como ocorreu com o emprego deliberado da truculência dos DOI-Codis que usaram de violência inclusive contra as crianças, elas perderam tudo isso de uma vez só: a segurança afetiva e os cuidados mínimos, o que as marcou profundamente por toda a vida. Cada uma teve ou tem ainda que lidar com essa ferida, que muitas vezes sangra, incomoda. Todo esse sofrimento das crianças foi também usado como forma de torturar as mães militantes ou mães não militantes.
Assim, neste capítulo devemos ressaltar que é impossível falar das crianças sem tratar do quanto as mães, militantes ou não, foram afetadas por tudo isso que aconteceu no Brasil, durante a ditadura.
Leia este texto completo na adaptação digital do livro “Infância Roubada"
Implementação de políticas públicas voltadas a impulsionar a difusão da história do Brasil na Ditadura Militar sob a perspectiva de gênero, raça/etnia, orientação sexual, identidade de gênero e classe social, de modo que a população possa ter acesso e conhecimento desse passado recente das mulheres, crianças afetadas, do genocídio dos povos indígenas e dos crimes praticados contra outros setores da sociedade
Responsabilização penal, civil e administrativa, inclusive com perda de cargo, de todos os agentes públicos que, por ação ou omissão, contribuíram para as violações perpetradas pela Ditadura Militar, como juízes, promotores de justiça, agentes policiais e outros, que apesar de cientes das denúncias não se empenharam em garantir a segurança e a vida dos presos, ao não tomar as devidas providências, não solicitando investigação das denúncias
Instituição e/ou fortalecimento da educação e da formação contínua em Direitos Humanos das polícias, das forças militares e de segurança pública do país, incluindo o estudo da sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos no Caso Gomes Lund e Outros – Guerrilha do Araguaia, bem como aos juízes, serventuários da justiça, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público
Criação de um programa de capacitação de juízes, serventuários da justiça, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público sobre o sistema regional e os internacionais dos direitos humanos, bem como sobre os tratados e convenções assinados e/ou ratificados pelo Estado Brasileiro para atuação nas demandas que se referem ao período da ditadura militar
Que o Estado brasileiro crie mecanismos jurídicos para efetivar a punição dos crimes sexuais cometidos por agentes do Estado na Ditadura Militar, considerando que tal crime é de lesa-humanidade
Que o Estado brasileiro crie mecanismos jurídicos para punição dos crimes de abortos forçados, esterilizações forçadas, gestações forçadas e escravidão sexual, perpetrados por seus agentes no contexto da ditadura militar
Que o Estado brasileiro crie mecanismos jurídicos para punição dos crimes acima citados (crimes sexuais, abortos forçados, esterilizações forçadas, gestações forçadas e escravidão sexual), de forma autônoma, não podendo os mesmos serem absorvidos pelos de tortura por não poderem ser considerados de menos gravidade
Inclusão nos cursos de Direito de teoria de DDHH numa perspectiva de gênero, étnico racial, diversidade sexual, de forma transversal no currículo
Ratificação da Convenção Sobre a Imprescritibilidade dos Crimes de Guerra e dos Crimes Contra a Humanidade, adotada pela Resolução no 2391 da Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas, em 26 de novembro de 1968
Que o Estado crie Políticas e mecanismos permanentes de reparação e indenização às vítimas de graves violações de direitos humanos, inclusive de violência sexual, cometidos por seus agentes na ditadura militar
Campanhas publicitárias em todos os meios de comunicação sobre o que são graves violações de direitos humanos e a importância da denúncia de violência sexual. A ênfase das campanhas deveria ser o esclarecimento de que as vítimas não são culpadas pela violência sofrida
Que o Estado Brasileiro crie mecanismos jurídicos para que as mulheres grávidas ou com filhos até 2 (dois) anos, presas provisoriamente, possam responder ao processo em liberdade e as mulheres grávidas ou com filhos até 2 (dois) anos que cumprem pena possam cumpri-la no regime aberto ou em prisão domiciliar, a fim de que se impeça que crianças fiquem presas (e portanto, punidas) ou sejam adotadas por terceiros indevidamente. Que as crianças tenham os necessários cuidados conforme sua idade mesmo que suas mães estejam condenadas