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TOMO I

Tomo I

A sentença da Corte Interamericana
de Direitos Humanos no caso
Gomes Lund e Outros vs. Brasil
Região entre os estados de Tocantins e Pará onde ocorreram as batalhas de resistência que ficaram conhecidas como Guerrilha do Araguaia. Fonte: Wikimedia

Sueño de defensa
Soñé que viajaba al pasado
Y que un milico me decía
vamos a permitir que seas
el defensor de tus padres
antes que desaparezcan
entonces yo temía ser mal abogado
y perder el juicio que me llevara
al mismo lugar que cuando desperté Julián Axat, poeta argentino

Esta página é um resumo. faça o download do capítulo completoNo poema em epígrafe do poeta e jurista argentino Julián Axat, nascido no ano do golpe militar de 1976, temos a imagem de um julgamento impossível: o filho de desaparecidos recebe dos militares a permissão de voltar ao passado para defender seus pais antes que eles desaparecessem. Ele teme, porém, ser “mau advogado” e “perder o julgamento”, que o levaria ao “mesmo lugar” em que estava “quando despertou”.

O julgamento que não houve, ou seja, a falta de justiça em relação às vítimas da ditadura militar nos trouxe onde estamos. O que fazer para recobrar o justo, que continua interditado mesmo – a situação, nesse sentido, é pior do que a do poema – depois de se ter vencido o processo?

No tocante a este capítulo, os familiares lograram obter sentenças favoráveis tanto na justiça nacional quanto na internacional, mas não conseguiram despertar do pesadelo do passado: as decisões seguem descumpridas pelo Estado brasileiro. Depois de tudo, é como se estivessem no mesmo lugar de antes: o do luto em suspenso.

Em 2010, o Estado brasileiro foi condenado por unanimidade. Leia a sentença aqui A quarta condenação do Estado brasileiro pela Corte Interamericana de Direitos Humanos foi a do caso Gomes Lund e outros versus Brasil , também conhecido como Caso Araguaia. A Corte determinou que o governo deveria proceder à localização dos mortos e à responsabilização dos responsáveis pelas detenções arbitrárias, torturas, execuções e pelo desaparecimento de guerrilheiros do PcdoB (Partido Comunista do Brasil) e de camponeses na região do Araguaia entre 1972 e 1975.

Ainda durante a ditadura militar, no ano de 1982, familiares de 22 desaparecidos na Guerrilha do Araguaia foram à Justiça Federal contra essa postura do Estado brasileiro. No governo de Fernando Henrique Cardoso, ocorreu o reconhecimento oficial dos mortos e desaparecidos políticos. Não houve, porém, um esforço oficial de esclarecer a verdade sobre a Guerrilha.

Audiência Pública | Caso Araguaia
Audiência pública da CEV "Rubens Paiva" discutiu o cumprimento da sentença da Corte Interamericana: o Brasil deve localizar os corpos de mais de 70 militantes desaparecidos na região do Araguaia, esclarecer as mortes e suas circunstâncias, e dar acesso a informações e documentos das Forças Armadas

Em maio de 2007, a decisão da Justiça Federal, favorável aos familiares, transitou em julgado, mas o Estado brasileiro continua na mesma posição ilícita de descumprir essa medida de sua própria Justiça.

A Convenção Americana sobre Direitos Humanos, ou Pacto de São José da Costa Rica, foi celebrada em 1969. Em razão da postura isolacionista e contrária aos direitos humanos da ditadura militar, somente em 1992 o Estado brasileiro a ratificou, e apenas em 10 de dezembro de 1998 reconheceu a jurisdição contenciosa da Corte Interamericana de Direitos Humanos.

Em 7 de agosto de 1995, a denúncia foi levada à Comissão Interamericana de Direitos Humanos, “apresentada pelo Centro pela Justiça e o Direito Internacional (CEJIL) e por Human Rights Watch/Americas, aos quais se uniram como copeticionários o Grupo Tortura Nunca Mais do Rio de Janeiro, a Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos do Instituto de Estudos da Violência do Estado, e a senhora Ângela Harkavy”.

Em 2009, a Comissão levou o caso à Corte, tendo considerado que a denúncia era admissível e procedente, e que o Estado brasileiro não só tinha violado a Convenção Americana, mas também tinha falhado em implementar as recomendações dispostas pela Comissão.

Em 24 de novembro de 2010, no entanto, reafirmando sua jurisprudência, a Corte Interamericana de Direitos Humanos condenou o Estado brasileiro por unanimidade.

O Estado deve realizar todos os esforços para determinar o paradeiro das vítimas desaparecidas e, se for o caso, identificar e entregar os restos mortais a seus familiares, em conformidade com o estabelecido nos parágrafos 261 a 263 da presente Sentencia” Sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos - Caso Gomes Lund e Outros (“Guerrilha do Araguaia”) vs. Brasil

À esquerda, Rosa Maria Cardoso, advogada de presos políticos durante a ditadura militar, destaca a importância da publicação da sentença por parte desta Comissão, dimensionando o valor pedagógico da publicação.
À direita, a ex-presa política Crimeia de Almeida Teles relata a luta dos familiares dos desaparecidos no Araguaia a partir da Lei da Anistia, em 1979, que culminou com a ação perante à Organização dos Estados Americanos (OEA)

Recomendações

1

Cumprimento integral da sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos no Caso Gomes Lund e outros vs. Brasil, decidida em 2010

2

Revisão ou reinterpretação da Lei de Anistia da ditadura militar para a nulidade absoluta de seus dispositivos contrários à justiça de transição

3

Cumprimento integral da Ação Ordinária nº 82.00.024682-5, que transitou em julgado em 2008, e que determinou a localização dos desaparecidos, dos seus restos mortais, o esclarecimento das circunstâncias da morte e a entrega do relatório oficial sobre as operações militares contra a Guerrilha do Araguaia

4

Abertura dos documentos sobre a Guerrilha do Araguaia

5

Investigação e responsabilização pela queima de arquivos relativos à Guerrilha do Araguaia

6

Adequação do direito interno brasileiro ao Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional no tocante aos crimes de guerra e crimes de lesa-humanidade

7

Tipificação do delito de desaparecimento forçado

8

Inclusão da sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos e dos fundamentos do Direito Internacional dos Direitos Humanos em todos os níveis da formação militar

9

Inclusão da Guerrilha do Araguaia e das outras graves violações de direitos humanos pela ditadura militar nos currículos escolares de ensino de história

10

Criação de sítios de memória relacionados à Guerrilha do Araguaia

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