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TOMO I

Tomo I

Imprensa de
resistência à Ditadura
Formada por um conjunto heterogêneo de jornais e revista, a imprensa alternativa se contrapôs aos interesses e tendências dominantes

As pautas tratadas pela imprensa alternativa aprofundavam sobre assuntos decisivos da política nacional e internacional. A defesa do petróleo e da Amazônia, denúncias do racismo contra negros e índios, as críticas à dívida externa, o movimento feminista e as denúncias sobre a violência estavam entre os temas que sofriam censura

Esta página é um resumo. faça o download do capítulo completoA censura imposta a partir de 1964 criou uma lista de assuntos proibidos, numa tentativa clara de impedir que a população conhecesse os principais acontecimentos da Ditadura implantada, especialmente a violência imposta à população. Para tratar desse período, a Comissão da Verdade do Estado de São Paulo “Rubens Paiva” realizou uma série de audiências públicas que ficou intitulada “Semana da Imprensa de Resistência”, a qual destacou o importante papel das denúncias feitas pelos semanários organizadas pela esquerda brasileira. Um dos trabalhos mais detalhados sobre esse período foi escrito e publicado pelo jornalista Bernardo Kucinski no livro “Jornalistas e Revolucionários – Nos tempos da imprensa alternativa”.

A revista Realidade, publicada pela editora Abril entre 1966 e 1976, entrou no rol de destaques do jornalismo no entendimento de que suas publicações tiveram caráter inovador na imprensa brasileira, cuja identidade das pautas foram adotadas interinamente pela imprensa alternativa. Foi dela que sairam muitos jornalistas que compuseram a imprensa de resistência à ditadura, como, por exemplo, Raimundo Pereira. A revista destacou-se no papel de “refletir com mais profundidade sobre problemas cotidianos do país e do mundo” . Mesmo pertencendo a uma empresa que não tinha como objetivo principal o enfrentamento da Ditadura, os jornalistas que trabalhavam na revista criaram “estratégias próprias para apresentar textos que não atendessem ao poder e mesmo para denunciar a censura ”. No livro “Da guerrilha à imprensa feminista: a construção do feminismo pós-luta armada no Brasil (1975-1980)” as autoras Amelinha Teles e Rosalina Santa Cruz Leite explicaram que em todo período da Ditadura falar da mulher era um assunto proibido. Elas destacaram, inclusive, a censura de uma publicação inteira da revista.

Audiências Públicas | Semana da Imprensa de Resistência
Integrantes dos jornais “O Mo­vimento” e “Opinião” fazem um panorama geral da imprensa sob os anos do regime militar

Entre 1964 e 1980, nasceram e morreram cerca de 150 periódicos que tinham como traço comum a oposição intransigente ao regime militar. Ficaram conhecidos como imprensa alternativa ou imprensa nanica. A palavra nanica, inspirada no formato tabloide adotado pela maioria dos jornais alternativos, foi disseminada principalmente por publicitários, num curto período em que eles se deixaram cativar por esses jornais. Já o radical de alternativa contém quatro dos significados essenciais dessa imprensa: o de algo que não está ligado a políticas dominantes; o de uma opção entre duas coisas reciprocamente excludentes; o de única saída para uma situação difícil e, finalmente, o do desejo das gerações dos anos de 1960 e 1970, de protagonizar as transformações sociais que pregavam.

Bernardo Kucinski, jornalista

Galeria | Os bravos resistentes

O fato é que a imprensa alternativa surgiu com o desejo dos diversos grupos das esquerdas de protagonizar as transformações que propunham e a busca, por jornalistas e intelectuais, de espaços alternativos à grande imprensa e à universidade . Nas audiências públicas, destacou-se a precisão e importância das denúncias das violências impostas à população, a irreverência dos temas tabu, o vínculo direto aos movimentos sociais, o desafio à censura e a ousadia dos integrantes que, mesmo perseguidos, resistiram em seu papel. O tabloide “Pif-Paf”, lançado em junho de 1964, dirigido por Millôr Fernandes, que, depois de ser demitido de O Cruzeiro, resolveu criar uma publicação independente, marcou a primeira fase do chamado ciclo alternativo. Fazia oposição pelo humor e durou apenas oito edições.

Em 1969 nasceu O Pasquim, logo após do Ato Institucional nº 5, em um momento em que várias publicações tinham sido fechadas. Foi publicado pela primeira vez em outubro de 1969, com grande equipe de cartunistas que usavam o seu talento para um humor sagaz com a capacidade de ganhar caráter forte de subversão ao regime, mesmo não tendo sido seu objetivo principal. Segundo Kucinski, foi o semanário mais duradouro de todos. A publicação d’O Pasquim inaugurou a técnica do deboche, tão eficaz na crítica ao milagre econômico . Além das charges, O Pasquim havia inaugurado um estilo diferente de apresentar entrevistas para os seus leitores, o que influenciou outros veículos de comunicação. Em abril de 1970, após a capa dedicada a Dom Helder Câmara, a polícia começou a censurar O Pasquim – de início, irregularmente. Em junho, foi introduzida a censura prévia, obrigando a redação a submeter todas as matérias, antecipadamente, à Polícia Federal . Além dos jornalistas e chargistas que faziam parte da equipe, O Pasquim contou com colaboradores como Chico Buarque e Glauber Rocha. Houve um episódio ocorrido no dia 1º de novembro de 1970, em que policiais do DOI-CODI invadiram a redação d’O Pasquim durante o fechamento da edição. Quase toda a equipe foi presa nessa ocasião. O único que se salvou foi Tarso de Castro, que conseguiu escapulir pelo muro dos fundos e refugiar-se na casa ao lado, um escritório, de onde continuou dirigindo o jornal clandestinamente.




O jornalista Mylton Severiano fala sobre
a falta de liberdade para
o exercício da profissão


Severiano é autor da reportagem sobre a morte de Vladimir Herzog no “Ex-”, com o título "Liberdade, liberdade, abra as asas sobre nós". Foi a última edição do jornal, que chegou a 50 mil exemplares vendidos.

Acho até muito interessante a iniciativa da Comissão da Verdade Assembleia Legislativa de São Paulo de estar abordando esses aspectos da luta da resistência à ditadura. A linha geral de trabalho das outras comissões não registrou. É um registro importante. Há situações extremamente dramáticas, inclusive porque resultam em mortes, resultam em mutilação, em violações extremas dos direitos humanos. Eu acho que nós podemos falar de uma experiência que considero vitoriosa na luta contra a ditadura

Antônio Luis Bernardes, jornalista com passagem
pelos jornais Movimento e Opinião

A Comissão da Verdade do Estado de São Paulo “Rubens Paiva” concluiu que os temas apresentados pela imprensa alternativa permeiam até hoje carecendo de um debate mais amplo. Entendemos que a censura e a cultura disseminada e imposta impedem até hoje que sejam superados sérios problemas vividos por integrantes de movimentos sociais que lutam para ter seus direitos e que seja construída uma sociedade livre e aceite a diversidade. Diversos assuntos foram engolidos pela grande imprensa a qual reproduz a mesma ideologia atrasada e opressora. Reconhecemos que há avanços, mas não houve até hoje alguma iniciativa por parte do Estado brasileiro que minimizasse, por exemplo, a perseguição contra gays e lésbicas e todos que integram o hoje chamado movimento LGBTT.

Recomendações

1

Recomendamos que a partir das empresas estatais de Comunicação sejam encampadas as pautas dos movimentos sociais, especialmente os que envolvem forte repressão, discriminação e violência

2

Recomendamos que o dinheiro público que anualmente é distribuído por cotas para propagandas seja pensado para estimular novas frentes de comunicação, mudando o cenário de monopólio de poder e opinião

3

Recomendamos que a radiodifusão e a concessão de canais de televisão sejam reformuladas, ampliando a capilaridade de grupos que desejam comunicar sua realidade cultural e formas de pensamento, para que sejam quebrados os pactos que regem até hoje do monopólio de opinião e pautas disseminadas que foi ato pensado e patrocinado pela ditadura militar

4

Recomendamos que a grande imprensa brasileira, a partir das informações contidas neste relatório e no relatório da CNV, faça uma retratação pública, retificando as informações mentirosas oriundas das versões da ditadura sobre os diversos episódios, principalmente a versão dos assassinatos dos mortos e desaparecidos políticos

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Veja Também:

Arquivos levantados pela Comissão da Verdade


Fichas de
mortos e
desaparecidos


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