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INICIAL DO NOME:

HELBER JOSÉ GOMES GOULART

OCORRÊNCIA

Morto em 16 de julho de 1973

DADOS PESSOAIS
Filiação: Geraldo Goulart do Nascimento e de Jandyra de Souza Gomes
Data e local de nascimento: 19 de setembro de 1944, em Mariana (MG)
Profissão: não consta
Atuação política: Militante da Ação Libertadora Nacional (ALN)
Data e local da morte/desaparecimento: Morto em 16 de julho de 1973
Organização política: Ação Libertadora Nacional (ALN).

RELATO DO CASO

Helber José Gomes Goulart nasceu em 19 de setembro de 1944, em Mariana (MG), filho de Geraldo Goulart do Nascimento e de Jandyra de Souza Gomes. Morto em 16 de julho de 1973. Militante da Ação Libertadora Nacional (ALN)(Direito à memória e à verdade, 2007, p. 347-348; Dossiê Ditadura, 2009, p. 448-450).

Segundo depoimento de suas irmãs, Maria do Carmo e Elba:

Estudou até a segunda série ginasial em Mariana, no Ginásio Dom Frei Manoel da Cruz, da Campanha Nacional de Escolas da Comunidade (CNEC). Começou a trabalhar muito cedo: aos 11 anos, entregando jornais; aos 13 anos, no escritório da fábrica de tecidos de Mariana e, pouco depois, como datilógrafo, na Prefeitura.Foi para São Paulo em 1961, com 17 anos, em busca de melhores condições de trabalho, lá permanecendo até 1963. Iniciado na luta política através de seu pai, antigo membro do Partido Comunista Brasileiro (PCB), nesse mesmo ano juntou-se ao Grupo dos Onze. Após o golpe de 1964, Helber foi julgado na Auditoria Militar de Juiz de Fora e, em seguida, mudou-se para o Mato Grosso, para trabalhar na construção da Hidrelétrica de Urubupungá [atual cidade de Ilha Solteira, na região oeste do Estado de São Paulo, próximo à divisa com Mato Grosso do Sul], como apontador. Revoltou-se profundamente com as péssimas condições de trabalho e segurança a que eram submetidos os operários. Retornou a Mariana em 1968, mudando-se para Ouro Preto em 1969, quando se integrou à ALN (apud Direito à memória e à verdade, 2007, p. 347-348; Dossiê Ditadura, 2009, p. 448-450).

Antes de se vincular à ALN, Helber participou da Corrente. Conhecido como “Euclides” entre os militantes da ALN, partiu em 1971 para São Paulo, já vivendo na clandestinidade. A partir de então, os contatos com a família foram sendo feitos por meio de cartas e de raros encontros (Direito à memória e à verdade, 2007, p. 347-348; Dossiê Ditadura, 2009, p. 448-450).

Em uma carta enviada à família, em 8 de outubro de 1971, ele brincava dizendo que trabalhava 25 horas por dia, pois levantava sempre uma hora mais cedo e não tinha tempo para paquerar. Dizia que os problemas não se resolveriam no plano individual e sim coletivamente; recomendava às irmãs bons livros e bons filmes: Queimada; Os Estranhos Caminhos de São Tiago; e também a leitura do jornal alternativo O Pasquim. Criticava o sistema político e econômico, o ufanismo exagerado, a política de massificação, despedindo-se com afeto e saudades. Sua última carta é de 7 de setembro de 1972(Direito à memória e à verdade, 2007, p. 347-348; Dossiê Ditadura, 2009, p. 448-450).

Em novembro de 1972, estava com Aurora Nascimento Furtado quando foram cercados pela repressão política no Rio de Janeiro. Ele conseguiu fugir, mas Aurora foi presa e morta sob tortura(Direito à memória e à verdade, 2007, p. 347-348; Dossiê Ditadura, 2009, p. 448-450).

Os últimos encontros com seus familiares ocorreram em março e junho de 1973, pouco antes de sua morte. Sua prisão certamente foi consequência do trabalho do médico João Henrique Ferreira de Carvalho, o Jota, um ex-militante da ALN que atuou como agente policial infiltrado na organização – “cachorro”, de acordo com a denominação dada pelos órgãos de repressão política, conforme matérias publicadas pela revista Veja. Jota foi citado como modelo de infiltração pela antiga Escola Nacional de Informações (ESNI) e, segundo a reportagem, teria delatado vários militantes, entre eles estão todos os integrantes da direção da ALN a partir de 19735 (Direito à memória e à verdade, 2007, p. 347-348; Dossiê Ditadura, 2009, p. 448-450).

De acordo com matérias publicadas pela revista Veja (em 20 de maio e em 18 de novembro de 1992) com base em depoimento do ex-agente do DOI- CODI/SP, Marival Chaves do Canto, a atuação de Jota “permitiu a eliminação de pelo menos umas vinte pessoas. […] A partir de 1973, Jota delatou todos os comandos da ALN”. A revista citou nominalmente, entre os que morreram em consequência dessas delações, Antônio Carlos Bicalho Lana, Sônia Maria de Moraes Angel Jones, Issami Nakamura Okama, Ronaldo Mouth Queiroz, Luiz José da Cunha, Wilson Silva, Ana Rosa Kucinscki, Arnaldo Cardoso Rocha, Francisco Seiko Okama e Francisco Emanoel Penteado (Direito à memória e à verdade, 2007, p. 347-348; Dossiê Ditadura, 2009, p. 448-450).

Não se sabe ao certo desde quando Helber passou a ser controlado pelos órgãos de segurança, já que as regras da vida clandestina podem lhe ter permitido escapar desse controle de tempos em tempos. Helber teve o último encontro com José Júlio de Araújo, na avenida Jabaquara, pouco antes de José Júlio ser preso e assassinado, em 18 de agosto de 1972. Segundo as reportagens citadas, Jota teria iniciado sua atuação como agente infiltrado no fim de 1972, mas não são apresentados mais detalhes a respeito dessa informação (Direito à memória e à verdade, 2007, p. 347-348; Dossiê Ditadura, 2009, p. 448-450).

A versão oficial é de morte em tiroteio, às 11h30min de 16 de julho de 1973, nas imediações do Museu do Ipiranga, em São Paulo, e foi publicada na Folha da Tarde, de 19 de julho de 1973 com o título “Cai Morto Outro Terrorista”. Segundo documento intitulado “Informação 2.100”, de 19 de setembro de 1973, encontrado no arquivo do DOPS/SP, Helber teria morrido por volta de 11h30min, de 16 de julho, em confronto com agentes de DOI-CODI/SP. Esta versão é mantida, sem especificar o horário, no relatório do Ministério da Marinha entregue ao ministro da Justiça, Maurício Corrêa, em 5 de fevereiro de 1993, assinado pelo ministro da Marinha, Ivan da Silveira Serpa (Direito à memória e à verdade, 2007, p. 347-348; Dossiê Ditadura, 2009, p. 448-450).

Segundo denúncia no livro Dos Presos Políticos Brasileiros, publicado em Portugal em 1976 pela Editora Maria da Fonte:

[…] na verdade, Helber foi preso pelo DOI-CODI/SP dias antes, o que é confirmado pelo testemunho de algumas pessoas que, naquela época, se achavam detidas no DOI. Tais pessoas viram Helber com a cabeça enfaixada, sendo certo que ele chegou a ser internado no Hospital Geral do Exército (HGE)(apud Direito à memória e à verdade, 2007, p. 347-348; Dossiê Ditadura, 2009, p. 448-450).

Sua família tomou conhecimento da morte em 18 de julho de 1973 pela televisão e, em 19 de julho, por meio de jornais. Os familiares não tiveram acesso aos seus objetos pessoais: documentos, roupas, livros e outros pertences (Direito à memória e à verdade, 2007, p. 347-348; Dossiê Ditadura, 2009, p. 448-450).

O laudo do exame cadavérico do Instituto Médico Legal foi solicitado pelo delegado Romeu Tuma, na época chefe do Setor de Inteligência do DEOPS/SP (Direito à memória e à verdade, 2007, p. 347-348; Dossiê Ditadura, 2009, p. 448-450).

O atestado de óbito foi assinado pelos legistas Harry Shibata e Orlando J. B. Brandão. A requisição de exame ao IML, assinada pelo delegado Romeu Tuma, anota que Helber foi morto às 16 horas de 16 de julho, mas no verso consta que o corpo deu entrada no necrotério às 8 horas do mesmo dia. Ou seja, oito horas antes do horário de sua morte registrado na requisição assinada por Romeu Tuma e quatro horas e meia antes de ser abordado por agentes de segurança, conforme a versão oficial divulgada no jornal Folha da Tarde, citada anteriormente (Direito à memória e à verdade, 2007, p. 347-348; Dossiê Ditadura, 2009, p. 448-450).

O laudo descreve diversos ferimentos, sem referir-se às marcas de tortura (Direito à memória e à verdade, 2007, p. 347-348; Dossiê Ditadura, 2009, p. 448-450).

Foi enterrado como indigente no Cemitério de Perus, na cidade de São Paulo, onde sua ossada permaneceu até 1990. Seus restos mortais foram exumados e identificados pela equipe da Unicamp e, em 13 de julho de 1992, trasladados para Mariana, onde ocorreu o sepultamento no Cemitério de Santana, após missa celebrada por D. Luciano Mendes de Almeida, presidente da CNBB. Antes, D. Paulo Evaristo Arns, cardeal-arcebispo de São Paulo, celebrou missa na Catedral da Sé em homenagem a Helber, Frederico Eduardo Mayr e Emanoel Bezerra dos Santos, junto com as urnas contendo seus restos mortais já identificados (Direito à memória e à verdade, 2007, p. 347-348; Dossiê Ditadura, 2009, p. 448-450).

Segundo o relator do caso na CEMDP, Nilmário Miranda, Helber já estava morto em 16 de julho. Na verdade ele teria sido morto antes das 8 horas da manhã, horário da entrada de seu corpo no necrotério (Direito à memória e à verdade, 2007, p. 347-348; Dossiê Ditadura, 2009, p. 448-450).

O laudo necroscópico descreve equimoses e afirma que foi morto por choque hemorrágico oriundo de ferimento transfixante do pulmão no seu lobo inferior. Nilmário Miranda observa que, “[…] dadas as características do ferimento, a trajetória do projétil foi de frente para trás, da esquerda para a direita e de cima para baixo”. Como Helber media 1,88 m, tal disparo provavelmente foi efetuado com o corpo caído ao chão. Na foto do corpo, em que ele aparece sem barba, são visíveis marcas no pescoço não descritas no laudo (Direito à memória e à verdade, 2007, p. 347-348; Dossiê Ditadura, 2009, p. 448-450).

O caso (241/96) na CEMDP foi aprovado por unanimidade em 14 de maio de 1996 (Direito à memória e à verdade, 2007, p. 347-348; Dossiê Ditadura, 2009, p. 448-450).

Embora não conste do seu voto, Nilmário Miranda relatou à CEMDP, tempos depois, que, após o julgamento do caso, mostrou ao perito Celso Nenevê a foto do rosto de Helber morto e o perito fez uma observação surpreendente: Helber não estava morto quando aquela foto foi tirada. Havia nela o registro de um rictus de dor, e vincos marcando a testa, incompatíveis com o rosto de um cadáver (Direito à memória e à verdade, 2007, p. 347-348; Dossiê Ditadura, 2009, p. 448-450).

Em sua homenagem, a cidade de Belo Horizonte deu o seu nome a uma rua no bairro Jardim Atlântico (Direito à memória e à verdade, 2007, p. 347-348; Dossiê Ditadura, 2009, p. 448-450).

De acordo com depoimento de Suzana Lisboa na 115ª audiência da Comissão da Verdade do Estado de São Paulo Rubens Paiva no dia 17 de março de 2013:

(...) Em 1990 com a abertura da Vala de Perus a prefeita Luiza Erundina criou uma comissão na Prefeitura de São Paulo da qual nós fizemos parte, o Ivan, a Amelinha e eu e nós procedemos outras exumações no cemitério de Perus além da Vala. Uma delas foi a busca do corpo do Helber José Gomes Goulart, ele foi desenterrado imediatamente na hora, no momento em que ele foi desenterrado, que tinha outros três já enterrados acima dele, ele foi, havia uma certeza de que seria ele pela característica do edentado, né? Ele não tinha os dentes. Foi uma das identificações. Edentado, edentado, quando não tem os dentes. Ele não tinha os dentes nem em cima e nem embaixo, por isso... (...) Julho de 1991 foi feito o traslado dele para Mariana, Minas Gerais. A Dona Juliana, mãe dele, era viva ainda e teve a emoção de poder enterrar o seu filho. Lá foi feita uma missa em Mariana rezada por Dom Luciano Mendes de Almeida. Foi muito emocionante, a cidade inteira compareceu à missa e às homenagens que foram feitas a ele. Falta, no caso do Helber, a identificação de quem foram os agentes que o torturaram e o mataram. As equipes responsáveis, nós só sabemos que o comando era do Carlos Alberto Brilhante Ustra, mas não sabemos por quem ele foi torturado e como ele foi morto. E nem sabemos exatamente em que data ele foi preso porque a versão oficial diz que ele foi preso no dia 16, no Museu do Ipiranga em São Paulo, às 16 horas. Só que ele entra no IML as oito da manha, então. Os documentos do Instituto... (...) foi identificado no Museu do Ipiranga e teve um tiroteio e ele foi morto às 16 horas. A documentação do IML diz que ele deu entrada às oito da manhã do mesmo dia, então não se sabe em que dia ele foi preso e nem como ele foi preso, não há testemunha da morte dele. O que nós temos, já desde os nossos primeiros documentos é, desde as nossas primeiras denúncias é de que ele teria sido visto nos corredores do DOI-CODI, mas nós não sabemos quem viu (115ª audiência da Comissão da Verdade do Estado de São Paulo Rubens Paiva no dia 17 de março de 2013).

 

 

Fontes e documentos consultados: Dossiê Ditadura – Mortos e Desaparecidos Políticos no Brasil (1964-1985), IEVE, 2009, p. 448-450. Direito à memória e à verdade – Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos – Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República. Brasília: 2007, p. 347-348. 115ª audiência da Comissão da Verdade do Estado de São Paulo Rubens Paiva no dia 17 de março de 2013.

 

IDENTIFICAÇÃO DOS AUTORES DA MORTE\DESAPARECIMENTO

Órgão/Período

Nome

Função

Conduta

Vivo/óbito

Observações

DOI-CODI/SP/1973

Carlos Alberto Brilhante Ustra

Comandante

Tortura, morte e desaparecimento forçado.

 

 

DOI-CODI/SP/1973

João Henrique Ferreira de Carvalho (Jota)

Agente infiltrado.

Delação.

 

 

DOPS/SP

Romeu Tuma

Chefe do Setor de Inteligência do DOPS/SP

Falsificação de requisição de exame necroscópico.

 

 

IML/1973

Harry Shibata

Médico Legista.

Falsificação de laudo necroscópico.

 

 

IML/1973

Orlando J. B. Brandão

Médico Legista.

Falsificação de laudo necroscópico.

 

 

 

DOCUMENTOS CONSULTADOS

  1. Documentação principal

 

Identificação do documento

Órgão da repressão

Observações

Anexo

Documentos do Dossiê da Comissão Especial dos Mortos e Desaparecidos Políticos e do Arquivo do Instituto de Estudos sobre a Violência no Estado

 

Consta no conjunto de documentos do Dossiê da Comissão Especial dos Mortos e Desaparecidos Políticos e do Arquivo do Instituto de Estudos sobre a Violência no Estado, nas folhas 13 certidão de nascimento, nas folhas 06 e 07 Certidão de óbito. Na folha 20, 28 e 29 cópia do documento Informação número 2100/73-AM. Na folha 33 certidão de óbito.

001-Helber-Jose-Gomes-Goulart.pdf

Transcrição da audiência da Comissão da Verdade do Estado de São Paulo Rubens Paiva

 

Transcrição da 115ª audiência da Comissão da Verdade do Estado de São Paulo Rubens Paiva no dia 17 de março de 2013.

 

002-17.3.14-COMISSAO-DA-VERDADE.pdf

 

 

 

2. Prova pericial e documental (inclusive fotos e vídeos) sobre a morte/desaparecimento

 

Documento

Fonte

Observação

Anexo

requisição do exame necroscópico

 

 

001-Helber-Jose-Gomes-Goulart.pdf  folhas 34 e 35

laudo de exame necroscópico

 

 

001-Helber-Jose-Gomes-Goulart.pdf folhas 36 à 39

laudo de identificação de Helber José Gomes Goulart (Perus-SP, 1992)

 

 

001-Helber-Jose-Gomes-Goulart.pdf  folhas 49 à 69

imagens de Helber José Gomes Goulart supostamente morto

 

nota-se o rictus de dor, e vincos marcando a testa, incompatíveis com o rosto de um cadáver.

001-Helber-Jose-Gomes-Goulart.pdf folhas 22 à 27

 

3. Testemunhos sobre a prisão, morte/desaparecimento

 

Nome

Relação com o morto/desaparecido

Informação

Fonte

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

4. Depoimento de agentes da repressão sobre a morte/desaparecimento

 

Nome

Órgão / Função

Informação

Fonte com referências

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

OBS: Em anexo cópias de todos os documentos reunidos pela Comissão de Familiares dos Mortos e Desaparecidos Políticos e Comissão da Verdade do Estado de São Paulo “Rubens Paiva”.

 

CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES PARA O CASO

Conclusão: Helber José Gomes Goulart foi morto sob tortura e teve sua morte forjada por agentes públicos vinculados à repressão política em um falso tiroteio.

Recomendações: Cabe ao estado brasileiro esclarecer em que circunstâncias se  deram a morte de Helber José Gomes Goulart e responsabilizar os agentes públicos  que  cometeram tais crimes. Recomenda-se também a retificação de seu atestado de óbito.

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