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INICIAL DO NOME:

JOÃO CARLOS CAVALCANTI REIS

OCORRÊNCIA

morto em 30 de outubro de 1972

DADOS PESSOAIS
Filiação: João Viveiros Reis e Helena Cavalcanti Reis
Data e local de nascimento: 08/08/1945, Salvador/BA
Profissão: Estudante Universitário, Universidade Mackenzie
Atuação política: ALN e MOLIPO
Data e local da morte/desaparecimento: morto em 30 de outubro de 1972
Organização política: Movimento de Libertação Popular (MOLIPO).

Arquivos

RELATO DO CASO

Baiano de Salvador, João Carlos Cavalcanti Reis cursava o quinto ano da Faculdade de Engenharia Mackenzie, em São Paulo, quando se vinculou à ALN e participou de algumas ações armadas durante o ano de 1969. Saiu do país após a onda de prisões que atingiu a organização no final daquele ano, envolvendo seu sobrinho, Manoel Cyrillo de Oliveira Neto, participante do seqüestro do embaixador norte-americano, Charles Burke Elbrick. Depois de receber treinamento militar em Cuba, retornou clandestinamente ao Brasil em 1971, já como militante do Movimento de Libertação Popular – MOLIPO. A versão oficial anunciava que, após travar tiroteio com agentes dos órgãos de segurança, Cavalcanti teria sido ferido e morto no bairro de Vila Carrão, na capital paulista, no dia 30/10/1972.

 

A versão oficial apresentada na requisição de exame necroscópico ao IML dizia que “[…] após travar tiroteio com agentes dos órgãos de segurança, foi ferido e em conseqüência, veio a falecer”. Sua morte foi amplamente divulgada pela imprensa porque Natanael de Moura Girardi, que estava junto com João Carlos, conseguiu fugir e os órgãos de segurança pretendiam alertar os hospitais e clínicas sobre a possibilidade de seu companheiro buscar socorro, já que estava ferido. Segundo o que se apurou com seus companheiros, João Carlos e Natanael de Moura Girardi (ambos do Molipo) tinham perdido, havia dois dias, o contato com Antônio Benetazzo, preso em 28 de outubro. Na busca por notícias, foram à casa de Rubens Carlos Costa, onde Benetazzo havia sido preso. Os agentes do DOI-CODI/SP encontravam-se instalados na casa vizinha para controlar o fluxo de pessoas nas imediações. Natanael conseguiu escapar do cerco, mas João Carlos foi ferido e preso.

 

Em depoimento prestado por seu irmão José Trajano Paternostro Reis, em 19 de março de 1996, temos:

[…] foi preso, ferido, foi interrogado nas dependências do DEOPS, falecendo, posteriormente, ali, horas depois; foram as autoridades do DEOPS que convocaram o requerente e sua progenitora para irem às dependências do IML, já que os policias do DEOPS, que guardavam o corpo de João Carlos, tinham ordens para prenderem quem ali comparecesse para reclamar o corpo; ao se aproximarem da pedra onde jazia o corpo de João Carlos, somente puderam reconhecê-lo do peito para a cabeça já que o resto do corpo estava coberto por um lençol cuja remoção não foi permitida; puderam constatar que o rosto de João Carlos estava sem o olho esquerdo, e a cavidade preenchida por algodão; que, o declarante indagou da pessoa que vestia avental branco o que tinha ocorrido, tendo obtido como resposta que isso tinha sido produto de um “tarugo de madeira”.

 

Os legistas Isaac Abramovitc e Orlando Brandão assinaram o óbito, alegando como causa da morte “lesões traumáticas crânio-encefálicas”. Consta como declarante o policial Miguel Fernandes Zaniello. O caixão funerário foi entregue lacrado, sob o compromisso e a recomendação de jamais ser exumado. Um agente dos órgãos de segurança estava presente, vigiando o enterro no Cemitério Gethsêmani.

 

Os legistas descreveram duas lesões de entrada na cabeça: no canto externo do supercílio direito, com ferimento de saída na região occipital; e outro ferimento de entrada no canto direito da rima bucal, que fraturou os incisivos laterais direitos e saiu pela porção inferior da região occipital. Apontaram ainda ferimentos no terço inferior de ambas as pernas por projéteis. A única foto encontrada nos arquivos do IML/SP mostra uma marca no pescoço não explicada nem descrita no laudo cadavérico.

 

O conselheiro Nilmário Miranda convocou o perito criminal Celso Nenevê, do Instituto de Criminalística da Coordenação de Polícia Técnica da Polícia Civil (DF), para elaborar parecer sobre as circunstâncias da morte de João Carlos, mas o perito não conseguiu concluir a análise por causa da “[…] absoluta falta de elementos materiais no bojo do caso”.

 

Nilmário Miranda ressaltou em seu relatório que Natanael, sobrevivente do tiroteio, afirmou que os tiros disparados do Corcel usado pelos agentes policiais ocorreram entre 18 e 19 horas. Entretanto, a ficha do IML encontrada nos arquivos do DOPS/SP afirma que a entrada no necrotério aconteceu às 22 horas de 30 de outubro de 1972, e que João Carlos vestia apenas cueca de nylon castanho e meias de algodão cinza, “[…] o que seria impróprio para o horário e o local do tiroteio”, segundo o perito Celso Nenevê.

 

Apesar da autorização por escrito de familiares, o relator considerou desnecessária a exumação do corpo de João Carlos, por acreditar que os elementos apresentados nos autos do caso permitiam uma conclusão: a circunstância da sua morte poderia ser comparada à de Arnaldo Cardoso Rocha, cuja ausência de roupas ao chegar no IML indicou que o militante foi levado à dependência policial, mesmo ferido, para fornecer mais informações. Na CEMDP, seu caso (167/96) foi aprovado por 6 votos a favor e 1 contra, o do general Oswaldo Pereira Gomes, em 7 de agosto de 1997.

 

Em sua homenagem, a cidade de São Paulo deu seu nome a uma rua localizada no Conjunto Habitacional Jova Rural.

 

 

Fontes investigadas:

 

Conclusões da CEMDP; Dossiê Ditadura – Mortos e Desaparecidos Políticos no Brasil – 1964-1985, IEVE. Contribuição da Comissão da Verdade do Estado de São Paulo: Projeto Brasil Nunca Mais Digital; Arquivo do Instituto de estudos sobre a violência do Estado – IEVE; Desaparecidos Políticos um capítulo não encerrado da História Brasileira / [edição de texto Instituto Macuco]. — São Paulo: Ed. do Autor, 2012. — (Desaparecidos Políticos um capítulo não encerrado da História Brasileira; v. 1)

 

 

IDENTIFICAÇÃO DOS AUTORES DA MORTE\DESAPARECIMENTO

Órgão / Período

Nome

Função

conduta

Vivo/data do óbito

Observações

IML

Isaac Abramovitch

Médico Legista

Falsificação do atestado de óbito

Vivo

 

IML

Orlando Brandão

Médico Legista

Falsificação do atestado de óbito

Vivo

 

DOPS/SP

Miguel Fernandes Zaniello

Policial Militar. Motorista do IML de 1961 a 1973.

Falso Testemunho.

Declarante no falso atestado de óbito

-

 

DOI/CODI

Carlos Alberto Brilhante Ustra

Chefe do DOI/CODI/SP no período

Perseguição, sequestro, assassinato

Vivo

 

 

DOCUMENTOS CONSULTADOS

  1. Documentação principal

 

 

Identificação do documento

Órgão da repressão

Observações

Anexo

Certidão de Nascimento de João Carlos Cavalcante Reis

 

Emitida em 23/01/1993

001-Arquivo-CEMDP-João-Carlos-Cavalcanti-Reis.pdf

Página 18

Certidão de óbito

IML

Emitida em 02/11/1972 no 20º Subdistrito do Jardim América, São Paulo/SP

001-Arquivo-CEMDP-João-Carlos-Cavalcante-Reis.pdf

Página 20

Carta de João Carlos endereçada aos pais

 

Sem data

002-Arquivo-CEMDP-João-Carlos-Cavalcanti-Carta-aos-pais.pdf

Aditamento ao requerimento inicial na CEMDP

 

 

003-Arquivo-CEMDP-requerimento-adicional.pdf

Declaração de José Trajano Paternostro Reis à CEMDP

 

Enviado à CEMDP em 13/03/1996

004-Termo-de-declarações-Jose-Trajano.pdf

Requisição de Exame Necroscópico

IML

Consta a Letra “T”, indicando um suposto terrorista. Emitido em 30/10/1972

005-Requisição-exame-necroscópico.pdf

Página 5

Laudo do Exame Necroscópico

IML

Assinado pelos legistas supracitados.

Datado de 31/10/1972

004-Termo-de-declarações-Jose-Trajano.pdf

Páginas 6 a 8

Fotos de João Carlos Cavalcanti Reis morto

IML

 

006-foto-morto.pdf

006-foto-morto-2.pdf

Ficha DOPS

DOPS/SP

Constam informações até 1978.

007-Ficha-DOPS.pdf

Foto de João Carlos Cavalcanti Reis com vida

 

 

008-Foto-Vivo.pdf

Reportagens imprensa sobre João Carlos Cavalvanti Reis à época da morte

 

Revista Veja 08/11/1972; Diário da Noite 02/11/1972; Jornal da Tarde 03/11/1972; Folha da Tarde 02/11/1972; O Estado de São Paulo 02/11/1972

009-Arquivo-CEMDP-Imprensa.pdf

Auto de Interrogatório Rubens Carlos Costa

DOPS/SP

Realizado em 20/02/1973

010-BNM-Interrogatório-Rubens-Carlos_Costa1.jpeg

010-BNM-Interrogatório-Rubens-Carlos_Costa2.jpeg

010-BNM-Interrogatório-Rubens-Carlos_Costa3.jpeg

010-BNM-Interrogatório-Rubens-Carlos_Costa4.jpeg

 

 

 

Documento que extingue a punibilidade de João Carlos Cavalcanti Reis

2º Auditoria Militar da 2º Circunscrição

 

011-Extinção-Punibilidade.jpeg

Requisição de Documentos sobre João Carlos Cavalcanti e familiares

DOPS/SP

Documento assinado em 23/03/1973 pelo delegado Edson Magnotti.

012-BNM-Requisição-DOPS.jpeg

Relatório de sindicância do DOPS/SP

DOPS/SP

Relatório; sindicância número 25/72; relacionado ao inquérito 9/72. Os citados são: Antonio Benetazzo; João Carlos Cavalcanti Reis e Silvia Peroba.

Documento assinado por Edson Magnotti

013-sindicância-DOPS1.jpeg

013-Sindicância-DOPS2.jpeg

Boletim de Ocorrência da Delegacia da Vila Carrão em 30/10/1972

Polícia Civil

 

014-Boletim-de-ocorrência.jpeg

Declarações de Helena Cavalcanti Reis (mãe) ao DOPS/SP

DOPS/SP

Interrogatório conduzido no dia 07/11/1972

015-BNM-Delcarações-Helena-Cavalcanti.jpeg

015-BNM-Delcarações-Helena-Cavalcanti2.jpeg

Inquérito sobre a MOLIPO

DOPS/SP

Inquéirto 6/73 sobre a MOLIPO em que consta o nome de Jose Carlos Cavalcanti Reis

016-Inquerito-Molipo-DOPS.jpeg

Desaparecidos Políticos um capítulo não encerrado da História Brasileira / [edição de texto Instituto Macuco]. — São Paulo: Ed. do Autor, 2012. — (Desaparecidos Políticos um capítulo não encerrado da História Brasileira; v. 1)

 

Relatório sobre as investigações na Vala de Perus

017-Vala-de-perus.pdf

 

 

 

2. Prova pericial e documental (inclusive fotos e vídeos) sobre a morte/desaparecimento

 

 

Documento

Fonte

Observação

Anexo

Fotos de João Carlos Cavalcanti Reis morto

Arquivo do Instituto de Estudos da Violência do Estado - IEVE

 

006-foto-morto.pdf

006-foto-morto2.pdf

Certidão de óbito

Arquivo do Instituto de Estudos da Violência do Estado - IEVE

Emitida em 02/11/1972 no 20º Subdistrito do Jardim América, São Paulo/SP

001-Arquivo-CEMDP-João-Carlos-Cavalcante-Reis001.pdf

Página 20

Requisição de Exame Necroscópico

IML

Consta a Letra “T”, indicando um suposto terrorista. Emitido em 30/10/1972

004-Termo-de-declarações-Jose-Trajano.pdf

Página 5

Laudo do Exame Necroscópico

IML

Assinado pelos legistas supracitados.

Datado de 31/10/1972

004-Termo-de-declarações-Jose-Trajano.pdf

Páginas 6 a 8

Celso Nenevê

Perito Criminal do Instituto de Criminalística do Distrito Federal

Aponta contradições e inconsistências no laudo pericial produzido pelo IML à época da morte.

Dossiê Ditadura p. 387

Nilmário Miranda

Processo na CEMDP

Nilmário Miranda ressaltou em seu relatório que Natanael, sobrevivente do tiroteio, afirmou que os tiros disparados do Corcel usado pelos agentes policiais ocorreram entre 18 e 19 horas. Entretanto, a ficha do IML encontrada nos arquivos do DOPS/SP afirma que a entrada no necrotério aconteceu às 22 horas de 30 de outubro de 1972, e que João Carlos vestia apenas cueca de nylon castanho e meias de algodão cinza, “[…] o que seria impróprio para o

horário e o local do tiroteio”, segundo o perito Celso Nenevê. O relator considerou desnecessária a exumação do corpo de João Carlos, por acreditar que os elementos apresentados nos autos do caso permitiam uma conclusão: a circunstância da sua morte poderia ser comparada à de Arnaldo Cardoso Rocha, cuja ausência de roupas ao chegar no IML indicou que o militante foi levado à dependência policial, mesmo ferido, para fornecer mais informações.

Dossiê Ditadura

p. 387

 

 

3. Testemunhos sobre a prisão, morte/desaparecimento

 

Nome

Relação com o morto / desaparecido

Informação

Fonte

Natanael de Moura Girardi

Militante da mesma organização

Ferido na emboscada que resulta na prisão de João Carlos Cavalcanti Reis, Natanael Girardi consegue escapar do cerco montado na Vila Carrão e esclarece o horário do tiroteio.

Dossiê Ditadura p. 386

José Trajano Paternostro Reis

Irmão

Em requerimento enviado à CEMDP, José Trajano informa que João Carlos teria sido ferido na emboscada na casa de Rubens Carlos e levado, posteriormente ao DOPS, onde morreu sob intensa tortura.

Dossie Ditadura p.386

(em anexo)

004-Termo-de-declarações-Jose-Trajano.pdf

Helena Cavalcanti Reis

mãe

Em depoimento prestado ao DOPS/SP, relata o dia em que foi informada e que obteve permissão para a retirada do corpo do filho do IML.

(em anexo)

014-BNM-Declarações-Helena-Cavalcanti.jpeg

 

 

 

 

4. Depoimento de agentes da repressão sobre a morte/desaparecimento

 

Nome

Órgão / Função

Informação

Fonte com referências

 

 

 

 

OBS: Em anexo cópias de todos os documentos reunidos pela Comissão de Familiares dos Mortos e Desaparecidos Políticos e Comissão da Verdade do Estado de São Paulo “Rubens Paiva”

 

CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES PARA O CASO

Conclusão: João Carlos Cavalcanti Reis foi detido no dia 30/11/1972 em uma emboscada preparada por agentes do DOPS/SP na casa de Rubens Carlos Costa, na Vila Carrão, em São Paulo. Apesar de ferido, foi, provavelmente, levado à dependências DOPS/SP, onde viria a falecer horas depois. A farsa sobre as circunstâncias de sua prisão e morte foi endossada com a produção de documentos assinados por médicos legistas e funcionários do DOPS/SP.

 

Recomendações: Investigação das circunstâncias da prisão e morte de João Carlos Cavalcanti Reis; identificação e responsabilização dos agentes da repressão envolvidos no caso; retificação do atestado de óbito; que o Estado brasileiro reconheça e declare a condição de anistiado político de João Carlos Cavalcanti Reis, pedindo oficialmente perdão pelos atos de exceção e violações de direitos humanos que foram praticados contra este cidadão assassinado pela ditadura militar.

 

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