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INICIAL DO NOME:

DENIS CASEMIRO

OCORRÊNCIA

Morto em 18 de maio de 1971/ Encontrado no Cemitério Dom Bosco, em Perus/SP, foi exumado em 04/09/1990 e trasladado e sepultado no dia 13/8/1991

DADOS PESSOAIS
Filiação: Antônio Casemiro Sobrinho e de Maria dos Anjos Casemiro
Data e local de nascimento: 9 de dezembro de 1942, em Votuporanga (SP)
Profissão: Trabalhador rural
Atuação política: Militante da Vanguarda Popular Revolucionária (VPR)
Data e local da morte/desaparecimento: Morto em 18 de maio de 1971/ Encontrado no Cemitério Dom Bosco, em Perus/SP, foi exumado em 04/09/1990 e trasladado e sepultado no dia 13/8/1991
Organização política: Vanguarda Popular Revolucionária (VPR).

Arquivos

RELATO DO CASO

Nasceu em 9 de dezembro de 1942, em Votuporanga (SP), filho Antônio Casemiro Sobrinho e de Maria dos Anjos Casemiro. Denis foi sequestrado e desapareceu no dia 18 de maio de 1971 quando era militante da Vanguarda Popular Revolucionária (VPR). Ele era trabalhador rural e frequentava com assiduidade o Sindicato dos Lavradores de Votuporanga, fechado por ocasião do golpe de 1964. Seu pai era militante comunista e seu irmão, Dimas A. Casemiro, dirigente do MRT, foi assassinado em São Paulo (SP), em 19 de abril de 1971. (Dossiê Ditadura, p. 249)

Até 1967, Denis manteve-se naquela região, ora trabalhando como pedreiro, ora como lavrador. A partir de então, em busca de emprego mais bem pago, foi para São Bernardo do Campo (SP) trabalhar na fábrica da Volkswagen. Nos dias de folga, jogava futebol de várzea. Nessa ocasião, conheceu Devanir José de Carvalho, outro militante assassinado pela repressão política, e seus irmãos Daniel, que é um dos desaparecidos políticos, e Jairo. Passou a ter militância política de oposição à ditadura e integrou-se à Ala Vermelha – uma dissidência do PCdoB – e, mais tarde, à VPR.

Mudou-se para o Maranhão, onde cuidava de um sítio próximo a Imperatriz (MA), com a perspectiva de ali desenvolver um trabalho político e militar no meio rural. Localizado e preso pelo delegado Sérgio P. Fleury, em fins de abril de 1971, foi trazido para o DOPS/SP, onde permaneceu sendo torturado por quase um mês. Durante esse período, era sempre transportado pelos corredores daquele órgão policial com um capuz cobrindo seu rosto para impossibilitar sua identificação pelos demais presos. Um deles, Waldemar Andreu, conterrâneo de Denis, chegou a conversar com ele por alguns minutos. Ele estava confiante de que a retirada do capuz era um sinal de que as torturas acabariam e que o perigo de ser assassinado havia passado, segundo depoimento publicado nos jornais Folha de S. Paulo e A Notícia, de 13 de agosto de 1991(Anexo 008-jornais-1991.pdf). Os restos mortais de Denis foram trasladados para sua cidade natal, depois de terem sido retirado da vala Clandestina de Perus, no cemitério de Perus, e identificado graças ao esforço da Comissão de Familiares dos Mortos e Desaparecidos Políticos e do apoio da prefeitura Municipal de São Paulo na gestão de Luiza Erundina.

Denis foi fuzilado em 18 de maio de 1971. Em relatório encontrado no arquivo do antigo DOPS/SP, consta a versão do delegado Fleury sobre a morte de Denis, no qual não esconde seu cinismo ao informar que enquanto Denis era transportado do Rio de Janeiro para São Paulo, próximo a Taubaté (SP), teria dito que, em Ubatuba, no litoral paulista, havia um campo de treinamento de guerrilha da VPR. O relatório descreve:

Ao iniciarem a descida da serra o preso alegou que necessitava com urgência realizar uma necessidade fisiológica. […] Porém, dada a insistência do preso, dei ordem para a viatura estacionar e o mesmo descer à estrada. […] O preso desceu e dirigiu-se à sua beira […] Eis que então, em movimento brusco e completamente inesperado, conseguiu apoderar-se da arma do policial que se encontrava próximo. O outro policial, diante do ocorrido, fez um disparo contra o preso, que deixando a arma cair, mergulhou em um matagal e principício [sic]. Imediatamente perdemos de vista o preso, e iniciamos intensiva busca no local, onde foram feitos vários disparos. Porém a busca revelou-se infrutífera e então nos dirigimos à cidade de Ubatuba, que era a localidade mais próxima do local da ocorrência. […] Pela manhã, por volta de dez horas, este Departamento foi cientificado pela Autoridade de Ubatuba, de que o fugitivo havia sido internado na Santa Casa Local […]. Seguiu então para aquela localidade uma equipe desta Delegacia, que, no caminho já encontrou- se acidentalmente com o Delegado de Polícia de Ubatuba, que, alertado pelo médico que atendeu ao fugitivo, vinha transportando o preso, para que fosse melhor medicado […] A equipe recebeu o preso e rumou com toda a pressa para esta Capital, a fim de que Denis Casemiro recebesse no Hospital das Clínicas o tratamento de que carecia. Porém, lamentavelmente, ao se aproximarem […] o preso, não resistindo aos ferimentos recebidos, veio a falecer, tendo então sido entregue ao Necrotério do Instituto de Polícia Técnica para as providências de praxe.(Anexo 007-relatorio-fleury.pdf)

 

A requisição de exame, assinada pelo delegado do DOPS Alcides Cintra Bueno Filho e datada de 19 de maio, confirma a versão do documento citado, informa que o cadáver despido de Denis teria sido encontrado no próprio IML. O laudo necroscópico, realizado pelos legistas Renato Cappelano e Paulo Augusto de Queiroz Rocha, confirmou a versão policial, descrevendo apenas a trajetória das balas que o mataram, sem fazer referências sobre o estado do corpo. (Anexo 001-laudo-necroscopico.pdf)

No entanto, chamam a atenção os ferimentos com perfuração do pulmão, fígado, estômago e vasos peritoniais e a intensidade do sangramento; e, mesmo assim, Denis teria conseguido chegar até o hospital. O laudo descreve no item 4: “[…] entrada e saída múltiplas, interessando as articulações falange-falanginha do quarto e terceiro quirodáctilos da mão direita, com direção oblíqua”. Em geral, tiros na mão indicam execução, um gesto de defesa da vítima. (Dossiê Ditadura, p. 250)

Denis foi enterrado como indigente e com os dados pessoais alterados para dificultar sua identificação. No livro de registro de sepultamentos do cemitério, ele teria 40 anos e demais dados ignorados. Na realidade, ao morrer, ele estava com 28 anos e todos os seus dados constavam do atestado de óbito. Nenhuma comunicação oficial da morte foi feita pelas autoridades. A repressão política o matou e procurou esconder seu cadáver. Sem informações, os movimentos de oposição à ditadura passaram a considerá-lo um desaparecido político. A história de sua prisão, tortura e morte começou a ser desvendada durante a campanha pela Anistia Ampla, Geral e Irrestrita, em 1979, quando foram registrados relatos de ex-presos políticos. A denúncia de que estava enterrado no Cemitério de Perus foi feita durante a votação do projeto de anistia, na Câmara Federal, quando a Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos denunciava, em nota, o paradeiro de dois desaparecidos: Denis e Luiz Eurico Tejera Lisbôa. Seus restos mortais encontravam-se na vala clandestina de Perus, com outras 1.049 ossadas. (Dossiê Ditadura p. 251)

A identificação de seus restos mortais só foi possível porque a prefeita de São Paulo, Luiza Erundina, determinou que fossem efetuadas as investigações a respeito da Vala de Perus, aberta em setembro de 1990. Em 13 de agosto de 1991, seus restos mortais, depois de identificados na Unicamp, foram trasladados para sua cidade natal, velados na Câmara Municipal de Votuporanga, com missa na Igreja Matriz e, em seguida, foi dignamente sepultado. Antes do traslado, no mesmo dia, houve missa na Catedral da Sé, na capital paulista, celebrada por D. Paulo Evaristo Arns em homenagem a Denis, Antônio Carlos Bicalho Lana e Sônia Maria de Moraes Angel Jones, guerrilheiros assassinados em 1973, também exumados do cemitério D. Bosco de Perus e identificados na Unicamp.

Seu nome consta na lista de desaparecidos políticos do anexo I, da lei 9.140/95. A Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP) registrou o caso de Denis no processo nº 110/96 e foi publicado no Diário Oficial da União dia 4/12/1995. (Direito à Memória e à Verdade, p. 164)

A Comissão da Verdade do Estado de São Paulo fez a 7ª audiência pública sobre o caso no dia 21 de fevereiro de 2013, com a participação de Waldemar Andreu, que reafirmou ter visto Denis e conversou com ele pela última vez no DOPS-SP. (Anexo 017-transcricao.pdf)

O documento intitulado “Relatório preliminar das atividades de Denis Casemiro” produzido pelo DOPS-SP indica que teria atividades políticas ao ser preso, e inclusive  teria sido alertado pelo capitão Carlos Lamarca que Carlos Alberto Soares de Freitas (Breno) fora preso, sugerindo que Denis procurasse outra casa na região do Paraná, mas Denis teria resolvido não fazer isso. No mesmo documento, Denis teria declarado que quem o entregou foi uma pessoa identificada como “Primo”. (Anexo 012-relatorio-preliminar-dops.pdf)

Fontes investigadas: 

Conclusões da CEMDP; Dossiê Ditadura – Mortos e Desaparecidos Políticos no Brasil – 1964-1985, IEVE. Contribuição da Comissão da Verdade do Estado de São Paulo: 7ª audiência pública sobre o caso de Denis Casemiro, realizada no dia 21/02/2013.

IDENTIFICAÇÃO DOS AUTORES DA MORTE\DESAPARECIMENTO

Órgão / Período

Nome

Função

conduta

Vivo/data do óbito

Observações

DOPS-SP

 

SÉRGIO PARANHOS FLEURY

 

Delegado

Prisão, Tortura, assassinato e desaparecimento do cadáver

 

Morto

Denis mudou-se para o Maranhão, foi localizado e preso pelo delegado em fins de abril de 1971. (Dossiê Ditadura p. 250)

IML

 

RENATO CAPPELANO

 

Médico-legista

Falsificação do laudo necroscópico

 

 

Ver em anexo a cópia do laudo necroscópico.

Anexo 001-laudo-necroscopico.pdf

IML

 

PAULO AUGUSTO DE QUEIROZ ROCHA

Médico-legista

 

Falsificação do laudo necroscópico

 

Ver em anexo a cópia do laudo necroscópico.

Anexo 001-laudo-necroscopico.pdf

DOPS-SP

 

ALCIDES CINTRA BUENO FILHO

 

Delegado

 

Requisição de exame ao IML

morto

O delegado assinou a requisição de exame necroscópico ao IML.

Dossiê Ditadura, p. 250

 

Anexo 001-laudo-necroscopico.pdf

IML - SP

Jair Romeu

Funcionário público do IML - SP

Encaminhou o corpo para sepultamento sem comunicar a família, efetivando o desaparecimento do cadáver

morto

Anexo 002-requisicao-exame.pdf

DOCUMENTOS CONSULTADOS

  1. Documentação principal

Identificação do documento

Órgão da repressão

Resumo

Observações

 

Laudo de exame de corpo de Delito – Exame necroscópico (fotocópia do acervo da Comissão de Familiares dos Mortos e Desaparecidos Políticos)

 

INSTITUTO MÉDICO LEGAL DE SP – DOPS-SP

 

O laudo descreve apenas a trajetória das balas que o mataram com “entrada e saída múltiplas, interessando as articulações falange-falanginha do quarto e terceiro quirodáctilos da mão direita, com direção oblíqua”.

 

O laudo necroscópico não relata as torturas sofridas e conclui que o examinado “veio a falecer em consequência de anemia aguda consecutiva à hemorragia interna traumática”.

Anexo 001-laudo-necroscopico.pdf

Em geral, tiros na mão indicam execução, um gesto de defesa da vítima (Dossiê Ditadura p. 250)

Requisição de Exame – IML -SP

IML – SP

A requisição está marcada com a letra “T” indicando que se trata de um “Terrorista”

Anexo 002-requisicao-exame.pdf

Certidão de Óbito

 

Consta como causa da morte “hemorragia interna traumática”

Anexo 005-certidao-obito.pdf

Relatório Sérgio Paranhos Fleury

DOPS-SP

 

Anexo 007-relatorio-fleury.pdf

Fotos de Denis Casemiro morto

 

 

Anexo 003-foto-morto.pdf

Fotos de Denis Casemiro vivo

 

 

Anexo 010-foto-vivo.pdf e 011-denis-foto-dossie

Autorização de traslado dos restos mortais

 

 

Anexo 004-autorizacao-traslado.pdf

Cópias de matérias de jornais da época da identificação dos restos mortais

 

 

Anexo 008-jornais-1991.pdf

Documento nomeado “Relatório preliminar”

Dops

O texto foi produzido por um delegado que não identificou o seu nome completo, colocando uma rubrica ao final do documento, indicando ser o “Delegado Adjunto da ordem social”. O conteúdo diz respeito a uma suposta declaração de Denis sobre a participação na política até ser preso.

Anexo 012-relatorio-preliminar-dops.pdf

Fotos da possível casa que Denis estava morando tiradas pelos policiais

Dops

 

Anexo 009-dops-casa-morto.pdf

 

Laudo de identificação

Unicamp

Laudo produzido com finalidade de identificação da ossada de Denis Casemiro, encontrada na “Vala Comum” no Cemitério Dom Bosco em 1991.

Anexo 014-laudo-unicamp.pdf

 

Ficha do Dops

Dops

Consta que Denis foi preso.

Anexo 015-ficha-dops.pdf

Certidão de Nascimento

 

 

Anexo 016-certidao-nascimento.pdf

Ficha de dados antropométricos

 

 

Anexo 013-ficha-dados-antropometricos.pdf

Transcrição da audiência pública da Comissão da Verdade do Estado de São Paulo “Rubens Paiva”

Assembleia Legislativa de São Paulo

Conteúdo completo da audiência com depoimento de Waldemar Andreu

Anexo 017-transcricao.pdf

 

2. Prova pericial e documental (inclusive fotos e vídeos) sobre a morte/desaparecimento

Documento

 

  fonte

Observação

 

 

 

 

 

 

 

3. Testemunhos sobre a prisão, morte/desaparecimento

Nome

relação com o morto / desaparecido

Informação

fonte

Waldemar Andreu

Conterrâneo e ex-preso político

Reafirmou ter visto Denis e conversou com ele pela última vez no DOPS-SP

(Anexo 017-transcricao.pdf)

 

 

 

 

 

4. Depoimento de agentes da repressão sobre a morte/desaparecimento

Nome

Órgão / Função

Informação

 

SÉRGIO PARANHOS FLEURY

 

Delegado do DOPS-SP

 Ao iniciarem a descida da serra o preso alegou que necessitava com urgência realizar uma

necessidade fisiológica. […] Porém, dada a insistência do preso, dei ordem para a viatura

estacionar e o mesmo descer à estrada. […] O preso desceu e dirigiu-se à sua beira […] Eis que então, em movimento brusco e completamente inesperado, conseguiu apoderar-se da arma do policial que se encontrava próximo. O outro policial, diante do ocorrido, fez um disparo contra o preso, que deixando a arma cair, mergulhou em um matagal e principício [sic]. Imediatamente perdemos de vista o preso, e iniciamos intensiva busca no local, onde foram feitos vários disparos. Porém a busca revelou-se infrutífera e então nos dirigimos à cidade de Ubatuba, que era a localidade mais próxima do local da ocorrência. […] Pela manhã, por volta de dez horas, este Departamento foi cientificado pela Autoridade de Ubatuba, de que o fugitivo havia sido internado na Santa Casa Local […]. Seguiu então para aquela localidade uma equipe desta Delegacia, que, no caminho já encontrou- se acidentalmente com o Delegado de Polícia de Ubatuba, que, alertado pelo médico que atendeu ao fugitivo, vinha transportando o preso, para que fosse melhor medicado […] A equipe recebeu o preso e rumou com toda a pressa para esta Capital, a fim de que Denis Casemiro recebesse no Hospital das Clínicas o tratamento de que carecia. Porém, lamentavelmente, ao se aproximarem […] o preso, não resistindo aos ferimentos recebidos, veio a falecer, tendo então sido entregue ao Necrotério do Instituto de Polícia Técnica para as providências de praxe. Dossiê Ditadura, p. 250 e Anexo 007-relatorio-fleury.pdf

 

OBS: Em anexo cópias de todos os documentos reunidos pela Comissão de Familiares dos Mortos e Desaparecidos Políticos e Comissão da Verdade do Estado de São Paulo “Rubens Paiva”

CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES PARA O CASO

Conclusão: Denis Casemiro foi torturado e morto pelos agentes do DOPS de São Paulo. 

Recomendações: Retificação do Atestado de Óbito; Na audiência da Comissão “Rubens Paiva” foram sugeridas três recomendações: 1 – Requisitar à Delegacia de Política de Ubatuba se há algum registro de homicídio (morte violenta) nesse mesmo período; 2 – Verificar se houve, na Santa Casa de Ubatuba, a entrada de Denis Casimiro; 3 – Identificar e tentar localizar a pessoa chamada de “Primo”.

Recomenda-se que o Estado brasileiro reconheça e declare a condição de anistiado político de Denis Casemiro, pedindo oficialmente perdão pelos atos de exceção e violações de direitos humanos que foram praticados contra esse morto.

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