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INICIAL DO NOME:

ORLANDO MOMENTE

OCORRÊNCIA

1974, no Araguaia

DADOS PESSOAIS
Filiação: Álvaro Momente e Antônia Rivelino Momente
Data e local de nascimento: 10 de outubro de 1933, em Rio Claro (SP)
Profissão: Operário
Atuação política: Militante do Partido Comunista do Brasil (PCdoB). Militante do Destacamento A das Forças Guerrilheiras do Araguaia.
Data e local da morte/desaparecimento: 1974, no Araguaia
Organização política: Partido Comunista do Brasil (PCdoB).

Arquivos

RELATO DO CASO

Paulista de Rio Claro, Orlando Momente fez o curso primário em sua terra natal e também estudou desenho mecânico, concluindo-o em 1950. Mudou-se para São Paulo e trabalhou como operário na Companhia Antárctica Paulista, entre 1951 e 1959. Em abril de 1961, casou-se com Maria José de Moura Momente, com quem teve uma filha, Rosana de Moura Momente. Militou no PCB desde os anos 1950 e posteriormente transferiu-se ao PCdoB. Com o Golpe de Estado de 1964, foi viver com a família em uma fazenda em Fernandópolis (SP), onde ficou pouco tempo.

Passou a atuar na clandestinidade, mas periodicamente visitava seus familiares. A última vez em que esteve com eles foi em 1969. Devido às perseguições políticas, passou a viver no norte de Goiás e, posteriormente, no sul do Pará, próximo à Transamazônica, na localidade de Paxiba.

Tinha um gênio alegre e muito criativo. Sabia sair-se com facilidade de situações difíceis concernentes à sobrevivência na floresta. Muito habilidoso e prestativo, conquistava facilmente a simpatia de todos que o conheciam. Com seu espírito arrojado, em algumas ocasiões esteve frente a frente com agentes da repressão, passando-se por camponês e dando informações erradas sobre os guerrilheiros, contando para isso com a ajuda dos moradores que o apresentavam como compadre ou parente.

Após o ataque à Comissão Militar no natal de 1973, os guerrilheiros decidiram se separar em grupos de cinco pessoas. De acordo com o Relatório Arroyo: “Os grupos eram cinco. Um chefiado por Osvaldo [Orlando da Costa] (que retornou à sua área); outro por J. [Ângelo Arroyo]; outro pelo João [Dermeval da Silva Pereira]; outro pelo Nelito [Nelson Lima Piauhy Dourado]; e o outro pelo Landim [Orlando Momente]. (...) Dia 30 pela manhã (30/12/73), os cinco grupos tomaram seus destinos. Às 15h ouviu-se ruído de metralhadora no rumo em que havia seguido Osvaldo ou Landim (Orlando Momente). Não se sabe o que houve”.

Em 1974, Joana de Almeida, moradora da região e esposa de Luiz Vieira, camponês também desaparecido na Guerrilha do Araguaia em 1974, esteve em seu antigo sítio na Paxiba, próximo a São Domingos do Araguaia (PA), e encontrou restos de uma ossada humana, semi-enterrada. Visíveis estavam o crânio e um fêmur, com características de terem sido enterrados havia pouco tempo, porque ainda tinham restos de carne. Ao lado da ossada estava um chapéu feito de couro de coati curtido, o que lhe deu certeza de que se tratava de seu compadre e amigo Orlando. Na época, Joana nada pôde fazer porque estava proibida pelo Exército de ir a seu sítio, ao qual fora às escondidas à procura de alimentos. Este depoimento foi dado a Criméia Schmidt de Almeida, que esteve na região da guerrilha, em 1993, com uma equipe de jornalistas da revista Manchete.

Os relatórios dos três ministérios militares entregues ao ministro da Justiça, Maurício Corrêa, em 1993, não trazem nenhuma informação sobre o seu paradeiro.

No Livro do jornalista Leonencio Nossa, “Mata! O Major Curió e as guerrilhas no Araguaia”, temos: “O tenente da reserva José Vargas Jiménez relata que, dias depois do combate [liderado por Lício Augusto Maciel], viu os corpos de Zé Carlos [André Grabois], Alfredo [camponês de nome Antônio Alfredo de Lima], Zebão [João Gualberto Calatroni] e Landim [Orlando Momente] expostos ao sol. É a barbárie: ‘Estavam cheirando mal. Um dos meus soldados foi até um dos cadáveres e com uma faca cortou um dos dedos, retirou o resto da carne que já estava em decomposição, ficando somente os ossos, que pendurou no seu pescoço dizendo: ‘Esse amuleto é meu troféu de guerra!’. Eu encontrei um gorro feito do couro de quati na cabeça do Zé Carlos, era do tipo de Daniel Boone, peguei pra mim’. O gorro pertencia a Landim, lembra Adalgisa” (p. 163).

Em 2010, a Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da Organização dos Estados Americanos (OEA) condenou o Brasil pela desaparição de 62 pessoas na região do Araguaia no caso Gomes Lund e Outros (“Guerrilha do Araguaia”) VS. Brasil, dentre elas está Orlando. A sentença obriga o Estado Brasileiro a investigar os fatos, julgar e, se for o caso, punir os responsáveis e de determinar o paradeiro das vítimas.

Na 31º audiência publica realizada dia 12 de abril de 2013 pela Comissão da Verdade do Estado de São Paulo, sua filha Rosana Momente afirmou não ter conseguido acessar a pensão pela morte de Orlando a que ela e sua mãe têm direito devido a ausência da data da morte de seu pai na certidão de óbito expedida pelo Estado, onde se lê: “conforme a Lei 9140, de 4 de dezembro de 1995”. Nas palavras de Rosana: “E uma coisa que está sendo difícil é que ela [Maria José de Moura Momente] tem direito a uma pensão por morte do meu pai, mas o governo não libera a data exata do falecimento, então o INSS não libera essa pensão. Porque tem um período que ele contribuiu como trabalhador registrado e tudo e mais o período que ele poderia trabalhar, poderia ter trabalhado que o governo colocou lá, para contagem do INSS, mas o próprio órgão público, que é quem dá essa pensão, alega que não é a data do falecimento dele, então eles dificultam.”

Seu nome consta da lista de desaparecidos políticos do anexo I da lei 9.14095. Na CEMDP, seu caso foi protocolado com o número 090/96.

Em sua homenagem, a cidade de Campinas (SP) deu seu nome a uma rua situada no bairro Residencial Cosmo I.

Fontes investigadas:

Conclusões da CEMDP; Dossiê Ditadura – Mortos e Desaparecidos Políticos no Brasil – 1964-1985, IEVE; Sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos; Contribuição da Comissão da Verdade do Estado de São Paulo: 31ª audiência pública sobre os casos dos guerrilheiros desaparecidos no Araguaia, nascidos em São Paulo ou que tiveram atuação política principalmente nesse Estado: Antonio Guilherme Ribeiro Ribas, Gilberto Olimpio Maria, Miguel Pereira dos Santos, Manoel José Nurchis, Orlando Momente, Silon da Cunha Brum, Pedro Alexandrino de Oliveira Filho, Jaime Petit da Silva, Lucio Petit da Silva, realizada no dia 12/04/2013; Mata! O Major Curió e as Guerrilhas do Araguaia/ Leonencio Nossa -1ªed. - São Paulo: Companhia das Letras, 2012.

IDENTIFICAÇÃO DOS AUTORES DA MORTE\DESAPARECIMENTO

  1.  

 

Órgão / Período

 

Nome

 

  •  
  •  

Vivo/data do óbito

  •  

PRESIDENCIA DA REPUBLICA FEDERATICA DO BRASIL 1974-1979

ERNESTO GEISEL

PRESIDENTE DA REPÚBLICA

Responsável pela adoção de uma política de extermínio das Forças Guerrilheiras do Araguaia

Morto

“Antes de tomar posse, em 16 de fevereiro de 1974, [Ernesto] Geisel chamou o general Dale Coutinho para uma conversa. Velhos amigos, falaram de política e de combate à subversão. O jornalista Elio Gaspari, em A Ditadura Derrotada, reproduz o dialogo: “Ah, o negocio melhorou muito. Agora, melhorou, aqui entre nós, foi quando nós começamos a matar. Começamos a matar” - afirmou Coutinho. “Porque antigamente você prendia o sujeito e o sujeito ia lá pra fora (…) Ô Coutinho, esse troço de matar é uma barbaridade, mas eu acho que tem que ser”, respondeu Geisel. […] Ao concordar com o método de eliminação de adversário sugerido pelo general, o futuro presidente autorizou a linha-dura a continuar o extermínio. No mesmo encontro, Geisel convida Dale Coutinho para substituir o irmão Orlando no Ministério do Exército.” Informação consta no livro Operação Araguaia (p. 492)

CENTRO DE INFORMAÇÃO DO EXÉRCITO (CIE)

Licio Augusto Maciel

Major Adjunto do CIE, Atualmente é tenente-coronel da reserva.

Assassinato e ocultação de cadáver

Vivo

“Horas após a invasão da casa de Oneide, Lício iniciava a perseguição a Zé Carlos, filho de Mauricio Grabois.Uma semana depois, encontrou o guerrilheiro. [...] Lício esperou o início da tarde para deflagrar o combate.[...] O tenente da reserva José Vargas Jiménez relata que, dias depois do combate [liderado por Lício Augusto Maciel], viu os corpos de Zé Carlos [André Grabois], Alfredo [camponês de nome Antônio Alfredo de Lima], Zebão [João Gualberto Calatroni] e Landim [Orlando Momente] expostos ao sol. É a barbárie: ‘Estavam cheirando mal. Um dos meus soldados foi até um dos cadáveres e com uma faca cortou um dos dedos, retirou o resto da carne que já estava em decomposição, ficando somente os ossos, que pendurou no seu pescoço dizendo: ‘Esse amuleto é meu troféu de guerra!’. Eu encontrei um gorro feito do couro de quati na cabeça do Zé Carlos, era do tipo de Daniel Boone, peguei pra mim’. O gorro pertencia a Landim, lembra Adalgisa”” Informação consta no livro “Mata! O Major Curió e as guerrilhas no Araguaia (p. 163)

CENTRO DE INFORMAÇÃO DO EXÉRCITO (CIE)

José Vargas Jiménez

Sargento. Atualmente é tenente da reserva.

Assassinato e ocultação de cadáver

Vivo

“O tenente da reserva José Vargas Jiménez relata que, dias depois do combate [liderado por Lício Augusto Maciel], viu os corpos de Zé Carlos [André Grabois], Alfredo [camponês de nome Antônio Alfredo de Lima], Zebão [João Gualberto Calatroni] e Landim [Orlando Momente] expostos ao sol.” Informação consta no livro “Mata! O Major Curió e as guerrilhas no Araguaia (p. 163)

CENTRO DE INFORMAÇÃO DO EXÉRCITO (CIE) 1969-1974

Milton Tavares de Souza

General e diretor do Centro de

Informações do Exército

Desaparição forçada dos guerrilheiros e guerrilheiras no Araguaia

Morto

“Miltinho era o general Milton Tavares de Souza, também conhecido como “Caveirinha”. Foi diretor do Centro de

Informações do Exército enquanto Orlando Geisel era Ministro do Exército, durante o governo Médici. Nessa função, foi

responsável pela política de eliminação física dos inimigos do regime. Foi ainda responsável em 1969 pela organização

dos DOI-CODI em todo o Brasil e das operações Bandeirantes e Marajoara, que prepararam o terreno para os

desmantelamento da Guerrilha do Araguaia” Informação consta no depoimento dado pelo coronel do Exército Paulo Malhães a Comissão da Verdade do Rio de Janeiro publicado dia 30/05/2014.

Gabinete Militar 1974-1979

Hugo de Andrade Abreu

Chefe Gabinete militar de 1974-1979 e Comandante da Brigada Pára-Quedista

Desaparição forçada dos guerrilheiros e guerrilheiras no Araguaia

Morto

A reunião, confirmada pelo coronel Sebastião “Curió” Rodrigues, do Centro de Informações do Exército (CIE), mudou a postura do governo. A partir do final de 1973, não restariam mais sobreviventes nas guerrilhas. Transferido para a direção da Polícia Federal, Bandeira foi substituído no Araguaia pelo general Hugo Abreu, da Brigada de Pára-quedistas. O general Milton Tavares, chefe do CIE, comandava as ações de extermínio. A missão ficou dividida entre os três ministros militares e a orientação era não deixar rastros. O CIE encarregou-se do Araguaia e dos militantes caçados pelos órgãos de repressão do Cone Sul. Com Geisel no poder (1974-1979), um grupo do DOI-Codi (Destacamento de Operações e Informações - Centro de Operações de Defesa Interna) de São Paulo deveria exterminar os sobreviventes do PCdoB e o Comitê Central do PCB.” Informação consta na matéria “A Ordem é matar” da Revista ISTOÉ de 24/03/2004

COMANDO MILITAR DO PLANALTO

OLAVO VIANNA MOOG

General de divisão e comandante do Comando Militar do Planato

Uso de bombas napalm contra as Forças Guerrilheiras do Araguaia

 

“ [...]o Relatório de Apoio Aéreo, produzido também em novembro de 1972 pelo tenente-coronel

Flarys Guedes Henriques de Araújo, após ratificar que o Comando Militar do Planalto coordenou tais

operações, expressamente admitiu, tudo em documentação secreta, que:

'As missões pretendidas pelo CMP aqui mencionadas no item 1 foram executadas no

decorrer das operações; há a acrescentar àquele repertório o bombardeio de três áreas

com bombas napalm e de emprego geral'. (fl 02, desse Relatório).” informação consta no relatório “Araguaia I” produzido por Claudio Fonteles para a Comissão Nacional da Verdade (p.8)

ESTADO-MAIOR DAS FORÇAS ARMADAS

ALVRO DE SOUZA PINHEIRO

Coronel de infantaria, atuava como oficial de ligação do Exécito Brasileiro junto ao Centro de Armas Combinadas e à Escola de Comando e Estado-Maior do Exército dos EUA. Atualmente é General de Brigada (reserva)

Utilização de bombas napalm contra as Forças Guerrilheiras do Araguaia

 

Informação consta no anexo 007

D) DOCUMENTOS CONSULTADOS

1. Documentação principal

 

Identificação do documento

 

Órgão da repressão

 

Observações

Anexo

Dossiê para Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP)

 

Documento encaminhado à Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos por Rosana Moura Momente, filha de Orlando Momente, no dia 03/02/1996

001- dossie_cemdp.pdf

Recibo da entrega do dossiê para a CEMDP

 

 

002-recibo_indenizacao_cemdp.pdf

Foto Orlando Momente

 

 

004-foto_orlando_momente.pdf

Foto Orlando Momente

 

 

005-foto_orlando_2.pdf

Documento produzido pela Comissão de Familiares

 

 

006-doc-comissao-de-familiares.pdf

Artigo escrito pelo general da brigada na reserva, Álvaro de Souza Pinheiro, para a série "Guerrilha na Amazônia: uma experiência no passado, o presente e o futuro" (publicado originalmente na: Military Review 1º Trim 95 Ed Português)

Estado-Maior das Forças Aramadas

Informações sobre o uso de bombas napalm durante a Guerrilha do Araguaia “Concepção equivocada nos níveis operacional e tático. O planejamento e a condução das

operações inicialmente desencadeadas no "Bico do Papagaio" partiram do pressuposto que as

ações de contra-guerrilha a serem executadas seriam aquelas que normalmente são

desencadeadas contra forças já no estágio de Exército de Libertação Nacional, to tipo "martelobigorna",

"pistão-cilindro", etc. Uma das primeiras operações efetuadas na área foi uma ação de

vasculhamento na única serra existente na região, a serra das Andorinhas, que se caracterizava

por não ter cobertura vegetal. Após ser bombardeada com napalm pela Força Aérea, a serra foi

objeto de uma vigorosa ação de cerco e busca efetuada por um grande efetivo. E o resultado foi

nulo porque os guerrilheiros nunca lá estiveram. Por outro lado, no terreno de selva, as patrulhas

se deslocavam com um efetivo de pelotão, 35 a 40 homens, pelas trilhas, enquanto os grupos da

guerrilha se deslocavam através selva, com um efetivo de 5 a no máximo 10 elementos. Dessa

forma as ações iniciais se mostraram extremamente ineficazes.”

007-artigo_cel_alvaro_napalm

Comissão da Verdade do Estado de São Paulo: 31ª audiência pública sobre os casos dos guerrilheiros desaparecidos no Araguaia, nascidos em São Paulo ou que tiveram atuação política principalmente nesse Estado: Antonio Guilherme Ribeiro Ribas, Gilberto Olimpio Maria, Miguel Pereira dos Santos, Manoel José Nurchis, Orlando Momente, Cilon da Cunha Brum, Pedro Alexandrino de Oliveira Filho, Jaime Petit da Silva, Lucio Petit da Silva, realizada no dia 12/04/2013.

 

 

008-audiencia_comissao_sp-n31.pdf

Comissão Nacional da Verdade

 

Cadeia de Comando Guerrilha do Araguaia

009-cadeia_comando_araguaia.pdf

 

2. Prova pericial e documental (inclusive fotos e vídeos) sobre a morte/desaparecimento

Documento

Fonte

Observações

Anexo

Ficha dados físicos Orlando Momente

Dossiê para Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP)

 

002-dossie_cemdp_ficha_dados_fisicos.pdf

  1. Testemunhos sobre a prisão, morte/desaparecimento

Nome

Relação com o morto / desaparecido

 

Informação

 

Fonte

 

ANGELO ARROYO

Dirigente do Partido Comunista do Brasil

“os grupos eram cinco. Um chefiado por Osvaldo (que retornou a sua área); outro por J.; outro pelo João; outro pelo Nelito; e o outro pelo Landim (Orlando Momente). (...) Dia 30 pela manhã (30/12/73), os cinco grupos tomaram seus destinos. Às 15h ouviu-se ruído de metralhadora no rumo em que havia seguido Osvaldo ou

Landim (Orlando Momente). Não se sabe o que houve”.

Relatório Arroyo (1974)

Joana de Almeida

Moradora região Araguaia

Em 1974, Joana de Almeida, moradora da região e esposa de Luiz Vieira, camponês também desaparecido na Guerrilha do Araguaia em 1974, esteve em seu antigo sítio na Paxiba, próximo a São Domingos do Araguaia (PA), e encontrou restos de uma ossada humana, semi-enterrada. Visíveis estavam o crânio e um fêmur, com características de terem sido enterrados havia pouco tempo, porque ainda tinham restos de carne. Ao lado da ossada estava um chapéu feito de couro de coati curtido, o que lhe deu certeza de que se tratava de seu compadre e amigo Orlando. Na época, Joana nada pôde fazer porque estava proibida pelo Exército de ir a seu sítio, ao qual fora às escondidas à procura de alimentos.

Informação consta no Dossiê Ditadura p. 603

 

  1. Depoimento de agentes da repressão sobre a morte/desaparecimento

Nome

Órgão/Função

Informação

Fonte

PAULO MALHÃES

Coronel do Exército e agente do Centro de

Inteligência do Exército (CIE)

 

“a participação durante a Guerrilha do Araguaia, como repórter infiltrado da Presidência, na região, e a posterior

atuação na Operação Limpeza que desenterrou e lançou no Rio Araguaia os

restos mortais dos

guerrilheiros. Para [Paulo] Malhães era ‘apenas um trabalho científico, adquirido em cursos de aperfeiçoamento’. Em suas próprias

palavras:

‘Quando o troço virou guerra, guerra mesmo, é que as coisas mudaram. Porque a gente também foi aprender fora,

alguma coisa. Aí os perfis das prisões daqui mudaram; a forma de contato com os presos mudaram;

surgiu a necessidade de aparelhos; porque -

isso foi uma grande lição que eu aprendi -

o que causa maior pavor, não é você matar a pessoa. É você fazer

ela desaparecer. O destino fica incerto. O seu destino como... fica incerto. O que aconteceu, o que irá acontecer comigo? Eu vou morrer? Não vou morrer? Entendeu? O pavor é muito maior com o desaparecimento do que com a morte. Já quando você desaparece -

isso é ensinamento estrangeiro –

quando você

desaparece, você causa um impacto muito mais violento no grupo. Cadê o

fulano? Não sei, ninguém viu, ninguém sabe. Como? O cara sumiu como?” (p. 2) e “Malhães: ‘Quando nós chegamos, eles nos chamavam de a Força. Não tinha

nome porque não sabiam se era Exército, Marinha, Aeronáutica’

CEV-RJ: ‘Os moradores ou os guerrilheiros?’

Malhães: ‘Os moradores. Chegou a Força. Então víamos quem era o

campeiro, perguntávamos se o campeiro queria trabalhar, pagava ao campeiro,

ele era remunerado, é lógico, e ele passava a trabalhar em uma destas zebras. E foi o que acabou com eles lá. CEV-RJ:

‘Os senhores montaram quantas zebras?’ Malhães:

‘Ah, era variável à beça..’. CEV-RJ:

‘Mas, apesar do lugar, a técnica é muito similar com o que o senhor já

vinha acumulando com conhecimento, mapeamento?’ Malhães: ‘Mas, ali era procurar o guerrilheiro, não queria saber quem era. Se ali passava guerrilheiro, nós íamos pegar o guerrilheiro ali.

CEV-RJ: ‘Mas, este apoio local, o senhor acha que isto foi uma boa tática que

vocês usaram?’

Malhães: ‘Foi a melhor coisa que nós descobrimos na vida para guerrear no

mato. Você conheceu a selva amazônica, você sabe que o dia vai clarear às 10hs da manhã, se clarear um pouquinho, vai escurecer antes das quatro da

tarde, aquelas árvores gigantescas fecham. Você anda de lama até aqui...né?

Se você andou no meio do mato’

CEV-RJ: ‘Andei lá, tudo.’

Malhães: ‘Você sabe que anda de lama de folha. Não é lama de terra, é lama das folhas que caem, apodrecem e faz uma lama. Então, é difícil. A guerrilha,

tanto é que o americano perdeu na guerrilha. Perdeu porque o americano, como

perde em tudo quanto é país que ele ocupa, ele erra em um principio

básico e aí.. porque ele quer fazer daquele lugar que ele ocupa o mesmo

estilo de vida que o americano tem nos Estados Unidos. Ele jamais vai

conseguir convencer aquela população a aceitar aquele estilo de vida. Então foi

o grande erro deles..’

CEV-RJ: ‘O senhor não ficou muito tempo lá, não é?’

Malhães: ‘Não, eu ia de vez em quando.’ CEV-RJ:

‘Já no final, meados de 70?’

Malhães:

‘Depois da passagem das tropas. Logo depois vieram as zebras.

Aí eu já estava começando as zebras. Porque o general Bandeira, que era o

comandante da região, no caso, comandante de guerra da região, era também

meu chapa. Porque tudo é amizade que você vai fazendo. Vão gostando do

seu trabalho, o cara passa admirar você, embora seja coronel, seja general..’

CEV-RJ: ‘E foram lhe dando espaço?’

Malhães: ‘... então, ele passa a acreditar no seu trabalho. Então, o general

Bandeira era muito meu amigo, era amigo do Curió...

CEV-RJ: ‘O senhor tinha relação boa com o Curió tam

bém?’

Malhães: ‘Tinha. Eu sacaneava muito o Curió. Brincava muito com ele. Por

que o Curió era muito fantasioso. Não sei se ainda é. Ele era muito fantasioso.

Ele fazia grandiosidade de bobo. Quando a gente ia ver na realidade, não era

nada daquilo. Eu sacaneava muito ele, brincava muito com ele. Mas ele era trabalhador” (p.14)

 

 

Depoimento dado a Comissão da Verdade do Rio de Janeiro publicado dia 30/05/2014.

OBS: Em anexo cópias de todos os documentos reunidos pela Comissão de Familiares dos Mortos e Desaparecidos Políticos e Comissão da Verdade do Estado de São Paulo “Rubens Paiva”.

CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES PARA O CASO

Conclusão: Orlando Momente é considerado desaparecido político, por não ter sido entregue os restos mortais aos seus familiares, não permitindo o seu sepultamento até os dias de hoje. Conforme o exposto no parágrafo 103 da Sentença da Corte Interamericana no Caso Gomes Lund e outros: “adicionalmente, no Direito Internacional, a jurisprudência deste Tribunal foi precursora da consolidação de uma perspectiva abrangente da gravidade e do caráter continuado ou permanente da figura do desaparecimento forçado de pessoas, na qual o ato de desaparecimento e sua execução se iniciam com a privação da liberdade da pessoa e a subseqüente falta de informação sobre seu destino, e permanece enquanto não se conheça o paradeiro da pessoa desaparecida e se determine com certeza sua identidade (...)”.

No parágrafo 110 do mesmo documento é mencionado que: “(...) pode-se concluir que os atos que constituem o desaparecimento forçado têm caráter permanente e que suas consequências acarretam uma pluriofensividade aos direitos das pessoas reconhecidos na Convenção Americana, enquanto não se conheça o paradeiro da vítima ou se encontrem seus restos, motivo pelo qual os Estados têm o dever correlato de investigar e, eventualmente, punir os responsáveis, conforme as obrigações decorrentes da Convenção Americana” (Sentença da Corte Interamericana, p. 38 e 41, publicação da Comissão Estadual da Verdade de São Paulo).

Recomendações: Investigação das circunstâncias da prisão, morte e desaparecimento de Orlando Momente, localização dos seus restos mortais e responsabilização dos agentes da repressão envolvidos no caso, conforme sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos que obriga o Estado Brasileiro “a investigar os fatos, julgar e, se for o caso, punir os responsáveis e de determinar o paradeiro das vítimas”; Retificação e indicação da causa mortis no atestado de óbito; que a Comissão de Anistia do Ministério da Justiça reconheça o período de contribuição trabalhista de Orlando Momente para que sua família receba a reparação mensal permanente e continuada a qual tem direito; que o Brasil realize um ato público de reconhecimento de responsabilidade internacional e de pedido oficial de desculpas pelas graves violações de direitos humanos perpetradas contra a vítima do presente caso, especificamente, pela denegação de justiça, como regulamenta o parágrafo 275 da Sentença da Corte Interamericana.

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